capítulo 48 (✓)

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"Estimada escuridão, fostes o precipício da minha lucidez. O final letal de um epílogo grandioso."

                              V I C T O R I A

Num piscar de olhos alguma coisa acontece do nada, quando você mesmo espera, e te coloca num caminho que nunca planejou, em um futuro que sequer imaginou. Tudo o que vivi até hoje me trouxe para cá, para Monte Rock, para o coração da esperança onde outras muitas centenas querem vingança tanto quanto eu.

Minha exaustão penetra cada osso, músculo e nervo. Meu coração é como uma ferida, ainda sangrando pela traição e pelo fracasso, mas estar aqui faz todas essas coisas parecerem insignificantes. Os corredores do prédio circular são longos, estreitos e abertos em uma das laterais. Subo por eles, são como serpentes que se enrolam no interior do edifício formando um caminho que começa no piso subterrâneo e termina no último andar. Por onde passo vejo várias portas de metal com dobradiças grossas e rebeldes que vão de um lado para o outro, decididos, sempre apressados, tagarelando entre si. Mas eles param ao me ver, colando as costas na parede para deixar o maior espaço possível para mim no corredor estreito. Os mais corajosos me encaram nos olhos e me assistem cambalear fraca, mas a maioria acaba olhando para os próprios pés.

Eles murmuram entre si enquanto caminho. Mesmo os incapazes de me encarar trocam sussurros sem a preocupação de disfarçar as palavras.

— A Rainha de Ferro está viva. — é tudo o que escuto. Tudo o que ecoa entre eles e ricocheteia pelas paredes de metal. Rainha de Ferro. Pela primeira vez tomo posse daquele título poderoso e ergo o queixo na direção da sala que estou à procura há tanto tempo.

Um calafrio que não tem nada a ver com as correntes de ar do edifício percorre minha espinha quando abro a porta do que me disseram ser a sala do general. Quando saí do cômodo subterrâneo, deixei Ben para trás, porque tinha coisas que enchiam minha mente e eu não conseguiria desvendá-las com ele tão perto do meu corpo instável. Tudo em mim estava ao extremo, a dor, a raiva, o desejo. Eu lidaria com nós dois depois, agora precisava tomar o controle antes que tudo afundasse de vez.

Empurro a porta do escritório que tanto busquei com cautela, sentindo a ponta de meus dedos incertos deslizando sobre o metal como uma corrente elétrica.

— General Kalf? — pergunto, ereta, embora meu corpo esteja firme os nós de meus dedos estão brancos pela força que faço para deter o frio alí.

Os olhos escuros do general se enrugam.

— Meu Deus! — levantou-se da cadeira em um salto, a garota de cabelos escuros que só poderia ser Alena estava ao seu lado, aflita. Ela deixou a discussão que tinham de lado para me encarar de cima a baixo com olhos arregalados.

— Impossível..— murmurou.— Você estava morta.

Alena deu um passo para frente me analisando com cuidado enquanto o general pressionava as mãos na cadeira que havia deixado.

— Como pode ver, não estou.

— Como? — pergunta a mulher, desconfiada. — Quando meus homens a trouxeram, chequei seu pulso, seu corpo apresentava sinais de hipotermia. A morte estava estampada em seu rosto, tentamos reanimá-la mas não houve respostas...

Lembro de correr, do lago, do chão desmoronando sob meus pés e da água se infiltrando em meu corpo. A morte com gosto de sangue congelado e cheiro de pinheiros e neve. Balanço a cabeça para me esquecer desses sentimentos.

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