Chapter 538 Uma redoma que definitivamente se partiu

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Prólogo A noite que se inicia o resto de nossas vidas

A espera não era algo fácil, nunca era.
Principalmente quando a espera fugia ao nosso controle e tudo que restava era ficar de pés e mãos atados.
Jun Wu não conseguiu ficar na sala com os outros, por isso ele estava encostado na parede no corredor, ao lado da porta do quarto.
Por várias vezes, quase sucumbindo ao desejo de entrar no quarto sem ser chamado.
Havia apenas um castiçal de velas iluminando aquele trecho da residência, Jun Wu estava de braços cruzados numa parte de sombras, quando a porta do quarto entreabriu.
Wu Chang espiou pela fresta e a abriu mais assim que viu Jun Wu e seus olhares se cruzaram.
— Daozhang Jun...— O sacerdote de preto segurou na porta logo depois que limpou a garganta, mesmo após abrir um pouco mais. — O rapaz parece estar... Estável. Mas, seria razoável se o trocássemos de quarto. O Feng Shui desse aposento é péssimo... Seria possível?
Jun Wu desencostou da parede, seus braços descruzaram ao avaliar o tom de voz, a expressão do sacerdote.
Uma sensação de desconforto e desconfiança reinavam nos modos do deus maior.
— Então, eu posso vê-lo? Sacerdote...
— Huan Shui deve demorar um pouco a voltar a si. — Wu Chang retrucou hesitante. — Mas, o Daozhang pode levá-lo para repousar em outro quarto... A condição atual... Requer certo cuidado. Não sabemos ao certo como será quando o rapaz despertar.
Jun Wu tinha algumas perguntas em mente, mas a tensão não havia diluído completamente, aquele parecia o momento errado para indagar qualquer coisa.
Ao seu trejeito formal, o Daozhang pediu licença para adentrar no quarto que era dele e antes de se aproximar da cama, seu olhar recaiu no corpo coberto pelo lençol e em seguida em Shan Ling.
— Ele está...? — Jun Wu questionou em tom cavo e o sacerdote de vermelho meramente lançou um olhar vazio ao corpo sob o lençol, um olhar difícil de traduzir.
— Eu me encarrego disso. — Shan Ling replicou secamente. — Apenas cuide de Shen Zishui.
Por segundos, Jun Wu fitou Shan Ling com certa estranheza, mas não disse mais nada.
As perguntas em sua mente se repetiam, se aglomeravam.
Algo tinha dado errado durante a troca de núcleo? Huan Shui estava de fato fora de perigo?
O clima estranho era por conta do corpo oculto pelo lençol?
Por que Shan Ling e Wu Chang não estavam trocando olhares entre si?
Silente, entre a luminosidade dos candeeiros no quarto, Jun Wu caminhou até à beira da cama ocupada por Huan Shui.
Sentando-se na beira, entre o limiar macio e a madeira dura, mirou-se amorosamente na face como que ainda adormecida e Jun Wu retirou em câmera lenta os fios acobreados bagunçados sobre a pele e chegando mais perto, observando-o na penumbra imposta por seu próprio corpo, tomou-lhe afetuosamente uma das mãos e num gesto lento e contemplativo... Encostou as pontas dos dedos mornos contra seus lábios.
Como Jun Wu tinha se inclinado, suas madeixas negras se confundiam com os fios de seu marido na penumbra oscilante entre o movimento de seu corpo e a luz dos candeeiros.
O toque de sua mão aprofundado numa carícia, até que Jun Wu deitou o braço de Huan Shui sobre a pele seminua e sem levar em consideração o hanfu aberto, passou seus braços por baixo e num impulso o soergueu em seu colo.
Seu coração ainda não estava tranquilo, ainda assim...
O alívio que sentia era incalculável.

