Dezembro, 2027.
Sexta-feira.
...POV Narrador.
30 de dezembro, faltava pouco para que se iniciasse um novo ano. A família Soares e S/N estavam novamente na cozinha, terminando de arrumar a louça e guardar as coisas após o jantar. Fabiana, Jackson, Giovana e Lucas resolveram se reunir na sala para assistir a algum filme. Eles sabiam que o clima estava pesado, e achavam que deixar as duas a sós poderia ser uma boa idéia para ajudar elas a se resolverem.
Enquanto isso, na cozinha, Júlia e S/N estavam sentadas frente a frente na mesa de jantar. Elas se olhavam com olhares que eram cheios de amor, mas também carregados de uma dor que parecia impossível de ignorar. O brilho e a cor do início haviam desaparecido, deixando apenas o cansaço e a tristeza.
- A gente pode ir conversar no quarto? - perguntou Júlia, com um tom de voz que denunciava sua necessidade de ser sincera.
- Acho que devemos. - S/N concordou, sentindo que precisava tirar o peso que sentia dos ombros. Ela não aguentava ficar mais um minuto na companhia de Júlia com aquele climão.
POV Júlia Soares.
Entrei no quarto logo após S/N, observando-a enquanto ela se sentava na cama. Fechei a porta, prendendo a respiração enquanto meu olhar se fixava no trinco, como se estivesse adiando o inevitável. Respirei fundo, me preparando e pensando na decisão do que faria a seguir.
Eu me virei e vi S/N, sua atenção focada nas malas que estavam no chão. Havia algo em seu olhar, e algo no meu coração dizia que ela está preparada para o que vem a seguir, que ela já sabia o que estava prestes a acontecer. Eu me sentei ao seu lado na cama e segurei sua mão com uma firmeza que nunca havia demonstrado antes. Ela olhou nos meus olhos. Seus olhos verdes encontrando os meus castanhos. Ambos os olhares estavam cientes de que aquele seria o fim.
- Eu não sei como começar isso... - minha voz saiu baixa, sincera, carregada de uma incerteza que parecia invadir meu ser.
- Mas eu sei... - disse S/N, sua voz decidida. - Você é tão indecisa sobre o que eu digo. Nunca sei se está feliz ou reclamando. Primeiro você quer ir pra esquerda e depois quer virar pra direita. Primeiro você topa, depois não quer mais, e depois quer ficar em cima do muro. Decida o seu coração. Eu quero muito saber, Júlia, o que você quer dizer? Quando balança a cabeça pra sim, está tudo bem, mas quer dizer não. O que você quer dizer?
Fiquei surpresa com a resposta dela. Eu não esperava que S/N estivesse tão preparada para enfrentar aquela batalha. Ela me olhava com um olhar indecifrável, mas eu conhecia bem aquela expressão. S/N sempre vinha ao meu encontro, sempre me entendia, mas dessa vez, sabia que amanhã diríamos adeus. E aqui, neste momento, eu estava prestes a cometer mais um erro que sabia que me arrependeria.
- Eu gostaria de dar tudo o que você precisa, mas eu não vou. Eu gostaria de deixar isso tudo pra lá, porque você vai ficar melhor sozinha, porque eu estou prestes a estragar tudo com você. Eu conheço essa expressão no seu rosto, mas eu nunca vou mudar, eu não conseguiria mesmo se eu quisesse por você. Não há mais nada para dizer. Se eu fosse você, eu ficaria a mil metros de distância de mim.
Soltei a mão de S/N, sentindo o peso da culpa e comecei a me questionar o que eu estava fazendo. Por que eu estou tentando quebrar o coração dela quando na verdade em seus braços é onde eu quero ficar. Queria que ela soubesse que cada palavra que eu havia dito poderia ser mal interpretada, mas eu estava ali, ainda ao lado dela, mesmo sabendo que o fim era inevitável.
POV S/N Peña.
Eu olhava para Júlia sem reação, tentando conseguir processar tudo o que ela estava dizendo. Eu sentia meu corpo dormente enquanto ouvia suas palavras. O som do meu coração batendo em meus ouvidos era a única coisa que eu conseguia ouvir. Mal notei quando sua mão soltou a minha, era como se eu não sentisse mais nada. Quando foi que eu fui ao paraíso e voltei?
