Contrato Assinado

bem vinda à Salvador

Estava insegura em perguntar a
Micaella sobre sua orientação sexual, mas eu realmente precisava saber, acho que no fundo só queria me entender melhor, desde o episódio com o vestido minha cabeça estava a milhão, talvez a ouvindo eu pudesse ter uma resposta sobre mim.

- Acho que na verdade eu sempre fui bissexual, a questão é que demorei a entender e me aceitar, em resumo, tudo começou quando eu tinha cerca de 10 pra 11 anos, eu sempre havia gostado de garotos na escola, paixões infantis essas coisas e estava totalmente convencida disso, até que nessa idade eu descobri um crush na Madonna - ela riu.

- A cantora Madonna? - questionei.

- Ela é muito sensual - ela deu de ombros - claro que eu não entendi de primeira achei que fosse uma admiração de fã, mas aí as coisas foram evoluindo, foi quando eu me tornei fã do ABBA, eram vídeos antigos e logo que bati o olho na Frida me deu uma coisa inexplicável.

- Não sabia que era fã do ABBA - comentei.

- Conheci através da minha mãe, o olhar daquela mulher prendia qualquer um, nesse dia eu senti uma pontinha de questionamento, mas ignorei, hoje tenho uma gata chamada Frida graças à ela.

- Que fofo!

- Mas só aos 15 pra 16 anos foi que eu comecei a realmente perceber a realidade, os crushs saíram do universo de música e filmes e vieram pra minha realidade, minha primeira crush real foi uma garota que era caixa do supermercado no meu antigo bairro, eu fiquei apavorada quando percebi que estava atraída por ela, nesse dia eu entendi, mas não aceitei.

- E quanto tempo levou até você se aceitar?

- Cerca de dois anos mais ou menos, foi tão angustiante principalmente pelos comentários das pessoas em relação à pessoas como eu, pessoas que não estão dentro dos padrões heterossexuais.

- Imagino que deva ter sido muito doloroso.

- E foi, mas nada comparado ao dia que resolvi me abrir a respeito, quando eu finalmente entendi que não poderia mudar isso e aceitei quem eu era, a primeira pessoa que contei foi minha irmã, ela meio que já sabia, ela é muito observadora, e me deu todo o apoio do mundo.

- Deve ter significado muito pra você!

- Foi como tirar um peso enorme do peito, ter apoio de alguém depois de tanto tempo sofrendo sozinha era reconfortante, então eu decidi me abrir com a ajuda dela ao resto da minha familia.

- E como foi?

- Foi complicado, minha mãe demorou um tempo pra absorver a ideia, mas ela não me julgou, eu entendi que pra ela era algo novo e dei o espaço pra que ela se adaptasse e com o tempo minha irmã foi abrindo a mente dela, hoje ela já fala sobre isso com naturalidade, mas com o restante da família foi um pesadelo.

- Eu sinto muito.

- Tudo bem, na verdade, eu tive mais sorte do que muitos em ter pelo ao menos um pouco de apoio, minha avó não me julgou também mas preferiu não tocar no assunto, já meu pai e toda a minha "familia" da parte dele que não são lá tão presentes, todos eles me trataram como uma doente e se afastaram, mesmo sabendo foi melhor assim, e que nunca precisei deles não quer dizer que tenha doído menos, desprezo dói vindo de qualquer lugar.

- É lamentável, mas foram eles que perderam, você é uma pessoa incrível!

Ela sorriu e suspirou.

- Decidi não dar mais importância à isso, eu não ia mudar o pensamento deles e eles não iam mudar quem eu sou, então segui minha vida com quem realmente importava.

- Foi a melhor decisão tenho certeza.

- Sim, mas não acabou por aí, pra nós a luta nunca acaba, até hoje eu ainda recebo olhares tortos, comentários horríveis quando comento sobre isso em voz alta, quando demonstro quem eu sou ou quando saio com alguma garota em pública, as pessoas julgam tanto homossexuais e lésbicas, mas precisa ver o que fazem com bissexuais já fui chamada de indecisa, confusa, vagabunda, me disseram que isso é tudo falta de vergonha, e que estou perdida, cada absurdo por quem não conseguem entender que eu não controlo por quem me apaixono, eu espero que um dia isso mude mas, as vezes cansa esperar.