XVIII - A Mãe Waydusk

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"A Água nos afogou
A Terra nos enterrou
O Fogo nos queimou
E o Ar, nossas cinzas soprou
— As Cinzas".

CAPÍTULO 18

O ar sombrio da casa fez com que minhas pálpebras ficassem pesadas. As paredes cor de rosa e os tacos de madeira que cobriam o chão do corredor extenso pelo qual eu caminhava não conseguiam impedir a obscuridade de penetrar no ambiente gélido. Era difícil continuar caminhando, mas tive que inspirar profundamente e prosseguir. Meus pulmões chegaram a tremer com o ato, pois um cheiro pútrido, misturado ao de maçãs e mel, exalava por todo o local, o que me fez sentir um tremendo nojo a cada passo que eu dava.

Minha única vontade era a de fugir dali.

Permanecer naquele lugar me causava tonturas. A cada piscar de meus olhos uma imagem diferente dos cômodos, como em flashes, aparecia em minha visão, porém não conseguia gravar nada, parecia que algum tipo de força mexia comigo.

Conseguir perceber que tudo o que eu estava vendo poderia ser apenas uma ilusão mostrava que meu interior lutava para me deixar lúcida. Saber disso explicava a beleza de um lugar tão horrível.

Assim que atravessei o corredor, dei direto para uma sala mal iluminada, com uma única janela coberta por tapumes. Seu papel de parede era verde, repleto de rosas brancas, e o único móvel existente ali era um sofá marrom.

Quatro crianças estavam sentadas nele, encarando a parede vazia como se estivessem entretidas com o nada. Me aproximei delas e sacudi as mãos em frente aos seus rostos, mas não obtive reação alguma.

Esquisito...

Pelo visto a única saída viável daquele cômodo era o corredor do qual eu acabara de vir. Outras duas portas estavam presentes nele, mas uma se encontrava vedada e a outra dava para uma provável cozinha. Também havia uma escada em L ali, mas ela apenas permitia acesso ao andar superior.

Enquanto ainda observava o local ouvi passos virem da cozinha. Achei que poderia ser algum jovem ou criança prestes a entrar pela sala, mas quando um arrepio percorreu minha espinha sem que eu nem mesmo tivesse visto quem era, soube exatamente o que estava por vir.

— Estive esperando por você, meu bem. — Uma voz feminina, que eu conhecia muito bem, alcançou meus ouvidos. Ela não era quem fingia ser, ouvi-la era como sentir o gosto da morte.

Me virei com cautela, quase temendo encará-la, mas sabendo que sua ilusão me alcançaria, a raiva consumiu o meu peito. A criatura estava usando a face da minha mãe, mas nem mesmo seu rosto angelical, cabelos dourados como o sol e sua íris verde eram capazes de emanar o brilho da vida. O que estava à minha frente era completamente demoníaco.

Rangi os dentes e quase a ofendi, dizendo que por mais que ela tentasse se parecer, jamais seria minha mãe, mas as instruções de Katherine ainda eram claras em minha mente. A Mãe Waydusk jamais podia ser contrariada.

— Mãe... — Um sorriso amarelo estampou meus lábios quando essa palavra saiu da minha boca. — Eu estava ansiosa para... te ver.

E matar também.

— Não seja cínica, docinho. — Percebi certo esforço da parte dela para se manter serena. — Eu estava muito mais ansiosa do que você. — Isso não parecia ser bem a verdade. — Por que demorou tanto?

Abri a boca para questionar o motivo de ela agir dessa forma, como se não fosse um monstro e realmente estivesse aguardando a filha com tanto apreço, mas me calei. Pelo visto a coisa era surtada, por isso não podia ser contrariada.

— Por que não responde, filha? — A criatura inclinou a cabeça para o lado ao perguntar.

— Estava em dúvida. — Menti, inventando uma desculpa esfarrapada apenas para ter o que responder.

A Rainha das Chamas IOnde histórias criam vida. Descubra agora