No dia seguinte acordei meio dolorida. Mas foi o prazo de eu me olhar no espelho que toda a dor que sentia desapareceu num passe de mágica e eu me concentrei no horror que estava. Tudo o que fiz foi gritar.
- Bia, o que aconteceu? - minha mãe veio correndo até o banheiro.
Ela estava assustada até o momento em que seus olhos me viram. A partir daí ela ficou em choque.
- Você está horrível! - ela disse pasma.
- Muito obrigada, mãe! - disse quase chorando - O que eu vou fazer?
Minha pele inteira estava vermelha e descascando. Não era um vermelho qualquer, era super-hiper vermelho. Fora a dor que eu sentia. Algumas partes estavam vermelha e outras super vermelho.
- Você não passou protetor?
Foi aí que me lembrei: não. Fiquei tão concentrada em ver o Lucas que me esqueci do resto. Parabéns, Beatriz do Azar! Agora você estava parecendo um camarão.
- Já sei! Vou passar base porque daí esconde o vermelho.
- Nem pensar, mocinha! Você vai é passar um creme para hidratar essas queimaduras antes que piore. Como que você se esquece do protetor? - ela dizia massageando minhas costas.
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Uma vez li em um site que aquela sensação de que todos estão te olhando pode ser um truque da própria mente da pessoa. Mas comigo não era apenas um truque, era bem real e todos estavam me olhando, alguns davam risadinhas e outros cochichavam algo. Dava vontade de sair xingando todos, será que nunca tinham visto alguém vermelho não?
- Uou! - disse a Gabi chocada.
- Eu sei... Eu sei... - disse continuando a caminhar.
Naquele dia eu e minha amiga não tínhamos ido juntas por causa do meu incidente. Pelo menos ela não falou que eu estava horrorosa.
- Bia, você está horrorosa! - disse rindo.
- Bela amiga você. - disse desanimada. - Até meu óculos incomodam. Que dor!
- Você passou algum creme? Porque ajuda com essas queimaduras.
- Passei sim! Como que eu vou fazer se eu não enxergo de longe? - disse desanimada.
- Eu te ajudo, Bia. - disse sorrindo.
O ser humano tinha uma natureza de detectar primeiramente os defeitos das outras pessoas e quase nunca as qualidades, eu não podia reclamar porque era algo de nascença, olhar para alguém de cima a baixo e fazer uma primeira avaliação e na maioria das vezes errar a interpretação da mesma. Por que éramos assim? Por que sempre queremos ver a derrota do outro? É tão raro encontrar alguém que se importe mais com o interior do que com a aparência. Parece que todos estão sempre prontos para detectar a primeira falha, apontar o dedo e criticar. E era exatamente assim comigo, todos estavam fazendo isso pelo fato de eu estar com a pele queimada do sol.
- Bia Camarão, você está atrapalhando minha visão! - disse um dos meninos do fundo da sala.
- Vai se ferrar, Bryan! - disse tentando me manter calma antes que eu atacasse aquele menino com muitos socos e chutes.
E pelo jeito o restante das aulas seriam assim. Pelo menos até que minha pele voltasse ao normal ou eles perdessem o interesse em mim, e é óbvio que a segunda opção era muito mais convidativa. Adolescentes... Por que tão cruéis?
"... Senhores alunos, compareçam ao auditório para um recado importante..."
Ouvir a voz da diretora me fez lembrar o quão chocada eu fiquei quando ela tecnicamente me "ajudou" em relação ao professor Leonardo. Aquele fato não sairia tão cedo da minha cabeça. Eu tinha feito uma lista mental de possíveis motivos para ela ter me "ajudado".
1. Ela teve amnésia e esqueceu quem sou eu;
2. Ela tomou remédios a mais;
3. Ela estava de bom humor;
4. Ela queria se passar por boazinha e misericordiosa já que estava na frente do Caíque.
Eu não sabia qual delas poderia ter mais chances. Mas uma coisa é verdade: ela não tinha sido ela.
- Será que outra banda vai estudar aqui? - disse Gabi passando um brilho labial.
