Capítulo 48

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Aruana seguia o grupo com atenção. Embora ainda houvesse sinal do celular, aquela região não estava mapeado. Não ouvia mais as vozes dos homens e usava a bússola para manter-se a oeste, onde estava a tribo Janerawa.
Havia uma trilha que mal podia ser vista e torceu para ser a mesma que o grupo pegara. Estava cansada, tão suada que sua camisa grudava nas costas. Estava quente e úmido.
De repente um som a fez saltar de susto. Era um rugido! Parou um instante e procurou acalmar o coração acelerado. Fiber lhe dissera que havia onças ali, porém o som não parecia de uma onça. Parecia ser de leão, mas não havia leões na Amazônia!
No trecho da floresta onde estava, a luz do sol não conseguia alcança-la. Podia ver o céu lindamente azul, contudo estava na sombra.
Ouviu vozes novamente e, com muito cuidado, seguiu na direção. Quanto mais andava, mais as vozes pareciam animadas.
À sua frente surgiu uma clareira; era artificial, pois havia sinais de cortes nas árvores. Voltou para a mata, pois não queria ser vista. Agachou-se num arbusto e olhou para o grupo de homens no centro da clareira. Estavam próximos a um tipo de oca.
Os policiais estavam recuados e diversos Novas Espécies faziam uma espécie de barreira. Bem de frente de Cedar e Fiber havia...
Meus Deus!
O que parecia ser um homem estava agachado, como se fosse atacar. Seus cabelos eram muito longos e brilhavam ao sol numa mistura de vermelho e dourado. Até onde Aruana podia ver ele estava nu. Mas o que realmente a chocara fora a cauda que serpenteava agitada. Um homem-leão?
Fiber se agachou, às mãos para o alto e falou com o homem. Aruana não conseguia ouvir, mas percebeu que a cauda se movia mais devagar.
Então se deu conta que estava na Zona Selvagem!
Fiber explicara que ali ficavam as Novas Espécies que não se adaptaram à vida humana. Alguns foram considerados erros por Mercille e haviam sido descartados no cativeiro, mas Justice tivera todo o cuidado com eles. Os que viviam no Acre eram considerados os mais selvagens e quando lhes foi oferecido viver numa floresta fechada, aceitaram prontamente.
Também soubera que somente Novas Espécies tinham contato com eles; nenhum humano tinha acesso à Zona Selvagem.
Se perguntou se aquela era a hora que devia se mostrar para Fiber. Não estava segura ali!
— Humana.
A voz cavernosa soou ao mesmo tempo que uma mão pesada segurou sua nuca. Aruana gritou e se viu levantada à força. Levou as mãos acima dos ombros, tentando soltar-se. Foi virada bruscamente para a frente e gritou novamente. Um homem imenso, com um rosto animalesco mostrava as presas para ela. Seus cabelos eram quase brancos e suas feições felinas.
— O que faz aqui? - Aruana sentiu os músculos de seu pescoço se distenderem quando o ser a sacudiu e agarrou o braço dele. — Está com eles?
— Solte a mulher, Gale! - era a voz de Fiber. — Solte-a agora!
O Nova Espécie a trouxe para mais perto. Cheirou-a profundamente.
— Que coisa é essa?
— Gale, por favor, solte-a!
Aruana não podia ver Fiber, mas sentia a tensão em sua voz. O homem relaxou a mão, mas não a soltou.
— Esse cheiro é seu.
— Ela é minha.
— Você tomou uma humana?
— Ela é minha companheira.
— Por que ela está aqui? - olhou além dela. — E eles?
— Gale, dê ela para mim.
O homem a soltou e Aruana tropeçou para trás, sentindo braços a cercarem. Era Fiber. Ele a pegou no colo e se afastou do homem.
— Fiber... - ela soluçou, agarrando-se nele.
— Ela está bem? - Cedar perguntou.
— Não sei. - Fiber respondeu, a voz soturna. Ela sentia o coração dele batendo fortemente.
Outro homem se aproximou deles.
— É sua mulher mesmo?
— Sim.
— Você trouxe sua mulher? Por quê?
Fiber fez silêncio. Cedar respirou fundo.
— Lion, não queremos desrespeitar vocês.
— Você disse que não veríamos humanos.
Fiber inspirou fundo.
— Eu te disse: os policiais vão ajudar os jaminawas.
— Não queremos humanos aqui. - rosnou Gale.
Aruana pensou naquele nome, significava vendaval. O homem devia ser perigoso.
— Nós precisamos da ajuda de vocês, Lion.
— Para ajudar humanos?
— Os jaminawas
Gale chegou perto de Fiber.
— Sua mulher é jaminawa?
— Não. Ela é de outra tribo.
— Não sabia que tinha uma companheira.
Fiber respirou fundo.
— Eu a tomei há pouco tempo.
O Nova Espécie a olhou com admiração.
— A mulher de Valiant me dava biscoitos. Sua mulher faz biscoitos?
Aruana recuperou a voz.
— Sei fazer biscoitos amanteigados.
— Hum. Bom.
Cedar voltou a falar.
— Gale, precisamos que nos guiem até os jaminawas. Pode ajudar?
Gale olhou para Lion.
— Os jaminawas são nossos amigos.
— Você quer ajudar?
— Quero.
— Vamos chamar os outros.
Aruana sentiu Fiber respirar fundo. Gale e Lion se embrenharam na mata e Cedar tocou o ombro de Fiber.
— Vou te dar um tempo. - disse e se afastou.
Ela sentiu os músculos dele relaxarem. Fiber a colocou no chão. Ele a encarou.
— Eu pensei que ele iria me matar!- ela começou. Fiber continuou a olha-la. — Nem sei o que teria acontecido se...
— Você me desobedeceu.
— Eu queria fazer a reportagem.
— Eu disse para você ficar.
— Eu sou uma repórter. Essa é uma oportunidade muito grande; eu não podia perder!
Ela acompanhou o ritmo da respiração dele, observou os punhos fechados, os olhos amarelados brilhando perigosamente.
— Primeiro você prefere a companhia do Felipe a fazer minha vontade...
— Por que está falando nisso?
— Depois decide ir embora para não ser minha companheira...
— O que isso tem a ver?
— E agora vem escondida numa missão perigosa, porque precisa se provar como repórter.
Aruana ergueu o queixo.
— Eu não tive a intenção de te ofender, você sabe disso.
— Nunca tem, Aruana.
Ele lhe deu um olhar triste, não raivoso, e ela sentiu uma dor no peito. Tentou pensar em algo para se explicar, mas não conseguiu.
— Me desculpe.
— Todas as vezes me envergonhou para mostrar que sua vontade é superior a mim.
— Não é isso.
Ele engoliu em seco.
— Por que voltou, Aruana?
— Porque eu te amo.
— Mas se ama muito mais.
— Fiber, eu te amo, mas também amo minha profissão.
O olhar dele foi ainda mais triste. Ela deu um passo para ele e Fiber segurou sua mão.
— Não posso te levar de volta. Fique perto de mim.
— Amor, me desculpe mesmo. Eu não quis...- ele se virou e a puxou para a clareira. — Espera, eu não terminei...
— Só fique quieta, por favor.
Aruana piscou rapidamente. Ele não gritou, não rosnou, porém ela se sentiu horrível. Nunca quisera magoa-lo realmente, apenas... Mas se ama muito mais. - ouviu novamente a voz dele. Mordeu o lábio inferior. Ela o amava demais, não sabia mais viver sem ele... Como Fiber podia diminuir o que sentia?
Chegaram onde estavam os outros e percebeu que seu companheiro abaixou a cabeça quando chegou no meio dos seus. Ela sentiu-se ainda pior.

