Alguma coisa. Só não sei o quê

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O Esquilo Azul ficava bem perto, um pouco adiante do Cinco Luas. Clarke  tinha uma espécie de ligação afetuosa, ainda que cautelosa, com ele. Havia dias em que ela gostava do barulho, da  pressão dos corpos e dos trajes sempre mutantes da clientela. Basicamente, gostava do show no pequeno palco.

A cantora que se apresentava ali era uma das raras pessoas que Clarke  considerava uma verdadeira amiga. A amizade, na verdade, começou quando Clarke  prendeu Anya Freestone vários anos antes, mas, apesar desse começo, floresceu. Anya podia estar andando nos trilhos agora,  mas jamais seria uma pessoa comum.

Naquela noite, a jovem magra e exuberante estava guinchando as letras das músicas e lançando-as de encontro aos gritos dos trompetes, que eram os instrumentos da banda  composta por três mulheres. Elas ficavam no fundo do palco, em uma tela  holográfica. Aquilo, aliado à  baixa qualidade do vinho que Clarke   se  arriscara a  tomar, era o suficiente  para fazer os seus olhos se encherem d'água.

Para o show daquela noite, o cabelo de Anya estava em um estonteante tom de verde-esmeralda. Clarke  sabia que Anya preferia usar cores de pedras preciosas. Continuava a cantar usando apenas um  retalho brilhante da cor de safira, que lhe cobria um  dos seios e descia até o  vão entre as pernas. O outro seio estava decorado com  pequenas pedrinhas cintilantes em  volta  de uma estrela de prata, que fora estrategicamente colocada sobre o mamilo.

Uma só lantejoula ou pedaço de pano fora do lugar e o Esquilo Azul poderia ser multado por exceder o que estava especificado no alvará. Os proprietários não estavam dispostos a pagar  a  taxa pesada que era cobrada das casas que apresentavam dançarinas nuas.

Quando Anya se virou de costas, Clarke  notou que o traseiro da cantora, que tinha o formato de um coração, estava igualmente decorado, nas duas nádegas. Menos um pouco, pensou Clarke , e ela estaria fora dos limites determinados pela lei.

A multidão a adorava. Quando desceu do palco, após terminar a apresentação, Anya se misturou aos aplausos barulhentos e aos gritos de aclamação dos clientes bêbados. Os frequentadores que estavam nas cabines privativas para fumantes batucavam entusiasticamente com os punhos nas pequenas mesas.

— Como é que você consegue se sentar com esses troços colados na bunda? —  perguntou Clarke  quando Anya chegou em sua mesa.

— Devagar, cuidadosamente e com grande desconforto —  e fez uma demonstração, sentando-se e soltando um pequeno suspiro. —  O que achou do último número?

— Foi de levar a multidão ao delírio.

— Fui eu que compus.

— Tá falando sério? —  Clarke  não havia compreendido uma palavra sequer da letra, mas transbordou de orgulho mesmo assim. —  Que legal, Anya. Estou pasma.

— Pode ser que eu consiga um contrato para gravação —  e por baixo do brilho em seu rosto, suas bochechas se ruborizaram. —  E ganhei um aumento de salário.

— Ora, vamos comemorar. —  Como se estivesse brindando, Clarke  levantou o copo.

— Eu não sabia que você vinha aqui hoje. —  Anya digitou o código pessoal no cardápio e pediu água gasosa. Precisava cuidar da garganta para a próxima apresentação.

— Vim até aqui para me encontrar com uma pessoa.

— Lexa? —  Os olhos de Anya, que naquela noite estavam verdes, brilharam. —  Ela vem aqui? Ah, então vou ter de repetir aquele último número!

— Não, ela está na Austrália. Vou me encontrar com Costia Furst.

O desapontamento de Anya ao ver que ia perder a chance de impressionar Lexa  logo foi substituído pela surpresa.
— Clarke , você vai se encontrar com uma repórter? Deliberadamente?

In DeathOnde histórias criam vida. Descubra agora