Capítulo 32 - Lizzie

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Encosto-me na cadeira e olho minhas mãos, mexendo-as, é muito bom poder movê-las novamente. Libero todo o peso do meu corpo em um suspiro. Quando fui à casa de Melinda, ela ainda estava no décimo sono, coberta da cabeça aos pés pelo cobertor aveludado. Fiz comida para quando acordasse, deixando um bilhete ao lado do prato:

"Tome o café reforçado que fiz. Te encontro na escola.

Beijos"

Ikimari jurou que ela ficaria bem, e que ela não inalou tanto gás venenoso. Só dormiria por um bom tempo. Mas não consigo ficar sem me preocupar. Eu e Tibini voltamos a respirar, mas ficamos confusos e sem saber o que fazer. Miruni e Ilariki foram os que mais inalaram o veneno. Quando voltei para a casa, começamos a seguir as instruções de Ikimari: Tibini faz um chá para Ilariki e Miruni inalar o vapor das ervas colhidas por Ikimari.

Já está amanhecendo. Eles ainda não acordaram. Eu me inclino na cadeira, deitando minha cabeça na cama que Ilariki está. Seguro sua mão fria, passando meus dedos nas linhas das palmas da sua mão.

Tibini está do outro lado, perto da cama com Miruni, ele troca a toalha que esfriou por outra nova, colocando-a com sutileza na testa de Miruni. Com olhar cabisbaixo, ele morde o dedo indicador, apoiando o queixo com o seu polegar. Não consigo contar quantas voltas ele já deu ao redor da cama.

Meus olhos vão ficando leves como uma pena. Eu deixo o cansaço ganhar e fecho os olhos para cochilar.

Acordo na areia, escuto o som de água caindo e a fria brisa da água. Eu reconheço esse lugar. Os cristais nas paredes do chão até o teto. É o laboratório do meu avô. Faz tempo que não o vi. Ilariki recolheu cristais suficientes para distribuir para todos. Eu passo os dedos na mesa. Imagino se meu pai e minha mãe estiveram aqui. Se pesquisavam aqui com o meu avô.

Isso é um sonho?

— Minha querida!

É a voz. A mesma que escutei no início de tudo isso.

— Vovô? — arrisco em perguntar.

Eu olho para os lados, procurando a origem da voz.

— Estou aqui, querida.

Eu procuro, até que minha visão bate nas águas do lago. Eu me ajoelho devagar. Molhando minhas mãos na água que ondulam fracas ao acolher o meu braço. Eu olho mais fixamente, vendo meu reflexo se transformar em outra coisa. Em outra pessoa. Um homem com uma barba branca que vai até o fim de seu pescoço. Seus olhos são azuis marcados pela idade, coberto por finas rugas ao redor, seus cabelos caem para o lado sequinho a ondulação das águas.

— Vovô? – pergunto novamente.

O homem sorri, mostrando cristais em seus dentes da frente.

— Como você cresceu.

A tremulação da água faz o reflexo oscilar.

— Parece tanto com sua mãe, mas suponho que a teimosia puxou ao meu filho. — ele sorri de lado. — Perdão por te envolver nas obrigações que não cumpri no passado. Pelos meus erros afetarem em sua vida.

— Seus erros?

— Eu não notei, querida. Não notei o homem que chamei de amigo por tantos anos, que me ajudou a alcançar níveis inimagináveis em minha pesquisa. Não notei sua ambição e seu ódio.

— Okubo. — digo.

— Okubo Rakimori. — ele abaixa o olhar. — Como eu pude ser tão inocente, quando olhei para ele, vi alguém com os mesmo sonhos que eu: unir os dois mundos, unir os humanos e os animalians. Eu pensei que sendo humano como eu, ele entenderia. Um humano que não envelhece e viveu todas as consequências das guerras que essa separação causou em nosso mundo. Eu nunca imaginei que ele, na verdade, queria tomar posse dos dois mundos para moldar de sua forma, através de suas ordens, regado com o temor dos homens. Quando eu percebi, era tarde demais. Todas as minhas pesquisas, só serviram para que ele alcançasse seus objetivos. Eu falhei no meu projeto de toda uma vida. Falhei até mesmo com a vida que ajudei a gerar, o seu pai. Ele sempre fez de tudo para te criar neste mundo, você não se lembra, mas já morou aqui antes, com a sua mãe. Foi antes deles precisarem fugir para o outro mundo por minha causa.

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