13. A vez em que um jovem órfão partiu em uma missão de paz

1K 225 237
                                    

Estávamos de volta à pousada, tomando chá na cozinha, deserta naquele horário da noite. Eu ainda tentava digerir todas as informações reveladas por minha tia e entender como precisaria agir daquele momento em diante.

— O que tanto você remói aí nessa cabecinha, mocinho? — ela perguntou, quebrando o silêncio que nos envolvia.

— Eu só queria entender... Por que minha mãe fez isso, tia? — deixei escapar a dúvida que me corroía por dentro. — Se ela sabia de todos esses riscos, por que ela insistiu em me trazer ao mundo mesmo assim?

— Eu sei que a princípio tudo soa bastante irresponsável — tia Laura pontuou. — Mas preciso reforçar que sua mãe tomou uma série de precauções para te proteger. Primeiro, o ritual de selamento, para conter a magia dentro de você. Depois, a mudança para a capital, um lugar praticamente nulo em energias mágicas. E, acima de tudo, o fato de você ser um híbrido, e não um puro-sangue. Laís sabia que era praticamente impossível o cernuno despertar em você nessas condições. Uma prova disso foi você ter vivido todos esses anos da sua vida sem nunca nem desconfiar da existência da magia — concluiu ela.

— Essa parte eu consigo entender, faz sentido. Mas e se alguém do mundo bruxo descobrisse que ela tinha tido um filho? Eu sou a cara da minha mãe, não teria nem como ela mentir e dizer que eu fui adotado! — argumentei.

— Laís também pensou nisso — minha tia respondeu. — Nos primeiros anos depois do seu nascimento, ela simplesmente escondeu sua existência do resto do mundo. Mas, depois que seus avós se mudaram daqui, ela se sentiu mais segura e passou a me visitar em Esmeraldina de tempos em tempos. A todos que perguntavam, ela fazia questão de dizer que você era o segundo filho, depois de ela ter sofrido um aborto espontâneo em sua primeira tentativa de engravidar. A história era repetida com tamanha naturalidade que ninguém sequer a contestava. Como dizem por aí, uma mentira contada mil vezes acaba se tornando uma verdade. E, mesmo que algum bruxo se aproximasse de você, ele não conseguiria notar nada de errado, já que havia o feitiço de selamento te protegendo. Então, nunca pense que sua mãe te deixou desamparado, pelo contrário! Ela tomou todas as medidas possíveis para te defender!

— Mas, mesmo assim, o cernuno despertou... — repliquei, aborrecido.

— E sabemos que não foi por acaso, não é mesmo? — minha tia insistiu. — Primeiro, não tivemos escolha e você teve que vir morar aqui, em meio a toda essa confluência de energias mágicas. E, depois, você ainda passou por uma série de situações em que seus poderes foram incentivados a se manifestar... Nenhum feitiço de selamento resistiria a tudo isso! Você por acaso se lembra qual foi a última vez em que esteve em Esmeraldina, antes de se mudar pra cá definitivamente? — ela me perguntou.

— Quando o tio Pedro faleceu... — respondi, depois de pensar um pouco. — Viemos para o velório dele.

— Exato! Sua mãe só te trouxe porque era uma situação extraordinária e vocês precisavam se despedir do seu tio... — ela justificou. — Mas, mesmo naquela ocasião, nós reforçamos o seu feitiço de selamento pela noite, enquanto você dormia, e combinamos que ela não te traria mais à Esmeraldina, como uma medida adicional de proteção. Por que você acha que sua família nunca mais veio pra cá desde então, e apenas eu ia visita-los na capital?

— Nunca tinha parado pra pensar sobre isso, mas, agora, com essas explicações, confesso que tudo faz mais sentido... — admiti.

— Então, por favor, não crie uma imagem negativa da sua mãe — tia Laura insistiu. — Ela o amava mais que tudo e fez o possível e o impossível para que você pudesse ter uma vida normal e segura. Infelizmente, o destino acabou pegando a todos nós de surpresa e atrapalhou todos esses planos...

O Clube da Lua e o Devorador de Sonhos (Livro 2 ✓)Onde histórias criam vida. Descubra agora