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Visitei Rodrigo naquele lugar por mais algum tempo. Sempre igual, sem beijo, sem abraço, toda visita um hematoma novo, uma desculpa diferente. Aquilo era desumano demais, se existia algo aproximado do inferno era a Febem da imigrantes.
Eu e minha sogra apelamos para a Pastoral Carcerária, onde o padre Júlio Lancellotti ouviu meus apelos e conseguiu uma transferência para Rodrigo para a Febem do Tatuapé, unidade 13, destinada a jovens e adultos (18 a 21anos).
Foi Deus! Juro! No dia seguinte que Rodrigo foi transferido estourou uma rebelião na Imigrantes, onde podíamos ver pela televisão, jovens sendo incendiados, cabeça sendo jogada do telhado. Os monitores espancam os menores e os pais assistiam tudo do lado de fora pelas grades de ferro que cercavam a unidade.
Vi tudo aquilo com muita pena pelos familiares dos jovens que estavam ali, mas muito aliviada pelo pai do meu filho ter ido pra um lugar melhor.
Dias depois liberaram a visita, dessa vez fui eu, eu sogro, minha sogra, meus cunhados e o Danilo. No Tatuapé era permitido entrar toda a família.
O ambiente era bem mais agradável, tinha música, alguns jogavam futebol, as famílias podiam abraçar os seus internos, era bem mais leve, a gente podia até sentar no chão ou nos bancos de concreto no refeitório.
Por um acaso eu havia nascido e crescido ali em frente a essa unidade, conhecia muito bem o bairro e acabei contando isso pra Rodrigo.
Vivi essa rotina por 7 meses, todo fim de semana eu acordava cedo, pegava fila, visitava ele por algumas horas, depois a gente se despedia, abraçava, chorava e eu voltava pra casa carregando meu filho, sem saber quando tudo aquilo ia acabar, aliás, sabia sim, quando ele fizesse 21 anos era certeza que ele voltaria pra casa, antes disso era só uma esperança do juiz liberar, mais nada.
Nessa unidade ele parecia que estava melhor, tinha feito alguns amigos e não demonstrava mais estar sofrendo.
Um dia ele me chamou de canto e começou a perguntar
- Você conhece mesmo esse lugar?
- Claro, eu cresci aqui.
- Hum, mentira! Se for verdade me diz o que tem do lado de fora?
- Uma avenida.
- E do lado direito?
- Uma delegacia
- E do esquerdo?
- Outras alas da Febem, são muitas, tem até ala feminina.
- E atrás? O que tem aqui atrás?
- Uma fábrica velha
- Ahh.
- Porque de tanta perguntas Rodrigo?
- Pra ver se vc conhece mesmo.
- Claro que conheço, vc acha que vou mentir pra que?
- Eu acredito em você, sua boba. Depois dessa fábrica tem mais alguma coisa?
- Do outro lado da avenida tem um parque, nesse parque tem um bosque, minha mãe costumava me levar lá pra brincar.
- É mesmo?
Rodrigo perguntou muitas coisas do lado exterior e eu respondi sem me preocupar.
Passamos o resto da visita tranquilos, Rodrigo algumas vezes ia falar com os outros jovens, ele realmente estava ambientado, tinha muitos amigos por lá.

Rejeição e VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora