Capítulo 63- A carta

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"É tão difícil escrever essa carta, tão como foi a minha partida. Lhe deixar, foi mais do que um ato impensado ao modo que você interpretou. Um ato de amor, essa foi a minha tentativa ao deixar a sua alcateia, querido. Não poderia ser diferente, entre todos os amores você foi o mais belo de todos, perdendo o posto somente para minha querida filha Kira, a qual ansiosamente eu aguardo vislumbrar o seu rosto.

Nossa. Eu acreditei que o meus primeiros filhos seriam fruto do nosso relacionamento, mas a vida me disse ao contrário. Mesmo que ela não seja filha do homem que eu amo, irei amá-la incondicionalmente, assim como eu amo você. [...]

Eu mordia os lábios, com a ansiedade batendo forte em meu peito. Havia entendido até então, que essa carta foi escrita a próprio punho para o amor da vida de minha mãe. É tão linda as suas palavras. Carregadas de emoção. Sem querer, deixei uma lágrima solitária escorrer do meu rosto. O melhor de tudo, é saber que ela me esperou com todo o seu amor.

Somente ler esta carta é suficiente para me livrar de toda a atmosfera triste a qual abrange a minha vida. Seria tudo tão mais fácil se minha mãe estivesse aqui. Ela saberia acabar com a dor que eu sinto em meu peito. Um pouco mais calma, continuei a ler a carta.

"Kairos é um monstro. Juro que eu acreditei em suas promessas, principalmente que não iria lhe machucar. Talvez esse tenha sido o meu deslize, confiar em quem não deveria. Ele não mede esforços para demonstrar que havia feito a escolha certa em ficar ao seu lado. Esse foi o pior erro da minha vida. Ele é um psicopata que finge me amar, mas quando todos se vão, me maltrata como um saco de pancadas.

Ele me bate dia e noite, em lugares estratégicos para que ninguém perceba a sua agressão. Todos os dias eu subo a barra do meu casaco e vejo os arroxeados pelo meu corpo. Eu não entendo a sua raiva, talvez seja porque eu amei incondicionalmente o meu companheiro, um amor recíproco, o mais belo de todos."

Coloco uma mão acima dos lábios. Eu sabia que o meu pai era uma pessoa desagradável, contudo, jamais iria imaginar que ele maltratava Aurora desse modo, com agressões físicas. Com certeza minha mãe deve ter morrido de desgosto, por ter um homem daquele ao seu lado.

"Os meus dias estão se tornando mais sofridos. O parto está se aproximando, e eu temo o que possa acontecer com minha filha. Todas as noites eu sonho com a morte a me separar da minha pequena Kira. Não sei o porquê, mas algo me diz que será pelas mãos de Kairos."

Nesse exato momento os meus olhos se enchem de água. Se o que está escrito na carta, for real eu nunca mais irei perdoar o meu pai. Se ele foi capaz de retirar a vida da mulher que me trouxe ao mundo, e que me amava incondicionalmente, ele não merece que eu o chame de pai.

"Não sei se essa carta chegará até você, meu amor. Saiba que eu te amo e vou te amar para o resto da minha vida, até o meu último suspiro. Lembra que era assim que nos despedimos um do outro? Até o meu último suspiro. Em breve iremos nos encontrar.

De: Aurora.

Para o meu grande amor: Tyson"

Nesse exato momento eu tive absoluta certeza que a minha pressão caiu de ladeira abaixo. Não, não podia ser aquilo que eu estava imaginando. São nomes parecidos, mas não eram as mesmas pessoas. O meu Tyson não poderia ser o mesmo da minha mãe. Como isso poderia acontecer? Eu sorrio de nervoso.

Engolindo a seco eu volto a ler a carta novamente e os meus olhos caem para o nome ao final da folha. Tyson, Tyson, é o meu Tyson. As lágrimas começam a cair desesperadamente. Uma sensação estranha atinge todo o meu ser. Sinto-me enojada do meu próprio corpo, principalmente por ter me deitado com o mesmo homem que foi companheiro da minha mãe.

Coloco as mãos nos lábios e os limpo com o dorso da mão. Não! Eu não acredito que fui tão inocente em acreditar naquele homem. Com toda certeza sabia o que estava acontecendo. Sabia que eu era filha de Aurora e mesmo assim permaneceu a fingir que estava tudo bem enquanto eu entregava o meu coração e corpo por completo.

Desnorteada, ergo o tronco. Brevemente sinto um enjoo me transpassar. Coloco a mão acima da minha cabeça e tento me recompor. Isso não é hora de passar mal. Decido sair daquele local, sem nem ao menos pensar se haveria outra pessoa além de Carlota na cozinha. Por sorte, ela estava sozinha, quando me viu, me olhou espantada, com certeza meu rosto estava pálido.

— O que aconteceu com você, menina? Está branca como papel. Irei pegar um copo de água para você.

Não demorou muito para que ela me oferecesse o líquido. Eu derramei. Eu apertei os olhos sentindo a água gelada rasgar minha garganta. Somente não rasgava mais do que o meu coração que estava cortado em pedaços.

— Carlota. Isso é real?

Ergui a carta. Ela me olhou com espanto, engoliu a seco e desviou o seu olhar.

— Carlota..

— Onde você encontrou isso?

— Quando iria me contar que o meu companheiro foi o mesmo companheiro de minha mãe? É por isso que o meu pai e o alfa Tyson são inimigos. Eles amaram a mesma mulher e você não me disse nada.

— Kira.

— Cale a boca!

Juntei a sobrancelha. Ela saltou no mesmo lugar, assustada do modo que eu falei, e não era para menos, jamais havia levantado o tom de voz para Carlota. Ela era como uma segunda mãe, mas agora estava beirando a ser a minha inimiga direta.

— Você mentiu para mim.

— Entenda, isso tudo foi para lhe preservar.
Eu jamais mentiria em outras condições.

— Então me responda a verdade. Os dizeres nessa carta, a declaração de amor de minha mãe para um homem chamado Tyson, corresponde ao meu companheiro?

Ela respirou fundo, seus ombros caíram derrotados. Finalmente ela revelou a verdade.

— Sim. Eles se odeiam porque o seu companheiro também foi o companheiro de sua mãe.

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A companheira cega do alfaOnde histórias criam vida. Descubra agora