Capítulo 26 - Melinda

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O peixe frito na fogueira é incrivelmente gostoso, ainda posso sentir o gosto do limão adocicado do molho que Tibini passou por cima. Perguntei para ele o ingrediente, mas ele negou-se dizer até o último instante. Eu olho para a outra cama, Lizzie dormiu em poucos minutos, sua mão caída para o lado segurava a mão de Ilariki, que dorme no chão ao lado da cama, coberto pelo saco de dormir que Lizzie emprestou. É uma cena que transborda os eixos entre fofura e melosidade, mas estou feliz pela minha amiga. Nunca a vi namorando antes, teve um rapaz, mas nem lembro o nome dele de tão insignificante. Ele gostava de futebol e essa é a única coisa que lembro, já que em todos os nossos encontros ele só falava sobre isso.

Apesar de ser inusitado ao parar para analisar, minha melhor amiga está namorando um homem que se transforma em lobo, mas ela está feliz, é o que importa.

Meu pensamento me leva até minha avó. Sinto um aperto no coração, fui visitá-la ainda essa semana, mas ela estava recebendo os cuidados para o exame, nem pude vê-la. Minha boca contorce para baixo. Cubro o meu rosto com o lençol. Lutando para não chorar.

Sem lágrimas. Você está em um mundo com fadas. Não é um momento para lágrimas.

Eu podia achar algumas fadas para contar a história para minha avó. Eu vou encobrir a parte de quase ser morta por uma aranha gigantesca com pelos de urso. Quero contar algo bonito e fofo para ela. Eu levanto com cuidado, torcendo para que a madeira não faça barulho ao estalar. Quase esqueço que Tibini está a 10 passos da minha cama, por pouco não tropeço em seu corpo deitado no chão. Ele está enrolado por completo, não consigo ver uma única brecha de seu lençol.

Abro a porta com a mesma delicadeza, a madeira range como se unhas afiadas arranhassem a porta. Mordo o lábio, olho para trás, mas ninguém acordou. Não tento para abrir mais a porta, passo pela brecha que consegui, temendo acordá-los. Dou de cara com a rede de Miruni. Ele dorme iluminado pela luz do luar, sua boca se fecha em um suspiro fino e se abrem em um sorriso bobo, deve estar em um sonho bom. Abaixo para passar pelo lado da rede.

Está frio, mas um frio reconfortante. Seguro meus braços, acariciando para passar calor. Nunca vi tantas estrelas antes, não encontro nenhuma constelação. Meu avô me ensinou um pouco de astrologia, enquanto acampávamos durante o verão. Eu nunca prestei muita atenção, mas ele falava com tanto entusiasmo, que eu balançava a cabeça contente ao vê-lo me descrever as constelações com tanta emoção na fala. Ele ia amar ver tantas estrelas.

Tibini me disse que as fadas costumam se banhar durante a noite. Imagino encontrar uma versão da Sininho ou aquelas fadas cruéis de filmes de terror, mas eu vou confiante em ser uma Sininho. Fica ainda mais frio ao me aproximar do lago, arrependo-me de não ter vindo com um casaco.

Meu reflexo está borrado, mas vejo o reflexo da lua cheia e das estrelas como um espelho luar. Tão lindo. Ajoelho-me, aproximando mais da água. As fadas são pequenas, talvez eu não consiga ver a olho nu?

— O que faz aqui? — a voz dele me assusta, quase caio dentro do lago.

— Céus! — eu coloco a mão na grama como apoio.

Ikimari está coberto por sua manta, encostado na árvore, com um de seus olhos ainda fechados, ele me olha com o azul de seu olhar.

— Eu... o que você faz aqui? — eu retruco com outra pergunta. — Tem espaço para dormir lá dentro, aqui está frio.

Ele não me responde, tampando a mão ao notar um bocejo escapar.

— Ou está orgulhoso demais para voltar depois do drama que fez?

Ele abre o outro olho, lançando-me sua íris amarela, como a amarelo de um lindo girassol, em um olhar fervoroso como resposta ao meu afronte.

— Temos uma resistência maior ao frio. — ele me responde, engolindo minha provocação. — Já você está tremendo como uma gata molhada. O que quer aqui fora?

Renascer dos Lobos Onde histórias criam vida. Descubra agora