46. A vez em que um jovem órfão arcou com as consequências de seus atos

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O dia já estava amanhecendo quando estacionamos o carro na pousada e subimos para o sótão, eu e Ian. O clima entre nós estava pesadíssimo e eu não fazia ideia do que tanto ele tinha para me dizer. Será que finalmente admitiria que eu já não era mais tão importante em sua vida e que agora ele já tinha encontrado uma nova pessoa? Será que terminaria comigo de uma vez para finalmente tornar o caso dele com Caio oficial?

— Bambi, você não vai abrir a porta? — Ian perguntou, ao meu lado, me despertando de meus devaneios. Apenas disfarcei meu momento de desatenção e destranquei a porta do meu quarto, tornando a trancá-la assim que nós dois entramos no cômodo.

— Eu tô todo sujo de barro e preciso tomar um banho — informei. — Não tenho condições de conversar nesse estado.

— Vai em frente, eu espero — ele respondeu. — Você se importa se eu fizer um café enquanto isso?

— Não, fique à vontade, você já sabe onde estão todas as coisas — respondi, pegando minha toalha e seguindo para o banheiro.

Enquanto a água escorria sobre meu corpo e o ralo levava embora toda a sujeira adquirida durante minha visita à reserva, voltei a refletir sobre a inevitável discussão de relação que me aguardava assim que eu saísse daquele cômodo. Eu me sentia horrível, com um gosto amargo na boca, e recusava-me a acreditar que tudo o que vivi com Ian tinha significado tão pouco, a ponto de ter sido enganado e trocado na primeira oportunidade. E como eu poderia culpa-lo? Caio era mais velho, mais forte, mais bonito. Simpático, educado, prestativo. E um lobo, acima de tudo, com quem ele sempre teria milhares de coisas em comum, ao contrário de mim. Não tinha como competir com tudo aquilo.

Já fazia uns bons minutos desde que eu terminara de me lavar, mas continuava imóvel, embaixo do chuveiro, sem forças para agir. Porém, reuni o pouco de energia que ainda me restava e fechei o registro. Era melhor resolver logo tudo de uma vez e dormir o restante do dia, depois que Ian terminasse comigo. Foi pensando naquilo que me sequei, vesti meu pijama e saí do banheiro. Assim que me aproximei da cozinha do sótão, reparei que, além de café, meu futuro ex-namorado também tinha preparado torradas, ovos mexidos e uma salada de frutas. Meu estômago roncou diante daquela visão e não fiz cerimônia, sentando-me na bancada, de frente para o lobo que me encarava atentamente.

Servi-me do café e da refeição e comi em silêncio, com Ian fazendo o mesmo logo em seguida. Assim que terminamos, ele se levantou, recolheu as louças e as colocou na pia. Aproveitei a deixa e me sentei em minha cama, abraçado a um travesseiro, e esperei até que ele se juntasse a mim.

— Bambi, o que você viu naquela noite, do lado de fora do clube... Não era pra ter acontecido... — suspirou Ian. — Eu sinto muito mesmo que você tenha presenciado tudo aquilo.

— Pelo menos em uma coisa a gente concorda — comentei. — Você poderia ter terminado comigo primeiro antes de começar esse seu rolo com o Caio... Teria poupado muito sofrimento desnecessário...

— Oi? Do que você tá falando?? — Ian quis saber, confuso.

— Não precisa enrolar, Ian, pode falar de uma vez! Você vai terminar comigo pra ficar com o Caio, não vai?

— Pelo contrário, eu não quero ver aquele desgraçado nem pintado de ouro na minha frente! — Ian replicou, repentinamente irritado. — Você ainda não sabe disso, mas eu dei uma surra nele depois que você saiu correndo, naquela noite...

— E por que você fez isso??? — perguntei, confuso. — Eu não tô entendendo mais nada, sinceramente...

— Presta bem atenção em tudo que vou te contar. Deixa eu terminar primeiro e depois você fala o que quiser — ele me pediu. — Sim, eu agi muito errado, mas eu não te traí com o Caio, Davi. Depois que você assumiu que ficou com ciúmes dele, aquele dia, na loja de ferramentas, eu confesso que acabei deixando esse sentimento subir um pouco pra minha cabeça. Foi bom pra minha autoestima experimentar estar do outro lado pela primeira vez e saber que eu era capaz de causar ciúmes em você, por mais bobo e imaturo que isso possa parecer. E sim, eu admito que gostei da sensação. Digamos que, por conta disso, eu de certa forma tenha acabado fazendo vista grossa pra algumas atitudes do Caio...

O Clube da Lua e o Devorador de Sonhos (Livro 2 ✓)Onde histórias criam vida. Descubra agora