Capítulo 538 Uma redoma que definitivamente se partiu

Sete de junho – Ano do Dragão
Zhen Yan

A luz do dia fugidia que adentrava o aposento iluminava a lateral de seu pescoço, a beira de seu rosto e um dos lados de seu corpo, o mesmo lado que cintilava sobre os fios de cabelo expressivos e acobreados.
Sua face estava levemente inclinada para as sombras do quarto quando suas pálpebras estremeceram ligeiramente, os olhos pedindo para abrir sem que tivesse total noção das vontades do corpo.
A verdade é que não esperava estar vivo, era conveniente sentir-se anestesiado.
E era mais conveniente ainda sonhar, ao invés de acordar.
Seus dedos da mão direita se moveram de forma quase imperceptível enquanto sonhava, sem se dar conta que havia uma borboleta fantasma pousada em seu pulso.
Viu a si mesmo sobre os galhos grossos de uma figueira, trajando um hanfu de cultivo azul e verde. Realmente sentindo a textura do tronco da árvore antiga, tendo completa noção da determinação em seus pés.
Seus olhos se fixaram em alguém que vinha pelo caminho ermo, era um homem alto, vestido de forma simples, quase ordinária, levando um chapéu de palha puído pendurado em suas costas que cobria parte do negrume de seu cabelo solto e sem adorno algum.
De algum modo, em meio a falta de contexto que o sonho lhe oferecia, sabia que aquele homem fazia o mesmo trajeto três vezes na semana.
Assim que o homem se aproximou e seus olhares colidiram, uma onda de emoções se chocou contra seu espírito, mas nenhum resquício delas se espelhou minimamente em suas feições ou gestual.
Os dois se olharam por poucos minutos, num instante imóvel.
E logo depois, assim que sumiu pelas árvores do mesmo modo que surgiu, seu coração no peito se agitou repleto de uma raiva incompreensível, uma curiosidade gritante e um fascínio descomunal.
Sem se dar conta do quanto seu coração também havia disparado enquanto dormia, foi transportado para outro cenário.
E se deparou com aquele homem alto e tão atraente tomando chá.
Se olhando de longe, já tinha suas convicções, mirando-se de perto então... Tinha certeza absoluta que aquele homem morando na cabana na montanha de Zhen Yan não era um cultivador comum.
Isso o incomodava de certo modo, de um modo confuso.
Quando chegou perto o suficiente, ainda sem dizer nada, observou aquele homem vestindo um robe em cor de sépia para lhe servir calmamente uma chávena de chá. Somente no instante que ele lhe estendeu a chávena preenchida e seus dedos aceitaram devagar, é que sua voz baixa se fez ouvir.
— Quem é você?
O cultivador ouviu a pergunta, fitou de perto os olhos castanhos amendoados do rapaz e fez uma suave mesura para ele.
— Sente-se, por favor.
Sua figura assentiu, fê-lo cauteloso sem derramar uma gota, o chá mal se moveu dentro da chávena enquanto se colocou ao lado dele.
— Você deve ser o filho primogênito do Sacerdote Huan Yijun.
Provou do chá, contraindo levemente os lábios e respondeu também observando o cultivador mais velho com igual atenção:
— Sou sim... Huan Shui. Já que me convidou a tomar chá, posso saber seu nome?
— Seu pai não falou sobre mim... Para você?
— Não vou para o Vilarejo há dois meses... Então, seria impossível meu pai contar qualquer coisa.
O homem deixou sua chávena numa parte de madeira da varanda, um pouco intrigado.
— Está cultivando há dois meses, sozinho naquele templo do outro lado?
— Estou... Faço Cultivo Silencioso, o único que me procura no Templo Jianguang é meu irmão Jiahao, mas acho que ele vem a mando do meu pai, para confirmar se estou sendo fiel ao cultivo.
— Acho que entendo... Por isso, você toca a sua cítara sempre no mesmo horário, é uma estratégia para seu irmão não descobrir.
— Eu toco erhu... O som incomoda você?
Aquele homem meneou levemente com a cabeça, mantendo a gentileza em seu tom.
— Não, nem um pouco. Mas, muitos sentimentos seus flutuam quando você toca... Tem sido difícil ficar sozinho, Huan Shui?
— Se cultivo fosse fácil, haveriam mais imortais do que pessoas comuns. Como o meu pai também é o Sacerdote sigo de forma mais diligente possível o que ele estabelece... E ele disse que mentes agitadas precisam de cultivo silencioso.
— E o que essa sua mente agitada tanto pensa?
— Simples... Ela ainda quer saber quem é você.

