Capítulo 15

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O vento leve e fresco da noite balançou de leve as janelas do quarto hospitalar. O verão intenso que elevava as temperaturas a níveis angustiantes durante o dia dava uma trégua à noite, trazendo alivio aos moradores da metrópole.

Num dos quartos do maior hospital de Seul, apenas o silêncio fazia companhia as duas pessoas. Audrey Morgan e Park Jimin se encaravam com cumplicidade. Os demais que haviam estado naquele local tinham saído para dar aos dois amigos a privacidade necessária para conversarem e matarem a saudade. No entanto, Jung, Kim e Jeon não sabiam que Jimin usaria aqueles instantes para abrir seu coração a americana, contando-lhe tudo que havia lhe angustiado durante o dia, dando destaque a visita da mãe.

— Nunca terei filhos... – a voz feminina anunciou, quebrando o silêncio, após ouvir detalhadamente o relato.

Jimin arqueou as sobrancelhas.

— Por que diz isso?

— Como poderia dar a uma criança algo que nunca recebi? Não saberia amar...

Jimin aquiesceu. Compreendia exatamente o que ela falava.

— Não somos como nossos pais – ele afirmou, porém.

O riso debochado invadiu o ambiente, demonstrando que a mulher não tinha tanta fé em si mesma. Audrey estava sentada na lateral da cama, numa posição em que sua mão podia pegar na de Jimin, confortando-o.

— Sua mãe foi indelicada com você? – questionou.

— Não – Jimin negou. – Mas, ela poderia pelo menos ter me tocado – reclamou. – Não digo um abraço, ou coisa assim. Todavia, gostaria que pelo menos pegasse na minha mão.

A morena balançou a cabeça, numa postura compreensiva.

— Minha mãe também nunca me tocou – contou a ele. –Recordou-me bem disso, pois ficava espantada quando via a vizinha abraçando seus filhos. Eu não sabia que existia carinho até então, pois tudo que recebia da minha mãe eram palavras grosseiras e surras.

A forma como a garota discorria o passado deixava claro a Jimin que Morgan não queria piedade. Ela pronunciava as palavras como se nada do passado pudesse machucá-la, como se houvesse uma muralha separando-a daquela menina muda. Mesmo assim, Jimin não pode deixar de ficar tocado.

— Foi muito difícil? – ele indagou.

— O quê?

— A morte dela – explicou.

Audrey suspirou. Já haviam se passado muitos anos, mas a lembrança era intensamente viva em sua mente.

— Naquela noite, ela havia chegado mais cedo do trabalho. Como era garçonete, não costumava estar em casa nos horários de movimento, então estranhei quando entrou em casa bastante alterada. Mais tarde fiquei sabendo que havia sido demitida por causa das drogas. – Mordeu o lábio inferior, mostrando-se perturbada pela primeira vez. – Ela já havia comprado cocaína e heroína, e, pelo jeito, já havia se drogado um pouco na rua. Começou a procurar por Steven, mas eu já o havia escondido no roupeiro do meu quarto.

Jimin compreendeu o quanto Morgan havia se sacrificado pelo irmão durante aquela época. Tirá-lo do campo visível a deixava ainda mais alvo dos adultos.

— Alguns minutos depois, meu padrasto chegou. Os dois começaram a discutir por causa de dinheiro. – Morgan gargalhou, surpreendendo Jimin. – Ele queria se drogar, mas a vadia escondeu a própria droga para não dividir – contou. – Minha mãe era extremamente egoísta.

Os olhos dela baixaram como se tivesse vergonha do que veio a seguir.

— Ele estava lúcido, e o calor da discussão o excitou. Transaram na cozinha. – Os olhos eram vazios, frios. – Quis fugir, mas fiquei com medo de que, quando fossem me procurar, encontrassem Steven – explicou. – Então me virei de costas para não ver, e fingi estar em outro lugar, em outra família.

Rendição (Jikook)Onde histórias criam vida. Descubra agora