Eu rio.
- Desde que não sejam mais pessoas chatas para estragar meu dia, está ótimo! - digo sorrindo.
- Silêncio todo mundo! - disse a diretora limpando a garganta logo em seguida.
- Quer ver que outra banda vai entrar nesta escola? - disse a Gabi cochichando.
- Depois de algumas reuniões com o conselho da escola, percebemos vocês precisam de algo diferente este ano para separar os grupinhos e unir cada um. E é por isso que teremos uma peça teatral! - ela dizia empolgada em meio a cochichos dos alunos.
Peça de teatro?!
- Mas não se preocupem, não será Romeu e Julieta. Pensamos em algo diferente: não será uma peça conhecida, até porque selecionaremos alguns alunos para escrevê-la.
- E não se preocupem, todos terão que fazer algo, desde os bastidores até atuar. Ou seja, os professores passarão uma lista hoje e vocês irão escrever um talento que tenham. E finalizando, a peça será daqui há alguns meses e os ensaios começarão daqui duas semanas. É só isso, podem voltar à suas aulas. Tenham um bom dia! - disse sorrindo.
Peça... Teatro... Talento... Tudo que envolvesse me relacionar com essas pessoas nojentas da minha escola eu dispensava. Mas era obrigatório e valia ponto.
- E aí, Bia? O que vai colocar na folha de talentos? - disse se sentando.
- Meninas, silêncio por favor! Já comecei a entregar os testes! - dizia a professora de Química.
Em plena segunda semana de aula e já tinham testes.
Fiz meu teste com facilidade, acho que somente a Física mesmo que não simpatizava comigo. Mas eu teria que suportá-lá por mais um ano e depois eu iria para a Faculdade.
O último horário acabou bem rápido e um pouco antes de o sinal tocar a professora nos entrega o papel.- Pessoal! - ela dizia acenando - Aqui está a folha, escrevam rápido e dê para o outro colega.
Vi vários alunos empolgados com a ideia de mostrar no que eram bons, no entanto eu não sei se eu realmente gostava dessa ideia. Mas pelo menos não seria Romeu e Julieta, isso seria tão filme estadunidense.
Logo, logo a folha chegou até mim. O que eu colocaria? Eu não queria atuar porque era péssima, escrever a peça nem pensar, meus desenhos não serviriam para nada. Quem sabe se eu..."Beatriz Almeida, 2° ano - Dança."
Não poderia ser tão ruim assim, até porque eu danço desde pequena. Acho que não foi uma má ideia.
Meus pensamentos foram interrompidos com o sinal tocando: era a hora de irmos para casa.- Sabe o que eu coloquei? - disse a Gabi saltitante.
- É claro que sim! - disse irônica.
- Muito engraçado, Bia! - disse fingindo-se rir - Coloquei escrita para ser uma das roteiristas. E tu?
- Eu coloquei...
Não pude terminar a frase porque eu apenas senti algo bem gelado cair sobre meu rosto. Era água e fazia minha pele doer ainda mais. Tinha sido um dos meninos do terceiro ano, amigos do Lucas.
- Nossa, guria! Foi mal aí! - diziam sarcásticos.
Eu estava paralisada. Eu estava contando até um milhão para não sair esbofeateando o garoto.
- Gente, quem gosta de camarão? - dizia a Amanda, a minha ex amiga, rindo.
- E quem gosta de vaca? - disse com os olhos saltando. Eu ia explodir de raiva.
- Você não devia ter dito isso! - ela disse muito brava e erguendo a sobrancelha para um menino que tirava algo de dentro da mochila.
- Beatriz, pensa rápido! - ele disse.
Quando vi o que ele tinha jogado paralisei.
Literalmente.
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O Som do Coração
Teen Fiction"O que você faria se um popstar se tornasse seu melhor amigo?" "E se você se apaixonasse por alguém que te vê apenas como uma garota que vive precisando ser salva?" Esta é a história de Beatriz, uma garota comum que vê sua vida mudar a partir do...