- Bem, você mentiu. Você disse que estava tudo bem tantas vezes, mas agora, você está agindo como se estivesse com medo. Eu só queria que você fosse minha de verdade. Mas você nunca foi. Não de verdade. Sempre tive que me contentar só com um pedaço, enquanto o mundo fica com o resto. Eu não te culpo. E não deixo de te amar por isso. Mas não vou continuar suportando, não consigo, Júlia. Não tenho como viver com o coração na boca o tempo todo.
O que Júlia fez foi covardia, despertou o meu amor de forma incondicional mesmo sabendo que não poderia ficar. Me prometeu o Sol e me deixou só, no meio da onda turbulenta.
- Eu quero aprender a ser melhor para você, S/N, ser mais calma, compreensiva em certas situações. Ser o amor que você realmente merece, quero ser alguém que te faça feliz, e que não te faça duvidar do que sinto por você. - Júlia disse, mas as suas palavras já não faziam mais sentido pra mim.
As palavras de Júlia eram como punhaladas, cada uma delas fazendo com que eu me afundasse ainda mais em uma tristeza que parecia não ter fim. Ela está falando demais, isso está me desgastando. Estou gritando por dentro, mas ela não vai ouvir nenhum som. Eu estava tentando ser melhor do que nunca fui para alguém. Agora eu estou mordendo minha língua, evitando as palavras que não posso levar de volta.
A gente parecia tão bem, tão forte, tão juntas, quando foi que começamos a nos perder uma da outra? Quando foi que nossos melhores diálogos se tornaram silêncios recíprocos? Quando foi que a miragem de uma vida juntas se tornou um pouco mais de uma dezena de memórias sobre o passado?
- Acho que, no fundo, você jamais irá se acostumar a ser amada de verdade, Júlia. Eu tentei fazer com que você pudesse se sentir merecedora disso, até quando você não merecia. - minha voz falhou, e as lágrimas que eu segurava começaram a escorrer dos meus olhos.
Levei três anos para me apaixonar por ela. E apenas alguns segundos para me afogar nessa onda de amor que nunca seria suficiente para nós duas.
POV Júlia Soares.
S/N me olhava com um misto de raiva, mágoa e desilusão. Isso está acabando comigo, ela está escapando, eu estou me prendendo nas palavras de amor que ela me disse. Eu tenho consciência dos meus defeitos, mas amo ela como nunca amei ninguém.
"Porque quando eu te olhava, eu sabia que a dor da tua partida deixaria um vazio que nem o tempo seria capaz de preencher."
Vi S/N se levantar da cama e ir até sua mala. Sabia, naquele momento, que aquilo era o fim. Mas quem se despede, na verdade, não quer ir... Ela abriu a mala e tirou o livro "É Assim Que Acaba". Eu fiquei chocada, não fazia ideia de que o livro estava com ela o tempo todo. Ela se aproximou e me entregou o livro aberto na página 305, com uma frase marcada e um nome riscado.
No futuro... Se por algum milagre você achar que é capaz de se apaixonar de novo... Se apaixone por mim. - ela encostou seus lábios em minha testa. - Você ainda é minha pessoa preferida, Júlia. E sempre será.
Eu queria dizer algo, encontrar as palavras certas para impedi-la de passar por aquela porta, mas nada saiu. Nós temos na língua portuguesa mais de 400 mil palavras e eu não consegui usar nenhuma para impedir que ela passasse por aquela porta e fosse embora.
O meu conto de fadas com S/N havia chegado ao fim, sem um final feliz. Mas é assim que acaba!
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Ondas e Pódios - Julia Soares.
FanfictionS/N Peña, uma brasileira de 21 anos, é uma jovem estudante de Direito, sargento e pilota da Aeronáutica Brasileira. Além de tudo, ela é convocada para ser nadadora e representar o Brasil nos Jogos Pan-Americanos de 2027 no Peru. Durante uma entrevis...