XXII.

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Poucos dias no porão.
(Antes do capítulo anterior)
Eᴍ ᴀʟɢᴜᴍ ʟᴜɢᴀʀ, Vance acordou.

- Acorde. - Maryann o cutucava.
- Não. - Vance murmura.
- Como assim "não"?
- Me deixe dormir. - Ele continuou.
- Não.
- Como assim "não"? - Ele repetiu as falas dela, se virando para ela.
- Não. - Ela deu de ombros.
- Que porra você quer, Mary?
- Conversar.
- Ah, vai se foder, vai.
- Qual é, Vance? - Ela se ajoelhou ao lado dele e começou a chacoalhá-lo.
- Você tem sorte que você é você.
- Por quê?
- Por que se você não fosse você, eu te bateria.
- Ah... Que fofo! - Ela disse irônica. - Não sei se é um consolo ou uma ameaça.
- Considere como quiser. - Ele se levantou e ela o seguiu.
- Quando é o seu aniversário? - Questionou Mary.
- Que tipo de pergunta- 9 de maio. - Ele respondeu.
- Faço aniversário em 1 de abril.
- Não perguntei. Mentirosa. - Ele sussurrou quando passou por ela.
- Por que foi preso?
- Bati em um garoto no fliperama. - Ele comenta com desdém, abrindo o zíper de suas calças e subindo a tampa da privada.
Ela se vira de costas. Ele se vira para conferir de que ela se virou.
- E as outras vezes?
- Ah, quase a mesma coisa. Na primeira vez, bati em um garoto que bateu em uma garota e na segunda vez bati em um garoto que começou uma briga comigo.
- Mas não bateu naquele cara.
- O que quer dizer com isso? - Perguntou ele, se irritando.
- Nada.
- Olha, me desculpa se eu não consegui derrubar um cara 30 anos mais velho que eu.
- Não é sua culpa.
- Eu sei. Tenho certeza que ele treina.
- Aham.
- E você?
- Hm?
- Já foi presa? - Ele deu descarga e fechou seu zíper.
- Abaixe a tampa. - Ela apontou para a tampa da privada. - E não, eu não fui presa. Meu pai me mataria. Literalmente.
- Literalmente? - Vance repetiu, confuso.
Mary não respondeu.
Ela se virou de costas para o garoto e levantou sua blusa.
Por baixo de seu sutiã, haviam cicatrizes. Cicatrizes grandes, muito grandes.
Claramente feitas por cintos.
A respiração saiu quente da boca de Vance e chegou nas costas de Mary.
Involuntariamente, ele levou a mão às costas da garota.
O toque de Vance fez o corpo da garota relaxar.
- Seu pai fez isso, não fez? - Perguntou ele, sussurrando
- Sim. - Ela abaixou a blusa e se virou, mas as mãos de Vance continuavam em sua vertebral.
- Sinto muito.
- Não é nada. - Ela olhou para os próprios pés.
- É sim. - Ele se afasta e se senta no colchão. O calor de Vance se dissipa. Ela sente frio.
- Não é. Eu faço merda às vezes.
- Mary. Seu pai é um babaca.
- Talvez, mas... Ele tem dois empregos desde que minha mãe morreu. Ele bebe para esquecê-la. É normal que ele fique mais bravo do que o comum.
- Sinto muito.
- Não sinta. Ela era... Insana.
- Insana?
- Meu pai a chama assim.
- Mary...
- Estamos em janeiro, sabia?
- Sim, eu sabia.
- Farei 16 anos daqui exatamente 75 dias.
- Duvido que vá acontecer.
- Eu entendo... Se nós sobrevivermos até lá, estaremos comemorando seu aniversário daqui... 116 dias.
- É tempo demais para ficar vivo aqui.
- Já estamos a seis.
- Não pretendo passar de dez.
- O que pretende fazer, então?
- Fugir.
- Vance. - Ela disse com um tom de repreensão se levantando.
- É sério, Mary. Somos dois. Ele não vai conseguir tomar conta de nós juntos.
- Nós não sabemos se ele está sozinho. Tenho certeza de que ele está armado.
- Com certeza está.
- Mais um motivo para você esquecer isso.
- Precisamos sair daqui, Mary.
- Precisamos obedecê-lo. É isso que precisamos fazer.
Então, a luz do cômodo é acesa.
A porta é destrancada.
Eles se afastam e Vance se põe na frente dela, como sempre.
- Boa tarde, crianças.
- Boa tarde. - Eles responderam baixo, uníssono.
- Trouxe comida para vocês. - Ele coloca uma bandeja no chão e depois coloca os pratos no chão.
- Colocou algo nisso? - Questiona Mary.
- Coloquei sal. Serve? - Ele responde.
- Se não estiver envenenado, serve.
- Para que envenenaria vocês? Vocês já estão aqui.
- Para nos matar. - Responde Vance.
O homem suspira, decepcionado.
- Sabe... Hm... Qual o seu nome?
- Ah... - Vance se virou para Mary, que assentiu para ele continuar. - Vance. É Vance.
- E o seu, garota? - Ele a chama com desgosto.
- Maryann.
- Vance e Maryann... Eu não pretendo matar vocês.
- Você matou as outras crianças. Griffin, Billy. - Disse Vance.
- Bruce... - Completou Maryann, o nome a fez arrepiar.
- Não, não. Aquilo foi... Outra pessoa. - Ele coloca garrafas d'água do chão.
- Quando vamos tomar banho? - Pergunta Mary, com cuidado.
- Em breve. Isso é tudo que precisam saber. - O homem se levanta e se vira de costas.
Eles não dizem mais nada, por tanto, ele vai embora.
Assim que a porta se fecha, eles correm até os pratos.
Vance e Maryann se ajoelham na frente dos pratos e devoram a comida que sequer sabem o que é.
A comida não é ruim, mas não é boa. A fome faz com que eles não percebam o quão ruim ela é.
Eles bebem água com goles longos.

