16. A vez em que um jovem órfão viu um novo problema cair aos seus pés

972 217 367
                                    

Permaneci ali, de pé, com os chifres de cernuno expostos e a serpente em meus ombros, aguardando aquela força misteriosa sair de dentro da mata fechada e finalmente se revelar diante de mim. Estranhamente, eu não sentia medo; era quase como se meu corpo soubesse que estava mesmo destinado a enfrentar aquela coisa, seja lá o que ela fosse. Estava completamente focado naquele objetivo, até ser interrompido pelo som de latidos, vindo da minha direita. Rapidamente olhei naquela direção e, de fato, me deparei com um cachorrinho perto de mim, que latia insistentemente para a cobra enrolada em meu pescoço. Mais à frente, pude ver três pessoas se aproximando, ainda distantes, muito provavelmente os donos do cachorro vindo busca-lo.

Concentrei-me em fazer os chifres desaparecerem e, para minha surpresa, consegui tal feito sem muito esforço. A serpente, ao notar a aproximação de desconhecidos, também entendeu a necessidade de se esconder e se enfiou por debaixo da minha camiseta, se enrolando ao redor da minha cintura. Quando estavam mais próximos, pude notar que o grupo era composto por três jovens mais ou menos da minha idade, dois garotos e uma garota, com roupas de fazer trilha, provavelmente turistas. De qualquer forma, não era para eles estarem ali, principalmente quando havia uma criatura estranha na mata prestes a aparecer.

— Oi, tudo bem? — cumprimentei, tentando não soar muito rude, mas disposto a fazer aqueles garotos saírem dali o mais rápido possível. — Essa área é propriedade privada, não é recomendado fazer trilha por aqui.

— Oh, me desculpe — respondeu a menina, sem jeito. — É que essa sapeca da Laila disparou do nada e veio nessa direção, daí tivemos que correr atrás dela...

— Ah sim, sem problemas — respondi, tentando forçar um sorriso enquanto a garota se abaixava e pegava a cachorrinha no colo.

— Você mora por aqui? — perguntou um dos garotos, aparentemente o mais velho, que se mantivera em silêncio até então, me encarando.

— Sim — confirmei, preocupado por aquela conversa estar se estendendo tempo demais. — Minha tia é dona da pousada mais à frente e desse terreno do bosque. Eu moro com ela.

— Nossa, a gente já tá perto da pousada? — o outro garoto perguntou. — Então quer dizer que desviamos muito da nossa trilha!

— Culpa dessa cachorra travessa! — justificou a menina. — Bem, a gente já vai indo, desculpe o incômodo e a invasão à sua propriedade! — ela continuou, sorrindo para mim.

— Imagina, não foi nada! — respondi, aliviado.

— Até a próxima então — despediu-se o garoto mais velho, me encarando fixamente por mais alguns segundos antes de dar as costas e partir com seus amigos.

"Será que ele notou alguma coisa estranha em mim?", me perguntei assim que eles se afastaram. Para meu alívio, a sensação de perigo que estava me afligindo minutos antes também desapareceu, sem explicação. Só restava saber se foram meus poderes de cernuno ou a presença daqueles desconhecidos que tinha feito a criatura misteriosa na floresta desistir de avançar.

Depois da partida do grupo de turistas, dirigi-me de volta para casa. Apenas quando cheguei na pousada foi que me dei conta de que havia esquecido completamente da serpente, que se mantivera enrolada em minha cintura até então. O animal, por sua vez, deslizou para longe de mim assim que entramos no meu quarto e foi se aninhar dentro do meu cesto de roupa sujas, deixando apenas a cabeça do lado de fora, apoiada na borda, provavelmente descansando. Sabia que não adiantaria nada discutir com a cobra, então apenas a deixei ficar ali. Depois eu conversaria com a minha tia para saber o que fazer a respeito daquele novo hóspede.


***


O Clube da Lua e o Devorador de Sonhos (Livro 2 ✓)Onde histórias criam vida. Descubra agora