capítulo 66 (✓)

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"O mundo não costuma ser um lugar muito justo, ou minimamente misericordioso. O que devemos fazer então, senão o necessário para sobreviver à ele?"

                              E M E R A L D

— Que droga! — resmungo porque não havia como Daaniel ser mais insuportável. Ele era um babaca inteligente demais para o nosso bem. Havia trancado a porta subterrânea na floresta que levava para as passagens internas do palácio, bloqueando qualquer alternativa nossa de chegar à torre. — Eu o odeio por ser tão perspicaz!

— Essas passagens não eram para serem secretas? Afinal, quantas pessoas sabem da existência dela? — Mark pergunta enquanto ainda tenta quebrar as três correntes que reforçam a fechadura. Mas a essa altura eu e Ben sabemos que qualquer esforço físico é inútil. É humanamente impossível quebrar aquelas fechaduras.

— Sam não era bom em guardar segredos. — Ben responde, soando desinteressado. — O que vamos fazer? Estamos sem tempo. Todos os bons soldados do Norte que restam estão no palácio, e não há outra entrada que nos leve para à torre. Pelo menos não uma que esteja desprotegida.

Olho para cima, o ocidente tinha tomado a cor de um hematoma, mas o céu por cima da minha cabeça estava nublado, vejo a torre que brilha em tons profundos de azul. — Acho que podemos começar a rezar.

— Realmente. —  Lennis diz. Quase posso vê-lo sorrindo ao empunhar a espada encarando através da floresta. — Porque não estamos sozinhos.  — Sussurrou nos obrigando a ficar atentos em torno da porta no chão e das árvores altas e densas que enchem a parte de trás dos muros do palácio. Nós três ocupamos posições defensivas.  — Eles estão escondidos, nos olhando.

Uma rajada de ar frio nos atinge, fedendo vagamente a umidade e algo azedo. Sangue. Pendurei uma aljava no cinto e puxei uma flecha, a haste era negra. Ao encaixá-la na corda, lembrei-me de quando o mundo era um lugar diferente, de quando o meu lugar jamais seria desse lado da guerra.
Meu pai tinha dito certa vez após uma caçada, sorrindo daquele seu jeito habitual: "Não há nada que seja nem de longe tão mortífero quanto uma flecha na mão de um bom atirador." Nunca fui metade da atiradora que meu pai era, mas tampouco era estranha ao arco.

Havia silhuetas escuras deslizando em volta das árvores, mas não as víamos suficientemente bem para desperdiçar uma flecha. Me aproximei da ameia, ergui o arco e puxei. Os homens se moveram entre folha e galhos, a flecha soltou um silvo suave quando abandonou a corda. Um momento depois ouvi um gemido, e de repente uma sombra havia caído. Mordi o lábio inferior carregada de adrenalina, a pulsação de minhas artérias pressionando-se contra os meus ouvidos. Daquela vez apressei-me demais e errei. Os nortistas que estavam atrás de nós tinham desaparecido quando voltei a encaixar mais uma flecha. Procuro outro alvo e encontrou quatro, correndo entre as árvores, à luz provinda do sol pálido cintilou em seus machados e espadas.

Neste momento eu o vejo, Henrique Cleveran dentre as sombras com um arco em mãos, seus olhos me encontram de volta com um sorriso demoníaco. Ele dá um passo lânguido para me ver melhor. Será seu último passo, penso. Em uma avaliação silenciosa e dura ele me avalia, o tipo de repreensão que estou acostumada a vê-lo fazer desde a minha infância, onde ele me controla com um cabresto firme e inflexível. Só então me dou conta do quão sufocante é viver sob o julgo dele, sobre o peso de nosso sobrenome e dever.

É inconsciente quando meus braços apontam a flecha para o seu coração, para todo aquele rancor, para o homem que destruiu minha mãe e depois o meu irmão, e eu mesma, todos os dias durante dezoito anos.

Henrique sorri, como se esperasse aquilo de mim. Posteriormente o homem aponta sua flecha na direção de Ben, e eu sei o que significa, sei que ele espera que eu faça uma escolha. Se eu o matar a flecha atingirá Ben, e eu vou perder os dois. Meu estômago gela com a perspectiva de ter que decidir, e quase vomito. Meu irmão não o via e duvido que fosse fazê-lo rápido o bastante. Lentamente, muito lentamente, dobrei os joelhos e deixei que uma de minhas flechas caíssem no chão. Meu pai no entanto, não abaixou o seu arco, ele estava disposto a matar meu irmão bem ali mesmo independente do que eu fizesse, o conselheiro sorriu e então com o tipo de agilidade que o mesmo me ensinou tão fervorosamente saquei outra flecha da aljava e disparei sem hesitar.

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