Quando eles terminam de comer, Mary junta os pratos e os colocam em cima da bandeja.
Depois ela se senta no colchão com a garrafa na mão.
- Quando você acha que vamos comer de novo? Considerando que a última vez que nós comemos antes de agora foi há dois dias.
- Talvez daqui a dois ou três dias. - Ele responde se deitando.
- Que merda. - Ela se deita ao lado dele.
Ela vira seu rosto para o observar, entretanto, seu olhar está fixo em outro lugar.
Mary segue seu olhar e percebe que ele está olhando para a porta.
- O que foi? - Perguntou ela.
- A porta está aberta. - Ele sussurrou.

De repente, o telefone tocou.
Mas... Ele estava quebrado.
Ela olhou para Vance, mas ele não parecia notar.
Mary se levantou e caminhou lentamente até o telefone preto na parede.
Da primeira vez que ela se aproximou do telefone para tentar buscar por ajuda, o mascarado insistiu que ele estava quebrado.
"Está quebrado desde minha infância"
Não fazia sentido.
Ele tocava insistentemente.
Ela o atendeu e o toque parou.
Mary hesitou em colocá-lo em seu ouvido, mas colocou.
Do outro lado, alguém respirava ofegante.
- Não suba as escadas.
- Por quê?
- É uma armadilha. - A voz era masculina, porém não parecia ser de alguém com mais de 12 anos.
- Quem é você?
- Eu não sei.
- Como não sabe? Não se lembra de seu nome?
- Não. É uma das primeiras coisas que esquecemos.
- Por quê?
- Você sabe por quê. Não suba as escadas, Mary.
A pessoa do outro lado desliga.
- Alô? Merda. - Ela resmungou.
Suas pernas estavam bambas e sua respiração desregulada.
A tal pessoa parecia estar com muita pressa.
Como se precisasse avisar algo a alguém, e aquela informação salvaria uma vida.
Seu coração sambava em seu peito.
- Vance, você ouviu is... - Ela se virou, mas Vance não estava lá.
A porta estava aberta.
- Vance! - Ela o chamou.
Ela correu até a porta e Vance estava no topo da escada.
Ela não esperou que ele levantasse sua mão para abrir a porta. Mary subiu os degraus o mais rápido que conseguiu, rápido o suficiente para segurar a mão de Vance antes que ele pudesse abrir a porta.
- É uma armadilha. - Ela sussurrou.
- Mas se... - Sua mão continuava na maçaneta. Ele parece estar em um transe.
- Vance, olhe para mim. Vance. - Ela segurou seu rosto e o obrigou a olhar para ela. Ela se virou e ele já havia girado maçaneta. A porta estava aberta.
- Podemos sair daqui. - Ele sussurrou, seus olhos estão marejados.
- Vance, é uma armadilha. - Uma de suas mãos tocou a nuca de Vance, uma lágrima escorreu de um dos olhos do garoto.
Mary desceu sua outra mão pelo braço de Vance e a parou em sua mão. Sua mão tocou a maçaneta e a puxou para perto.
Um estalo ecoou pelo lugar. A porta estava fechada novamente.
- Eu só quero sair daqui. Eu preciso. - Ele disse, sua voz está trêmula.
- Eu sei. Eu sei. - Ela fez com que ele soltasse a maçaneta e segurou sua mão.
- Vamos descer. - Ela disse o puxando para baixo com calma.
Mary o fez descer as escadas enquanto ele olhava para trás. Tinha certeza de que eles estavam sendo seguidos.
Maryann o colocou para dentro do cômodo e fechou a porta.
- Venha, se sente. - Ela o empurrou para o colchão. - Você está bem? - Ela tirou o cabelo de seu rosto.
Vance assentiu freneticamente com a cabeça, em silêncio.

Vance se deitou e permaneceu lá.
Mary se deitou ao seu lado e deixou sua mão em seu antebraço, o impedindo de se levantar.
Depois de alguns minutos, Vance pegou no sono, mas Mary não se sentia segura o soltando.
A garota pegou um elástico que usava para prender seu cabelo e prendeu os pulsos dos dois juntos.
Aquilo a acordaria caso ele se levantasse.
Depois que ela teve certeza de que ele havia adormecido, ela se permitiu dormir.

𝐁𝐄𝐋𝐈𝐄𝐕𝐄 𝐔𝐒, Vance HopperOnde histórias criam vida. Descubra agora