funeral

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Na semana seguinte, as coisas estavam melhores quanto a saúde de Ellie e Ben. Mesmo assim, o clima estava fúnebre no palacio por conta da partida da rainha mãe, Bela French.

Benjamin se levantou nauseado pela manhã, sabendo que aquele era o dia que velariam a pessoa que cuidou dele a vida todinha, e que tinha morrido sozinha em uma madrugada no hospital. Ele não se sentia bem, mesmo que Mal tivesse o abraçado e acariciado seus cabelos durante a noite como ele gostava. Queria estar distante, queria sofrer essa perda, queria que Mal se afastasse e até gritou para que ela fizesse isso, mas como uma esposa leal e carinhosa, ela ficou - mesmo que o coração dela tivesse se partido ao ouvir ele gritar daquele jeito quando ela só queria fazer ele se sentir melhor - ela dormiu com ele, abraçada a ele, apesar de tudo.

Teria de ver sua mãe morta em um caixão. Como se estivesse dormindo eternamente, como Bela Adormecida, mas não tivesse um beijo de amor verdadeiro que pudesse acorda-la. Sua mãe tinha ido embora para sempre, e hoje ele tinha que arrumar a filha de seis aninhos para se despedir da avó.

—Eu... acho que não vou.—Malie sussurrou, observando as costas do marido que se sentava na cama.

—O que? Por que não?

—Não quero ir...

—Ela te tratou como filha e você sequer vai se despedir dela?—Os olhos dele brilharam com lágrimas, assim como os dela, ainda um pouco magoada.

—Ben, você sabe que a sua mãe me tratou como filha sem querer nada além de carinho em troca, não é?—Ela devolveu.—E você sabe que ela não está lá. O que está lá são os ossos, a carne, ela mesma já se foi.

—Pare! Pare com isso. Você não sabe o que fala!

—Tudo bem.—A garota entendia que o marido estava de luto, apesar de não estar entendendo a própria dor de vazio no peito por ter perdido sua maior conselheira. Doía nela também, mas não queria demonstrar aquilo por não ser justo com ele que a teve sua vida toda.—...não estou disposta para ir. O vestido preto de Ellie está em cima da cômoda, deixei separado.

—Mal!—O rei insistiu, puxando as cobertas.

Ela se encolheu, apertando os lábios.

—Que merda, estou congelando.

—Levanta!

—Porra, Benjamin! Está vendo o tamanho da minha barriga, seu idiota?! Tem a porra de uma criança crescendo aqui dentro, não aguento ir a um velório, mal fico em pé por cinco minutos, meus quadris doem, minhas pernas doem.—Berrou ela, em revolta.—A previsão do fim da manhã é de neve, e eu sequer tenho imunidade para pegar qualquer vírus agora. Sei que está descontando tudo isso em mim, e tudo bem, você está sofrendo e eu aguento isso tudo pois já passei por coisas piores, mas pode ao menos pensar no seu filho?

—Você é inacreditavel...—Suspirou ele, jogando a coberta de volta na mulher.

Estava bravo por ela não querer ir. Estava bravo porque Bela amou Mal muito e mesmo assim a garota não compareceria para um último vislumbre de seu rosto angelical. Mas sentiu pena quando viu que ela estava aceitando tudo aquilo porque entendia que ele estava com dor, e se sentiu ainda pior por faze-la se sentir em um ambiente tão hostil quanto sua antiga casa. Pensava que ele não se importava com ela, apenas com o bebê.

Parou e respirou fundo.

Um.

Dois.

Três.

Não podia surtar. Não podia perder a cabeça.

Sua mãe tinha morrido, sua única família agora era Mal e os filhos que vinham dela.

—Você...—Ele pensou em um pedido de desculpas. Em dizer que sentia muito, fizer que ela tinha razão e ele era um idiota. Mas Ben não podia perder tempo e sabia que ela entenderia quando apenas se curvou sobre o corpo dela e deixou um beijinho na sua testa.—Espero que fique bem hoje.

