A Rainha das Chamas I

XXXVIII - Escuridão Que Assombra

"Em minhas mãos
Um sussurro me levou
Até a tua alma
Que então se libertou
Mas a morte
Não queria lhe deixar
Insisti em te levar
E isso me custou
— As Cinzas".

CAPÍTULO 38

Caminhar por tanto tempo deixou minhas pernas cansadas. As coisas eram diferentes sem meus poderes, as juntas doíam com mais facilidade, o fôlego me faltava ao subir mais de cem degraus de escada, queria tomar água a cada trinta minutos e a fome era muito mais voraz. Uma pena, eu diria, meu estômago começou a arder na metade do passeio.

Enquanto fazíamos a tour, Stella, além de cantarolar sem parar, me explicou que cada uma das torres representava um dos seis elementos e o salão central, onde o sétimo Guardião, Aranielis, deveria ficar, representava todos os elementos. Eu não vi o Guardião em lugar algum quando entramos lá, mas ao passar por debaixo da abóbada central acabei descobrindo que os símbolos que ficavam no teto representavam um elemento de acordo com a grafia mágica. Nessa estavam todos, com um adendo a mais, eu diria, no mármore do chão os símbolos paralelos foram esculpidos, dando um contraste incrível à arquitetura local.

A torre da qual eu estava quando cheguei pertencia a Ar, Stella dissera que o Guardião do respectivo elemento se chamava Caeli, mas eu também não o vira em lugar algum. Uma hora ele apareceria, foi o que ela disse, todos adorariam ver um rosto novo pelo local, então, assim como Caeli, não demoraria para eu conhecer Ignis, a Guardiã do Fogo, e Terra, o Guardião da Terra, mas se eu quisesse ver Lux teria que ser levada até fronteira da travessia da Luz.

De acordo com Stella, a Guardiã se encontrava acorrentada nesse local por conta de uma maldição, porém não me deu mais detalhes sobre isso, muito menos sobre Aranielis quando deixamos o salão principal. Ela nem mesmo me afirmou que eu poderia conhecer o Guardião, o que me fez imaginar que talvez ele fosse um pouco mais tímido do que os demais.

Após me mostrar tudo, Stella me levou até a cozinha. Fizemos um rápido lanche enquanto eu a questionava sobre seus passatempos. Stella contou que passava a maior parte do tempo no Palácio da Magia, estudando os feitiços, adquirindo conhecimento e debatendo com os Guardiões maneiras de quebrar a maldição que rege o mundo.

Julguei ser uma tortura, ainda mais quando ela disse que fazia quase onze anos que não saía de lá. Se o tempo no lugar passava mais lento, significava que para ela a sensação era de ter permanecido trinta e dois anos presa nele, sem contato algum com o mundo externo. Com isso pude entender o motivo de ela ter ficado tão eufórica ao ver um rosto novo. Mesmo recebendo visitas de Ian e outros dos quais ela não citara o nome e sabiam da existência do palácio, para ela eram sempre os rostos das mesmas pessoas.

Ao terminarmos o lanche fomos ao quarto de Stella. Eu poderia dormir tranquilamente no espaço aconchegante entre a biblioteca do Fogo e Ar, porém a conversa se tornou muito mais interessante quando ela começou a falar sobre magias e feitiços. De acordo com suas palavras, a magia não se dava bem com pessoas que possuíam poderes, por esse motivo o Palácio da Magia restringia essa força, mas mesmo tendo estudado durante tantos anos ela não era capaz de fazer feitiços da maneira que deveria.

"Somente um elemental é capaz de conjurar feitiços com extrema perfeição." Foram suas palavras com exatidão, mas de acordo com ela isso não significava que feitiços lançados por pessoas que não tinham esse poder falhavam, porém sua primeira informação me fez estremecer, pois apenas eu conseguia realizar esse feito. A relação dos meus poderes com o passado era inteiramente bizarra.

Enquanto conversávamos, Stella parecia demonstrar que me conhecia mais do que por apenas um dia de convivência. Além de ela ter preparado meu lanche preferido, queijo presunto e palmito, Stella levou para o seu quarto algumas tortinhas, de maracujá principalmente, para que pudéssemos comer durante o dia, mas não eram somente os seus gestos que me diziam algo a mais, a maneira como ela falava comigo, como parecia feliz em estar ao meu lado, tudo para ela pareceu tão especial que seus olhos emanavam um brilho irradiante, mas esse mesmo brilho às vezes me fazia entrar em profundo devaneio.