- Onde eu estou? - Sophia piscou várias vezes antes de encarar o quarto branco, não era um lugar desagradável, era um lugar muito bom, todo mobilhado, cortinas em tom claro, cômodas e guarda roupas novos, as variadas camas combinando. Parecia que estava em um acampamento de luxo.
- No sanatório - a mulher de cachos encarou Sophia, pintava um livro de mandalas - doparam você por algumas horas, você não parava de gritar.
- Por que eu estou aqui? - sentou-se ainda sonolenta, aquela cama era um paraíso.
- Porque você é louca.
- Eu não sou louca.
- É sim - apontou o lápis verde - não te colocariam aqui por nada.
- Eu preciso ir pra casa - saiu da cama indo até o primeiro guarda roupa, abriu procurando suas peças.
- Seu guarda roupa é o terceiro, tire a mão dos meus vestidos - estava concentrada demais no seu livro - pare com isso, você parece uma adolescente birrenta.
- EU NÃO FAÇO PARTE DAQUI, EU SOU NORMAL. EU TENHO UMA FILHA.
- Você não é nem um pouco normal, a gente sabe o histórico de todo mundo que entra aqui.
- Vocês tem acesso pra saber alguma coisa?
- A Madalene tem, mas ela não gosta muito de dizer - deu de ombros - meu nome é Kate, prazer.
- Prazer, Sophia - a loira encolheu os ombros - quer dizer que eu estou internada aqui? Eu não posso ficar.
- Eu disse a mesma coisa quando entrei, é fácil, você se acostuma. Eu gosto daqui, é melhor que a minha casa.
- Como pode gostar de um sanatório?
- Não é tecnicamente um sanatório, não são todos loucos, são pessoas com problemas na vida. Tipo você - encarou Sophia.
- Eu não tenho problemas na vida.
- Depressão pós parto, é ninfomaníaca, o que mais você quer pra atingir a sua lista? - a fuzilou com o olhar.
Sophia piscou rápido vendo alguém entrando pela porta, a enfermeira de roupas brancas e salto alto entrou, tinha dois copos descartáveis nas mãos.
- Que bom que acordou, Sophia - foi até ela - isso é pra você.
- O que é isso? - encarou o copo com dois comprimidos e o outro com água.
- Seu remédio, essa é a sua medicação daqui em diante.
- Está falando sério?
- Você quer melhorar e sair daqui? É melhor beber - entregou o copo a Sophia que fez cara de nojo, mas tomou mesmo assim.
- Isso vai me apagar sempre?
- Não, isso vai controlar a sua mente e desenvolvimento. Aplicamos um calmamente pra você apagar, estava agitando quando saiu da sua casa.
- Quero saber quem me colocou aqui dentro.
- Seu marido - sorriu doce - ele assinou um termo durante quatro anos.
- QUATRO ANOS? - se desesperou - EU NÃO POSSO FICAR TRANCADA AQUI DURANTE QUATRO ANOS.
- Pode, e ele autorizou. E tudo depende de você, da sua recuperação.
- EU VOU MORRER AQUI DENTRO.
- Ninguém nunca morreu aqui dentro, fique tranquila - voltou a sorrir - daqui em diante essa é a sua nova casa, esse é seu quarto que você divide com mais três mulheres, nós temos o jardim preferencial, a cozinha, a sala, showroom, tudo que precisar está aqui - disse calma deixando Sophia em estaca zero, aquilo era um pesadelo a mesma.
- Eu não vou aguentar ficar aqui durante quatro anos.
- Vai sim, nós temos tudo especializado pra você. Amanhã é o seu tour pra conhecer a clínica, você vai adorar as piscinas.
- Jesus, isso é um pesadelo.
- Não é, acredite - deu as costas indo até a porta - se precisar de alguma coisa estou no ambulatório, seja bem vinda Sophia.
A enfermeira saiu deixando Kate e Sophia sozinhas.
- Quatro anos?
- Se você ficar repetindo isso várias vezes aí sim vai ficar louca - tinha terminado de colorir.
- São quatro anos, você tem noção disso?
- Eu fiquei dez, você aguenta.
- DEZ ANOS? - sentou na cama de Kate enquanto ela ajuntava seus lápis.
- Eu cometi suicídio três vezes depois que minha filha morreu, eu não vivia muito bem. Minha mãe sempre me visita e meu sobrinho me manda dinheiro, ele é dono de uma indústria.
- E a sua família?
- Minha família é minha mãe e minha filha, o resto não é ninguém.
- E seu marido?
- Eu fui mãe solteira - respirou fundo.
- Sinto muito, Kate.
- É normal - saiu da cama guardando seu livro - você deve conhecer as outras meninas, elas são legais.
- Onde estão elas?
- No grupo de apoio, hoje eu não quis ir mas somos obrigados duas vezes por semana - explicou - melhora seu pensamento positivo, os médicos sempre dizem isso.
- Somos obrigados? - fez uma careta.
- Somos, eu ganhei uma advertência hoje por não ter ido.
- Advertência?
- Sim, se você tiver no máximo seis você ganha punição.
- E qual é a punição?
- Eles bloqueiam todo acesso a família, você não recebe visitas, não recebe o dinheiro que mandam pra você, essas coisas.
- Esse lugar é tenebroso pra mim.
- Já disse que você vai se acostumar - Kate foi até a porta - vem, vamos até o refeitório.
- Eu não quero comer.
- Você precisa, deixe esse seu lado de adolescente birrenta. Não quer ganhar punições agora que chegou, ou quer?
Kate tinha razão, Sophia não estava pronta pra encarar vários tipos de punições, já estava louca só de pensar que ficaria quatro anos sem ver Micael, quatro anos sem ver sua filha, sabia que tinha os problemas mas quatro era demais. Demais a todos.
As duras saíram ao refeitório, os enormes corredores da clínica deixaram Sophia mais tranquila, aquilo parecia um shopping de luxo, ela lembrou os velhos tempos quando gastava sua mesada em roupas importadas e sapatos de grife.
Entraram no refeitório bem iluminado, haviam pessoas terminando suas refeições, não pareciam loucas e sim muito normais pra estarem ali. Kate ensinou tudo a mesma e logo as duas estavam procurando algum lugar pra sentar, o prato de Sophia estava bem verde, diferente do que ela comia quando Micael não estava em casa.
- Está se sentindo melhor?
- Um pouco - abriu seu suco de laranja - aqui não é tão ruim quanto parece.
- Não é, você vai ver - sorriram.
Estava conseguindo destruir suas barreiras da doença.