capítulo 15 (✓)

779 107 47
                                    

"Nenhum lugar é seguro se você é o escolhido. Há uma chance de saber quem você é, mas tem um preço. Sem remorsos. Sem fraquezas."

V I C T O R I A

Abro as portas duplas no impulso fazendo os olhos da senhora Sofia queimarem sobre mim.

— Isso são modos Victoria? — ela reverberou, seu saiote cinza se movendo quando pôs às mãos na cintura.

Havia uma mesa circular com forros bordados em branco e creme disposta bem no meio do salão. E Sofia, minha professora de etiqueta há exatos e terríveis quatro dias, estava bem diante dela, colocando as louças de prata sobre o pano.

— Perdoe-me. — tentei soar educada.

— Espero que tenham dito uma boa noite de descanso, — ela disse ainda focada na mesa. — Porquê temos muito trabalho pela frente. Suas aulas de etiqueta e comportamento continuarão sendo todos os dias enquanto eu não ver melhorias, e acredite em mim, nesse ritmo vou ser sua tutora até o dia da minha morte.

Me segurei para não revirar os olhos com a dramaticidade da sua expressão.

— Sente-se, hoje veremos como uma dama da realeza deve se portar numa refeição.

Sofia tinha os olhos castanhos, uma cor vivaz que se ressalta pelos cantos levemente puxados. A pele acobreada e o cabelo sempre em um coque perfeito completavam seu requinte. Além do sotaque cantado e poético na voz havia outras características notórias que entregavam que ela não era dali. Em Allen as pessoas sempre tinham uma expressão mais fria e marcante, além de uma língua nenhum um pouco poética.

— De onde vem, madame Sofia?

— Nasci em Gralaham mas vive toda minha vida em Allen. — ela colocou enquanto me posicionava ereta na cadeira. — Aqui é o meu lar.

— Soube que é um reino muito rico em conhecimentos, artes e ciências.

— Gralaham é uma alma vibrante.

— Não sente falta?

Ela me inspecionou, Sofia costumava ser uma mulher muito restrita e ríspida, mal havíamos conversado nesta última semana desde que me recuperei do ferimento e lorde Owen me passou o novo cronograma apertado da minha vida, que incluía as aulas com a madame. Mas eu sabia que no fundo ela era uma mulher com seu valor.

Sofia se sentou na minha frente e abriu o guardanapo no colo, eu tentei seguir exatamente os seus passos, mas foi inútil.

— Acho que sinto falta da ideia.. — disse, tocando os lábios com a porcelana sofisticada da xícara. — Mas a única casa que conheço é Allen, sempre vai ser. Não tem como você sentir falta de algo que não conhece.

Eu entendia bem aquele sentimento, as pessoas falavam da minha mãe, da época em que ela viveu no palácio e a retratam como uma pessoa que eu não reconheço, que nunca vou conhecer. Quando me perguntam se sinto falta dela afirmo que sim porque é o mais fácil. Embora no fundo eu saiba que tudo na minha cabeça não passa de lembranças volúveis sobre uma pessoa que se torna cada vez mais distante, mais estranha, quanto mais descubro dela, menos a reconheço como minha mãe.

Respiro fundo quando Sofia começou a recitar uma introdução falada dos tipos de talheres adequados em cada refeição deposta. O mecanismo obrigatório preencheu o salão, tetilhares de pratarias e sons mórbidos de cristais e porcelana, todos orquestrados elegantemente por Sofia e tragicamente por mim.

— Isso está horrível, vamos de novo. — A madame reprimiu, me lançando um olhar feroz.

Durante toda a aula me esforcei para manter a coluna ereta e os cotovelos longe da mesa, quase dando glórias quando a tortura finalmente terminou.

Rainha de Ferro Onde histórias criam vida. Descubra agora