Capítulo 70

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Scarlett

A noite estava estranhamente silenciosa, o tipo de silêncio que deixa qualquer um inquieto. Eu estava na cama, quase caindo no sono, quando ouvi o som de asas batendo na minha varanda. Meu coração disparou. Peguei uma faca da gaveta ao lado da cama, pronta para enfrentar qualquer invasor. Caminhei lentamente até a porta de vidro da varanda, minha respiração pesada e irregular.

Ao olhar pela porta de vidro, eu vi Asura. Ele estava ali, seu corpo alto e imponente iluminado pela luz da lua. Seus olhos vermelhos brilhavam, indicando apenas uma coisa: luxúria e desejo. Eu paralisei, a faca escorregando da minha mão e caindo no chão com um baque surdo. Por um momento, tudo o que senti foi um turbilhão de emoções conflituosas.

Asura me olhou intensamente, mas ao invés de abrir a porta, eu a fechei com força e fechei as cortinas, bloqueando a visão dele. Meu coração estava partido, mas firme.

— "Vá embora, Asura," — murmurei, minha voz trêmula. — "Use essa luxúria que está sentindo agora com sua esposa, Serena, e me deixe em paz de uma vez."

Sentei-me no chão, de costas para a porta. O silêncio voltou a preencher a sala, mas eu sabia que ele ainda estava ali, imóvel. Senti sua presença, uma sombra constante que não desapareceria. O tempo passou devagar, e eu quase podia ouvir cada batida do meu coração.

Depois de quase uma hora, ouvi a voz dele, um som que fez meu interior estremecer.

— "Abre a porta," — ele disse, a voz rouca de desejo. — "Eu preciso de você, eu preciso te sentir, seu corpo, seus lábios. Eu só consigo sentir algo quando toco em você, é meu vício, minha perdição."

Ele era a minha perdição também. Quando estava com ele, tudo que era certo e errado desaparecia, e o mundo se resumia a nós dois.

— "Vá embora," — pedi em lágrimas. — "Eu não quero ser sua amante, eu não quero sentir a dor de perder um filho de novo. Sume da minha vida."

Asura suspirou do outro lado da porta.

— "Eu sinto sua dor," — disse ele, a voz cheia de tristeza. — "Sinto muito por fazer você sofrer. Eu só queria esquecer tudo, inclusive os sentimentos que me atormentavam, mas tudo que consegui foi fazer os outros sofrerem por minha causa. Eu consigo notar isso, mas me importar é como se eu não conseguisse."

— "Sua esposa não merece isso," — respondi, a voz firme apesar das lágrimas.

— "Eu sei," — ele admitiu. — "Eu vou dar o que ela deseja, um filho. Serena vai ser feliz quando tiver uma criança."

— "Queria entender quando você ficou tão monstruoso," — retruquei, minha voz carregada de desdém. — "Criar uma criança para acabar com a solidão de sua esposa. Você deveria fazer esse papel!"

— "Eu não preciso de sentimentos para saber que eu era um covarde," — disse ele. — "Eu não conseguia lidar com as frustrações do meu próprio pai, então decidi ir pelo caminho mais fácil ao notar que não seria aceito pelo jeito que eu sou. Decidi me tornar o que ele queria que eu fosse, um típico demônio do inferno, um monstro sem sentimentos."

— "Você realmente se tornou o que ele queria," — falei, amargamente. — "Mas ainda assim ele não deixou o trono para você. Ele só brincou de casinha com a rainha Sarah esse tempo todo, por ser cadelinha dela. Fez o mesmo que está pensando em fazer com a Serena, mas a diferença é que você não a ama."

Asura bateu na porta suavemente, um som que quase me fez ceder.

— "Abre a porta," — ele implorou. — "Sei que também almeja isso. Você é minha raposinha travessa no final das contas."

O apelido quase me fez fraquejar, mas me mantive firme.

— "Não vai funcionar," — respondi. — "Você não quer arriscar ter um bastardo fora do casamento, não é? Um mestiço, a porra de um meio vampiro, demônio e kitsune. Eu não quero passar por aquilo tudo de novo."

Houve um longo silêncio antes de Asura falar novamente, sua voz triste.

— "Me desculpe por tudo que lhe causei," — disse ele, finalmente se afastando.

Eu fiquei ali, sentada no chão, sentindo a ausência dele como um buraco no meu coração. Asura tinha ido embora, mas as cicatrizes que ele deixou em mim nunca desapareceriam.

Meu Mestre, Meu ProblemaOnde histórias criam vida. Descubra agora