Fiber ficara apavorado ao ver Aruana presa por Gale. Aquele era um macho extremamente volátil e poderia quebrar o pescoço dela em segundos. Correra como um louco, contudo precisara se controlar para falar com Gale.
Não pudera acreditar que Aruana estava ali e que viera através da floresta.! Sentira o cheiro dela uma hora atrás, porém se convencera que fora um engano da sua mente.
Depois que Gale a soltara, percebera o quanto a presença dela ali o incomodara. Aruana o contrariara gravemente e arriscara a própria vida! Ao perceber isso, sentira uma grande tristeza. Aruana não o respeitava. Dizia amá-lo, dizia que era sua, mas não era verdade.
Voltou para o seu grupo envergonhado e desolado. Quanto mais teria que ser desvalorizado por ela?
Cedar olhou de um para o outro.
— Quer levar Aruana de volta?
— Não. Ela arriscou bastante para estar aqui. - declarou amargamente.
Aruana o olhou, agitada, mas ele a ignorou.
— Vamos esperar Lion com os outros. - declarou e ficou em silêncio.
Até mesmo os policiais pareciam perceber o clima pesado, pois o silêncio também os envolveu.
— Fiber... - Aruana o cutucou, mas ele não a olhou. — Amor... - sussurrou para chamar sua atenção. — Podemos conversar?
— Agora não.
— Eu precisei fazer isso. - ele sabia. Ela sempre precisava de algo. — Eu não quis te magoar, juro.
Fiber virou o rosto devagar e falou baixinho.
— Você nem pensou em mim.
— Eu pensei, mas... Achei que ia ficar tudo bem.
Ele respirou fundo.
— Achou mesmo isso?
Ela se calou, o olhar arrasado.
— Me perdoa.
Fiber acariciou o rosto dela.
— Me deixe esfriar a cabeça, ok?
Ela assentiu e se calou.
Quando Lion e Gale voltaram com mais três espécies, ele não segurava mais a mão dela.

Fiber: Uma história Novas Espécies 4Onde histórias criam vida. Descubra agora