A parede frágil entre o sonho e a realidade colapsou, partindo-se como uma vitral, milhares de pedacinhos cintilando sob o sol.
Foi assim que acordou, como se tudo quebrasse em volta, seu corpo movendo-se num solavanco, tal qual a pessoa que se afoga e tenta escapar da água.
Despertando tão subitamente, tão desorientado, que a borboleta em seu pulso voou um pouco atônita, sem se afastar demais.
Por outro lado, Jun Wu que estava aguardando há horas, sem mesmo conseguir dormir, largou depressa o livro que estava tentando ler.
O deus menor nem sentiu o quão rápido transpôs o espaço que separava os dois, num instante mais breve que um piscar de olhos, sentou-se na beira do leito e sem mesmo pensar, abraçou Huan Shui pelos ombros tentando acalmá-lo.
Uma torrente de sensações tornava difícil até mesmo respirar, Huan Shui não olhou diretamente para seu Daozhang, seu corpo estremecia e, de repente, tudo convergia no fato de estar vivo.
Não apenas estar vivo, sua mente estava inundada de lembranças antes totalmente esquecidas, trancafiadas em seu íntimo.
Uma avalanche metafísica de sensações, o feitiço do Esquecimento enfim estava quebrado.
Percebendo que Huan Shui mal conseguia falar, Jun Wu o aconchegou carinhosamente contra seu corpo, beijando-lhe com doçura a cabeça.
— Acalme-se, A-Shui... Está seguro agora. — O Daozhang acalentou, a voz baixa e suave era uma carícia.
A voz, a voz que estava em seu sonho, ainda mais vívida com seus sentidos despertos.
Indo quase às lágrimas, segurando-se com ímpeto desmedido nas vestes de Jun Wu, o rapaz engoliu o excesso de saliva e fez um esforço para conter o que sentia, elevando seu rosto.
O olhar de Huan Shui não quis buscar nenhuma outra direção, apenas mirou-se na face de Jun Wu, esquadrinhando como se ele fosse uma paisagem assombrosa.
Erguendo sua mão, seus dedos aturdidos tocaram com fragilidade as beiras do rosto, os olhos negros de obsidiana se projetavam como sorrisos e devagar suas faces se encostaram, suas respirações se confundiram.
E sentindo as mãos de Jun Wu acariciando seu cabelo, as lágrimas desceram quietas por suas bochechas enquanto fechava os olhos, absorvendo profundamente o que representava aquele instante...

Nota da autora:

Eu tive o pensamento infame de terminar a fanfic neste capítulo e fazer o resto dela em forma de extras.
Mas, eu me dei conta que esse seria o tipo de coisa que a autora Meatbun faria rsrs
Como eu passo muita raiva quando a Meatbun termina as novels no momento que enfim os personagens tem um pouco de paz, é evidente que eu não vou fazer essa maldade com vocês.
Vamos ter a nossa dose de um devido momento de felicidade merecida. (Finalmente!)
E outras “coisinhas” pendentes também... (E quando eu digito “coisinhas”, estou sendo modesta na colocação... Porque são, definitivamente, muitas coisas!)

 Porque são, definitivamente, muitas coisas!)

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Jun Wu - A Terceira Face do Príncipe • Livro 3Onde histórias criam vida. Descubra agora