—Vou ficar.—Deu de ombros.

—Ponha uma camiseta. Nem que seja a minha, está pegando muita friagem.

Estava com uma calça de moletom, mas apenas usando uma peça pequena para cobrir só seus seios, deixando a barriga a mostra, mesmo que estivesse toda encolhida por debaixo do edredom.

—Vá. Eu me viro.—Ela suspirou, se encolhendo um pouquinho.—Estou bem aquecida.

Duvidando, ele se ergueu, pegando do armário longo uma coberta felpuda, voltando a se direcionar à cama quando esticou-a, colocando a manta sobre a esposa.

—Aqui, talvez melhore um pouquinho. Eu... te amo, okay?

Mal afirmou com a cabeça em um aceno. O amava, mas não queria mencionar o quanto naquela manhã, não quando ele tinha feito ela dormir chorosa porque tinha gritado que era idiota ela querer ficar perto o tempo todo, ou que não aguentava mais. Ela o amava muito, e, se estar tão próxima o deixava incomodada, se afastaria um pouquinho mais - mesmo que só se vissem a noite, já que ele trabalhava sempre.

(...)

—Viemos o mais rápido possível.—Aladdin murmurou, jogando a bolsa no chão do quarto.

Aos outros sempre pareceria complicado que os casais atravessassem reinos para se encontrar. Mas falando de pessoas com muito dinheiro acessível e um jatinho particular, podiam andar quando quiser e de forma rápida e segura.

—Está mesmo com dor?—Jasmine se sentou na beirada da cama, tocando a cabeça roxa da amiga.

—Isso é uma merda.—Mal bufou.—O-o-obrigada por virem.

—Sei como é... Jake nasceu com quase quatro quilos, doeu para caralho.

—Ela quase me matou.—O homem murmurou, fazendo ela rir.—Ele está na sala com o tablet dele, vai ficar quietinho por um tempo.

—Eu... comecei a sentir umas pontadas as oito horas e...

—Ben saiu mesmo assim?—Din questionou.

—Eu não contei para ele.—Bufou.—Ele está se sentindo sufocado por mim e... a mãe dele morreu ontem, eu não queria irritar ele com isso. Se não ele ia se sentir obrigado a perder o enterro da mãe para ficar comigo, isso não é justo.

—Não é justo que você esteja sozinha.—Jas comentou.—Enterros podem ser adiados, partos não. E... quanto ao resto... não sei o que te dizer.

Aladdin se sentou ao lado da esposa, segurando a mão da amiga.

—Okay, sei que parece estar um saco entre você e ele, mas sempre conte com ele, beleza? Ben te ama mais do que já amou qualquer pessoa no mundo.

Mal apenas sacudiu os ombros em descrença. Ben estava perdendo a paciência com ela, talvez tivesse cansado de tanto tempo juntos.

—Já são quase meio dia. Sentiu alguma contração além das pontadas? Sua bolsa estourou?—O homem continuou falando.—Por que não chamou um médico ao invés de chamar a gente?!

—Ele tá surtando.—Jasmine sorriu de canto.

—Eu senti algumas contrações, mas ainda estão de dez em dez minutos. E... não chamei um médico porque qualquer médico ligaria para o contato de emergência. Ou no caso da rainha, chamar o rei. Os dois casos implicaram em tirar o Ben do velório e ele ficar puto comigo.—Ela gaguejou.

—Vou atrás de toalhas. Uma tesoura, uma bacia e... não sei, água, talvez?—Ele se levantou, atraindo o olhar da própria esposa antes de sair.

—Traz uma bolsa térmica quente para aliviar a dor. E enche a banheira.—Jas sugeriu, se deitando ao lado da mulher.—Nós dois não somos parteiros, mas... estamos aqui com você, okay?

—Será que Ben vai ficar bravo comigo por não ter avisado? Ele... perdeu o parto da Ellie e agora dele...

—Ele vai entender, beleza. Agora, se concentre.

going crazy - História malenOnde histórias criam vida. Descubra agora