Capítulo 64- Grávida

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Eu não esperei que ela inventasse inúmeros argumentos para defender a sua tese e não ser sincera comigo. Então eu retornei para a cela e me deitei na mesma posição onde meu corpo estava. A decepção estava estampada em meu rosto. Eu não podia confiar em ninguém, até mesmo a pessoa que eu sempre confiei, mentiu. Estava perdida, não poderia contar nem mesmo com meu companheiro.

Confesso que a descoberta deixou um mal-estar absurdo em meu ser. Não admito que o meu companheiro tenha sido o mesmo de minha mãe. Seria audácia demais da Deusa Luna ou realmente ela possa ter reencarnado a alma de Aurora em mim. Balanço a cabeça. Tudo que eu queria era somente reconstruir a minha vida longe desse local, com meu filho em meus braços. Não sabia se isso seria possível.

Com esses pensamentos acabo adormecendo em meio ao chão úmido e sujo.

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— Bom dia, bela adormecida!

Sou acordada com um balde de água ao rosto. Enquanto tento retirar toda a umidade da minha face, ouço as risadas dos guardas. Infelizmente eu havia voltado para a realidade, não podia enxergar os seus rostos, talvez assim fosse melhor.

— Aqui está a sua refeição.

Um pacote é arremessado, sendo encostado em minhas mãos. Com certeza é um sanduíche. Eu pego em mãos, e na mesma hora arremesso fora. O cheiro está horrível, como se tivessem matado um bicho peçonhento e colocado entre as fatias.

— Eu não comerei essa porcaria. Me traga um sanduíche de queijo com presunto, e um suco de laranja.

Novamente ouvi a risada dos guardas. Isso despertou a raiva que habitava em mim. Ergui o meu corpo e apontei o dedo, aderindo ao meu título de filha do Alfa. Eles deveriam me respeitar.

— É melhor parar de rir, se não quiserem ser sacrificados. Meu pai não irá gostar nada de saber quando eu contar que vocês caçoaram de mim, entregando-me um sanduíche podre.

Eles continuaram, não só isso, dobraram o tom de suas risadas, causando-me dessa vez constrangimento. Encolhi o meu corpo e sentei ao chão.

— Se fosse por conta do seu pai, você nem estaria mais viva, morreria de fome. Essa refeição foi Carlota que a preparou, e mandou que lhe entregasse. Se não quer, tenho certeza que os ratos irão querer.

Então ele chutou a sacola e novamente esbarrou em meus braços. Reprimi os lábios com imensa vontade de gritar e assim eu fiz. Gritei o mais alto que pude, esbravejando toda minha dor e revolta. Estava triste com tudo e com todos. Descobri nesse meio tempo que o que mais odeio é a mentira, e aparentemente toda a minha vida está rodeada dela.

Minha barriga roncou, eu estava faminta, e sabia que os sanduíches de Carlota eram maravilhosos. Não sabia o porquê aquele cheiro estava me incomodando tanto. Por um tempo eu fiquei escorada na parede, esperando que a dor na barriga causada pela fome fosse embora. Impossível, se alguém estivesse há pelo menos 1 km de distância poderia escutá-la, isso estava me agoniando.

Ouvi o barulho dos ratos, eles estavam próximos. Não havia outra alternativa a não ser abrir a sacola e devorar o sanduíche, antes que eles fizessem. Com dor no coração, em uma luta interna, eu peguei aquela sacola e abri. O cheiro estava mais forte do que nunca, como se fosse um queijo podre. Então eu mordi. O gosto não estava tão ruim quanto o cheiro.

— Mm, isso está bom!

Por que eu disse isso? Segundos depois, vomitei tudo que havia consumido. Como uma espécie de enxurrada, todo vômito esvaiu, queimando meu estômago por completo.

— Merda!

Eu não parava de vomitar, aquilo estava muito estranho. Não era a primeira vez que senti um mal-estar. Alinhando com os outros dias em que a tontura me dominou, eu só posso ter uma conclusão. Eu estou grávida! Ergo meu corpo, essa informação acaba se tornando pior do que a descoberta recente. Eu estaria grávida novamente do companheiro de minha mãe. Não poderia ser de Richard, pois não tivemos relação nenhuma, pelo menos não que eu me lembre. A última vez foi com Tyson, em um dos meus sonhos, o qual eu acreditei que era um sonho. As lágrimas se formam imediatamente em meus olhos. Grávida de Tyson!

— Você teve sorte, menina. Sorte por ser filha de um dos homens mais poderosos da região. Ele conseguiu um grande feito, o qual obterá muitos ganhos.

Juntei as sobrancelhas. Era a mesma voz do guarda anterior.

— O que isso tem a ver comigo?

— O seu pai lhe vendeu para trabalhar em um palácio, em um país distante. Onde você será obrigada a fazer todos os tipos de serviços imagináveis.

Aperto os olhos. Um arrepio tremendo passa por todo o meu corpo. Todos os trabalhos possíveis... Não posso acreditar que o meu pai teve coragem de me vender!

— Por ser filha do Alfa, eles pagaram caro.

Meus olhos se encheram de água. Escutei passos, o barulho de botas acoplando ao chão se fez presente. O cheiro do meu pai invadiu o ambiente, automaticamente sei que ele está aqui.

— Papai. Eu não quero ir embora. Me deixe definhando nessa cela, mas não me faça ser escrava de outra pessoa.

Ele sorri, uma risada maquiavélica. Balanço a cabeça. Quando eu era criança, ele me amava.

— Não me faça rir uma hora dessas, Kira. Eu recebi uma ótima proposta de um reino distante. Eles precisavam de uma mulher, e você era ideal. Não sei em qual função irá trabalhar, mas espero que não decepcione.

— O senhor sabe muito bem que eu não vou trabalhar, serei escrava, provavelmente na mão de um homem sem escrúpulos, sem coração como você. Capaz de vender a própria filha em troca de algumas moedas.

— E o que eu faria carregando um peso morto? Uma inútil que não serve para nada, sem poderes nenhum! Não, você tem que me servir de alguma coisa.

Deixo as lágrimas escorrerem. Não queria demonstrar a minha tristeza, mas é impossível com tudo que está acontecendo. Ergo as mãos e limpo as bochechas. Levanto meu rosto, tentando mostrar o mínimo de dignidade. Sopro um ar, e decido fazer uma pergunta que tanto abala minha mente.

— Por que, papai? Por que me odeia?

Ele demora um pouco para responder.

— Porque você foi a causadora da morte de sua mãe.

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A companheira cega do alfaOnde histórias criam vida. Descubra agora