Capítulo 15

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Meus olhos observaram meu dono no sofá. Pensei em me aproximar, mas ainda não sabia se seria bem recebido. A pessoa que havia me recolhido de uma caixa de papelão costumava ter um humor muito variável. Admito que ele nunca me agrediu ou gritou comigo, mas eu temia incomodá-lo. Pelo que pude notar, naqueles poucos dias em que morava com Namjoon Kim, era o fato que o homem costumava ter um humor que ia do feliz ao zangado em segundos, como se estivesse constantemente em adrenalina.

Oh, quem eu sou? Até a poucas semanas, eu sequer tinha um nome. Agora, me chamam de Minikui. Sim, eu sei o que você está pensando... é um péssimo nome, não é? Mas, o humano que me acolheu, ao escolhê-lo, riu bastante. Então, se ele se divertiu, eu fico feliz. Não é esse meu papel? Fazê-lo feliz?

Não, realmente não é esse o meu papel.

Eu sou um gato. Gatos não nasceram para servir, e sim para serem servidos. Pretendo, em pouco tempo, adestrar aquele homem grande para que ele entenda que sou eu quem manda no pedaço. Pela forma como ele anda olhando para mim ultimamente, sei que é questão de alguns dias para Namjoon Kim comer nas minhas patas.

Mas, vamos a minha história: sou o sexto filhote de uma ninhada de sete. Meu sétimo irmão não aguentou a sarna e morreu. Meus outros irmãos, saudáveis, foram postos juntamente comigo em uma caixa de papelão e largados na rua. Todos conseguiram um papai ou uma mamãe, mas ninguém me quis. Não os culpo. Antes de ser encontrado por um anjo de olhos gentis, havia visto meu reflexo no espelho.

Oh, esqueci-me de mencionar isso: sou feio. Não um feio comum e simplório, mas aquele feio de "Cacete, que feio!". E, por isso, ninguém me quis. Bom, o anjo queria, mas meu dono me pegou dele. Enfim, rodei por duas mãos numa disputa amorosa. Ah, claro, todos vocês sabem que Jung Hoseok e Namjoon Kim se amam, né? Mas, aparentemente meu dono está sendo obrigado a casar com a fêmea Aera, que sempre está no cio.

Meu dono se ergueu. Dois passos em direção ao quarto. Retorno. Passos novamente. Retorno. Sentou-se no sofá. Ergueu-se.

— Minikui, boa noite – ele disse.

Coitado, ele ainda não percebeu que eu não falo a língua dos humanos. Sinto pena dele, mas acredito que logo ele vai conseguir descobrir que teremos que usar outras formas de nos comunicar.

Acomodei-me no sofá, cansado. Ah, não falei disso a vocês, não? Adoro dormir. Eu posso dormir por horas, sem parar. E acordo apenas para comer e tomar leite. E, então, eu volto a dormir. Se meu tutor não ficasse me pegando no colo e me levando pra tudo que é lado, eu ficaria dormindo o dia inteiro na sua cama. Bom, admito, não ficaria. Se não fosse meu tutor, seria sua mãe. A mulher vai ao quarto trezentas vezes por dia para me fazer carinho na cabeça e dizer que eu sou a coisa feia mais fofa que ela já viu.

A família Kim é realmente estranha. E agora eu sou um Kim... Bem, como diria meu tutor: "foda-se!". Não ligo de ser um Kim contanto que continuem a me dar leite e ração.

— Ei, quem é você?

Olhei para baixo. Um filhote de labrador me encarava curioso. Seu rabo balançava de um lado para o outro.

Ah, que saco! Um cachorro!

Entendam, nada tenho contra a espécie de retardados que comem o próprio vômito. Apenas questiono a sabedoria divina por ter criado seres tão acéfalos e inúteis.

— Sou Minikui – respondi, sem paciência. – E boa noite.

— Minikui?

Acreditem em mim ou não, ou cachorro começou a pular de tanta excitação.

— É – respondi.

— Você é o filhinho do Namjoon? – o cachorro me questionou.

Filhinho?

— Eu sou o netinho de Jimin e Jeon – ele me contou, como se aquilo me interessasse.

— Bom saber, e boa noite.

— Nós somos parentes?

Abri meus olhos. Por que diabos um cachorro achava que um gato seria seu parente?

— Não somos – respondi, buscando todo o resto de educação que me restava.

— Somos sim – ele defendeu sua ideia. – Porque no BTS não precisa ter o mesmo sangue pra ser parente. Eles são todos casados uns com os outros.

— É mesmo?

— É sim, e eles se amam – o cachorro deu um impulso e pulou no sofá. – Então a gente também se ama – ele latiu.

Eu tenho poucas semanas de vida e, portanto, poucas certezas. E uma dessas certezas é que eu não amava aquele pulguento a minha frente.

— Que bom – fingi animação. – Boa noite.

— Agora a gente vai poder quebrar tudo juntos – ele continuou a tagarelar, como se não percebesse meu desconforto.

— Quebrar? – Oh Deus, por que eu o incentivava?

— Sim! – o cachorro quase caiu do sofá, tamanha a força com que seu rabo balançava. – Quebrar todos os vasos, é tão legal!

Fechei os olhos. Quem sabe ele não notasse o quanto eu desejava ficar quieto.

— Sou Mago – ele se apresentou. – Mago, filho de Junior, neto de Jeon e Jimin!

E quem perguntou, droga?

— Por que você não tem pelo em algumas partes do corpo?

— Porque eu tive sarna – respondi, mal humorado.

— O que é sarna?

O que eu fiz nos meus poucos dias de vida para merecer isso?

— Posso dormir com você? – ele indagou assim que percebeu que eu não mais responderia.

Não contestei. Faria qualquer coisa para ser deixado em paz. Então abri um vão entre meu corpo encolhido. Mago se aproximou e deitou a cabeça sobre minha barriga. Logo estávamos embolados. Era bom porque era quente e, de alguma forma, eu gostei do cheiro dele.

É... talvez realmente a gente fosse uma família.

Não que eu me importasse, é claro...

Eu só queria leite e ração.

***

— Namjoon – Jimin resmungou – me solta!

— Não! Se eu me afastar, você vai ficar de mal comigo de novo... – o maior murmurou.

— Eu quero tomar água!

Kim fingiu que não ouviu. O rosto afundou novamente no vão do pescoço do amigo, e ele aspirou seu perfume.

— Ei... – Jimin chamou sua atenção. – Olha lá.

O mais velho ergueu a face. A imagem que viu fez ambos os homens sorrirem. Seus bichinhos de estimação estavam dormindo aninhados.

— Não negam que são BTS – Namjoon sussurrou.

— É verdade – o outro concordou. – Eles têm verdadeiramente o espírito do BTS.

Rendição (Jikook)Onde histórias criam vida. Descubra agora