Capítulo 18 - Melinda

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Desembaraço meu cabelo com a escova, não está fácil. A água do mar enrolou de formas inimagináveis. Minha mão está dolorida de tanto tentar. Cada vez que passo a escova, lembro das cenas que aconteceu. Dormi ontem com a leve sensação de ser tudo um sonho longo e louco, mas acordei, estranhamente, pedindo para que não fosse um sonho.

Apoio o cotovelo na cabeceira. Nunca tinha me sentido tão energizada, acho que a adrenalina ainda percorre em meu corpo.

Suspiro.

É loucura ter esses pensamentos? Ter gostado de todo o perigo?

Sempre busquei descobrir que o nosso mundo não é só algo passageiro. Eu perdi tudo que me era passageiro, tão brevemente. Descobrir um novo mundo, com novas possibilidades, faz meu corpo estremecer.

Posso levar minha avó para conhecer aquele mundo e viver de uma forma diferente.

— Vovó! — olho para o relógio, ainda está em tempo de visita.

Levantei duas horas mais cedo para passar no hospital antes da escola. Toda vez que passo, o médico diz que minha avó não está em condições de receber visitas, que ainda está na UTI. Faz um mês que escuto isso. Mas hoje será diferente, eu sinto.

Pego o ônibus que passa na rua do hospital, está vazio.

"Escolhi um bom horário.", penso.

O celular vibra em meu bolso. Com tudo que aconteceu, esqueci a festa com Anthony, ele me mandou dezenas de mensagens perguntando onde eu estava e com quem, mas não tive cabeça para responder ainda. Não quero mentir, ele pode descobrir.

Mal noto que quase passo da parada. Levanto do assento às pressas e peço descida.

Entrego meu nome na recepção e digo para o que vim.

— Só um minuto. — diz a simpática recepcionista.

Ela cortou o cabelo desde a última vez que vim para um corte Chanel que ressalta seu longo pescoço.

— O Doutor Richard virá falar com você. — ela me olha brevemente.

— Não posso vê-la? — pergunto.

— Melina — o doutor me chama.

— É Melinda. — eu o corrijo.

Ele segura uma prancheta de baixo do braço. Passa a mão em sua longa barba. Parece estar procurando o que vai me dizer. Ele desvia o olhar, olhando para todos os lados, menos para mim.

— Está tudo bem? — seu silêncio começa a me afligir.

— Bem, sua avó, Kelly Bankis, certo? — ele finalmente me olha, seus olhos claros mostraram indecisão. — Qual o seu nome?

— Melinda Bankis de Cartan. Minha avó é a Kelly Bankis, isso. — eu entrelaço os meus dedos em frente ao meu peito. Sinto minha respiração falhar aos poucos.

—— Sua avó... teve um agravante em seu caso.

— Um agravante? — minhas pernas ficam bambas, apoio-me na cadeira.

Ele me ajuda a sentar.

— O câncer se alastrou. Tentaremos fazer todo o possível, mas...

— Não. — eu o interrompo. — Posso vê-la? Por favor. Só quero vê-la.

— Está bem.

Ele me diz o quarto compartilhado que ela está. Não consigo olhar ao redor, piso firme, o chão parece desaparecer em minha frente. A última vez que fiz aquele caminho foi à última vez que vi meu avô.

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