EVERY DAY, ONE DAY

19 - Nascimento da Rosinha

Rio de Janeiro, outubro de 2022.

Ainda não consegui tirar da cabeça o joguinho que eu a Amanda fizemos durante o jantar de quarta-feira. Tudo está muito fresco e forte em minha mente. Sinto seu cheiro, seu toque, lembro dos sabores e principalmente, da bela vista que eu tinha: Ela! Amanda estava deslumbrante, toda de preto. Cabelos escovados, unha perfeita. Era visível a produção, por mais que ela tivesse negado.

Hoje já é sexta, e por motivos de trabalho, não consegui parar para o meu café na BBB e devo admitir que tudo me faz falta, já fazem dois dias que não sento com ela em nossa mesa. – Como pode em tão pouco tempo já me fazer tanta falta. – Bufo.

Já está de noite, cheguei tem pouco tempo, subi direto por que precisava de um banho longo e relaxante. Agora estou na dúvida se peço um lanche, se desço para buscar alguma coisa ou se cozinho. Sento no sofá, ligo a tv disposto a resolver minha vida quando ouço uma batida na minha porta. Me assusto, já que não estou esperando ninguém. Por uma fração de segundo me passa pela mente que pode ser ela, enquanto levanto ouço mais uma batida, dessa vez mais forte e na sequência, meu nome. Voz do Fred! Corro até a porta.

- Graças a Deus, Antônio! Preciso da sua ajuda e é urgente – Fred fala apressadamente, de forma nervosa. Eu o olho com espanto e ele completa – A Bolsa da Bianca estourou e precisamos ir para o hospital, só preciso deixar o Cris aqui, do caminho mando alguém para vir busca-lo e te mando mensagem. Consegue me ajudar? – Me olha com apreensão e eu não tenho outra opção a não ser aceitar ficar com o pequeno. Eu me entendo bem com criança e nós já fizemos boas brincadeiras juntos. O pai me diz que ele está dormindo, arrumo então minha cama, a cerco com travesseiros e o coloco lá. Fred me deixa a chave de sua casa, caso precise de alguma coisa... e é certo que vou precisar, posto que não tenho nada para crianças aqui em casa.

Aguardo eles descerem e olho da varanda até eles sumirem do meu campo de visão. Ricardo está na calçada e pergunta se preciso de ajuda. Nego e agradeço, informo que ele está dormindo e que estou aguardando orientação do casal, já que aparentemente ele não ficará comigo a noite toda. Nessa hora a Sarah também vai para a área externa, vira para cima e fala:

- Isso sim é um sextou de respeito, hein vizinho! – Soltou uma gargalhada e voltou a entrar no estabelecimento. 

Pouco tempo depois Fred liga, diz que já está no hospital com a esposa.

Fico bem mais tranquilo e aproveito para dizer que Cris segue dormindo. Ele conta que enquanto estavam indo para a maternidade Amanda ligou e ela estava vindo para cá ficar o Cris, aparentemente ela dormiria na casa deles, para não o afastar do lugar que já está habituado. Eu gelo. Amanda, aqui! A Amanda vem aqui! Eu desliguei o telefone no automático, já sem saber o que o pai da Rosinha disse, só sabia pensar que a Amanda viria. Ela realmente viria.

Olho em volta, analiso a casa. Está tudo em ordem. Agradeço em silencio por ter pedido minha faxina para hoje. Ela viria. O que eu faço? Pensa Antônio! Pensa! No minuto que eu resolvo qual estratégia seguir, meu interfone toca. Só pode ser ela! Em vez de atendê-lo, vou até a sacada para conferir minha suspeita! Aproveito que no caminho passo pela minha adega e abaixo alguns graus a temperatura, sei que pode ser útil. Quando chego na varanda a vejo. Sim! Ela estava lá! Sorri, a chamei com a mão, corri na cozinha e liberei sua entrada. Quando ela chega a minha porta, já está entre aberta, ainda sim ela bate e eu surjo na sala como se não tivesse nada demais acontecendo. Mexo no cabelo e sorrio.

- Entra Amanda, bem-vinda ao meu melhor lugar no mundo! – Falo sorridente. Ela sorri de volta um tanto envergonhada e pergunta: - Oie! Vim pegar o Criszito! Cadê ele? – Aponto com a cabeça, vou até a porta e pego pelas mãos, posso perceber sua reação sorrateira, finjo que não vi, a levo até onde ela tivesse visão da minha cama. Cris, meu melhor amigo, seguia dormindo! Santa creche!

- E agora? Ele tá dormindo tem muito tempo? Como faremos? – Ela estava inicialmente assustada, mas a medida que ia falando, sua feição mudava até que estava suave e com um sorriso que eu ainda não tinha visto. Percebo seu olhar varrendo minha casa, pousando na porta do quintal, voltando pelo meu sofá convidativo e parando na adega. Essa era a brecha que eu queria. – Não tem jeito, ele tá dormindo pesado. Fica aqui, quando ele acordar a gente vê o que faz. O que acha de um vinho? Aproveitar um pouco a sexta-feira... – Ela topa com um sorriso largo e responde: - O que tem nessa casa para comer? Casa de homem nunca tem nada... – fala implicando. Ela está certa, não fiz compras essa semana, quase nem parei em casa. Penso rápido e jogo com o que eu tenho de melhor... a BBB, passo a mão no telefone, mando um WhatsApp direto para o Ricardo pedindo uma tábua de frios, com pães, castanhas e geleias! Resolvido!

Viro para a minha convidada e informo que já tenho sob controle. Ela sorri e anda pela minha casa como se já pertencesse a ela e vai até a área externa. Sorrio quando a vejo encantada com o que vê, sim! O espaço é ótimo e convidativo. A sigo e ficamos ali por horas, conversando, eventualmente flertando e rindo. Não percebo a hora passar, até que ouvimos um choramingo, Cris acordou assustado. Amanda corre para vê-lo e acalmá-lo. Aproveito e vejo a hora, já é madrugada. Pego meu celular e tem uma mensagem do Fred, dizia que Rosinha havia nascido, linda, gordinha e saudável! Que felicidade!

Chego na porta do meu quarto, vejo Amanda já com a criança no colo. Informo a boa notícia e ela também fica visivelmente feliz! Até que diz:

- Vou levar ele para casa, ele está com fome. E além disso, já passou da hora! – Ri mexendo no cabelo. Eu a levo até a porta, sigo com eles até entrada do apartamento em frente e para facilitar, abro. Ela me agradece e se despede com um meio abraço e fica na ponta dos pés para me dar um beijo meio cheiro, no pescoço. Arrepio até a alma e ela me olha satisfeita.

- Boa noite, vizinho! – Ela diz e fecha a porta.

Quando volto para a minha casa vejo seu tênis em minha porta, o levo até o capacho do 102 e deixo. Entrando, vejo sua jaqueta sobre meu sofá... essa eu não devolvo! Não agora! Ele vai ter que vir buscar. – Boa noite, Amanda! – Sussurro.