EVERY DAY, ONE DAY

1 - Ela

Rio de Janeiro, 17 de julho de 2022

Hoje está um dia nublado no Rio, temperatura um pouco a cima dos 20°. O mar está adoravelmente calmo, apropriado para apreciação do horizonte. São sete horas da manhã e eu estou pronta para trabalhar.

Seguindo minha rotina, dirijo até minha padaria preferida. O lugar tem os melhores pães da redondeza e com opções variadas de café. Minha opção tende a ser a mesma... café coado. O espaço não é tão amplo, porém muito bem aproveitado, com uma decoração Art. Déco. É extremamente aconchegante e lindo.

A padaria é de uma família conhecida no meu bairro, quem gerencia é o filho do dono e sua esposa. Um casal jovem, ela é barista, formada em administração, especialista em gestão de pequenas empresas. Ele é padeiro desde que de pequeno, fez curso de Boulangerie na França, é responsável por parte da produção e por manter a qualidade de tudo que é vendido ali. Sarah e Ricardo fizeram da Baguette Bakery um sucesso! Eventualmente eles chamam o seu pequeno grande negócio de BBB – Baguette Bakery Brasil, fazendo piada para que tenha algum nome em português.

- Bom dia, Ana! O de sempre, por favor! Leva na mesa pra mim? – Ana é uma das balconistas da BBB, sempre muito carinhosa, animada, dona de um sorriso que contagia. Lá trabalham também Vic e Pam, todas estudantes de gastronomia.

- Bom dia, Amanda! Então... até levo, mas hoje não vai ser na mesma mesa. – Ela aponta para a mesa já ocupada por um rapaz que eu nunca tinha visto antes. - Pode ser naquela ali? Também é perto da janela.

- Pode, pode sim! Não é exatamente a minha mesa, mas é bem pertinho dela. Inclusive, quem é a figura que roubou minha mesa? Nunca o vi por aqui. – Pergunto querendo informações importantes, já que trata-se de um homem alto, bonito, barba bem feita e cabelo recentemente aparado.

- Ih Amanda, vou ficar devendo... é a segunda vez que ele vem! E é a segunda vez que ele senta na mesma mesa, parece que agora você tem concorrente. – Bufo ao mesmo tempo que penso: "belíssimo concorrente", mas em breve perderá o lugar, já que, se precisar, passo a chegar antes do horário habitual.

Escolho sentar na cadeira em que fico de frente para o anônimo que está em Meu Lugar. Assim posso observá-lo com calma e sem ser notada.

Enquanto meu pedido não chega, pego meu computador na mochila, preciso já começar a organizar meu dia. Planejamento, e-mails de clientes, chefes, demandas. Ponho meus óculos, abro a máquina para trabalhar e me distraio com a chuva fina que começa a cair, fico olhando a rua por algum bom tempo, quando volto aos meus pensamentos, logo o vejo.

O rapaz parece distraído, toma chá com dois saquinhos, sendo blends diferentes, percebo pelas diferentes cores nos puxadores.

- Cara estranho, quem coloca dois tipos de chá juntos? – Constato falando sozinha, quase que em sussurro.

Ele come torradas Petrópolis, ele tem um ponto, a que ainda está no seu prato aparenta estar gratinada. Sim! Ele tem vários pontos. Também tem um computador em sua mesa, mas diferente do meu, o dele está fechado. Em cima tem um livro, pelas cores não foi difícil descobrir qual era: "Orgulho e Preconceito". Que tipo de homem, vem a uma padaria para tomar chá e ler um dos maiores clássicos da literatura mundial?

Sou tirada dos meus pensamentos pela Sarah, que veio acompanhando a Ana trazer meu café. O cheiro estava ótimo e o pão do jeito que eu gostava.

- Café amargo, croissant sem recheio, manteiga a parte... confere? Todos os dias a mesma coisa, não sei como não enjoa... – disse Sarah

- Clássicos são eternos, não ficam ruins e nem saem de moda. – Responde Ana, me imitando, ao mesmo tempo que coloca os itens na mesa.

- Exato! E vocês parem de ser implicantes, até porque eu mudo. Eventualmente ouso pedir café com leite e ainda posso lembrar de vezes que prefiro o requeijão que a Pam faz. – Resmunguei me defendendo.

Sarah aproveita e senta para conversar um pouco, logo diz que minha mesa está disputada, me fazendo virar os olhos em reclamação. Conversamos por alguns minutos, pergunto por Ricardo e ela conta que ele está na cozinha testando novas variações de recheios para os sanduíches, me animei!

Antes de levantar, ela aproveita para falar que o anônimo ladrão de lugares, chegou hoje 15 minutos antes do meu horário, se eu quiser, amanhã preciso me adiantar. Se é isso que precisa, é isso que eu vou fazer, até porque a mesa é minha!

Ele acaba de comer, olha o celular, guarda o computador e o livro, pede a conta. Quando levanta, posso perceber que não é tão mal tê-lo na mesma padaria. E ele vai!

Termino meu café, resolvo alguns e-mails e também sigo para mais um dia de trabalho.

Quem sabe ele amanhã estará aqui...