38.1 - Última feira do ano

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Rio de Janeiro, dezembro de 2022.


É dezembro, o Rio de janeiro é quente e abafado. Estar sentada na sala do Antônio olhar para a varanda cercada de verde que ele cuida com tanto esmero traz paz, mas realmente não refresca. A BBB fechou um contrato com uma sorveteria famosa, e é exatamente isso que eu preciso. Sorvete! - E se a gente descesse pra tomar um sorvete? Hoje tá a cara daquele de pistache com chocolate branco! - Minha voz corta o silêncio da casa, ele me olha um pouco assustado mas responde: - Claro, vamos! - Levanta da mesa, pega as chaves e me aguarda perto da porta, ao passar por ele sinto um beijo no topo da cabeça, e descemos.

Nossa mesa é excelente! Fica dentro da loja o que nos possibilita ficar no ar, mas é próxima ao janelão o que nos deixa ver a rua. Pedimos nossos sorvetes e sentamos, quando ouvimos uma voz animada adentrando a padaria como um furacão. - Amanhã é o último samba do ano! Estamos de acordo que NINGUÉM irá faltar correto?! - Os olhos de Bianca percorrem o salão seu sorriso é gentil, mas seu olhar diz que não podemos negar, em uníssono respondemos que sim.

O fim de tarde corre na BBB, as meninas aviam preparado um novo cardápio de verão com saladas e um tartar, resolvemos ficar para a degustação e a noite correu de forma leve. Com o final da noite a única certeza era que amanhã seria o nosso natal dos amigos, em meio a roda de samba, já havia se tornado tradição a anos, era o único domingo que o Ricardo se permitia aproveitar o samba, era a forma como encontrávamos de celebrar os amigos de uma vida inteira. Dezembro já traz um ar nostálgico, mas esse ano me faz repensar o como a vida mudou, como uma nova pessoa entrou em nossas vidas, roubando minha mesa, e levou com ela meu coração e meus amigos, adormeci enquanto admirava Antônio e pensava o quanto não cogitava não tê-lo mais.


Domingo. Dia de Samba!


POV.: Paulo & Margarida

Apesar do calor habitual de dezembro fomos abençoados, céu claro, azul, porém mais fresco é um dia perfeito!

As feiras em dia de samba já são mais cheias que o comum, mas a última do ano parece que reúne o mundo em uma rua, não bastasse a correria, o som dos batuques, o chiado das conversas, os risos e pedidos o clima é de uma alegria indescritível, mas a melhor parte é conseguir reconhecer seus clientes.

- Opa Margarida! Bom dia!

- Oh Paulo, bom!

- Não é seu casal das tulipas amarelas vindo ali?

- É, são eles, o destino uniu dois novos corações distraídos.

- Oi seu Paulo! Eu quero meus pastéis! Oi dona Margarida, a senhora está ainda mais linda hoje! - Amanda nos cumprimenta no seu jeito menina nos fazendo sorrir com o olhar.

- Vamos lá minha menina, os seus eu mesmo faço!

- Bom dia, dona Margarida - Antônio sorri quase sem jeito, consigo ver os ombros de fechando, é um doce de rapaz

- Bom dia meu filho, você quer flores hoje? - Pergunto sabendo a resposta e as cores, eu sei o olhar e o coração dele não mentem.

- Sim, o que a senhora me indica hoje? - O vejo coçar a nuca num gesto de vergonha.

- Tulipas... tulipas vermelhas meu filho!

- Porque?

- São as flores do amor verdadeiro. - Seu olhar se ergue das flores pra mim e o vejo sorrir, mais uma vez, eu sei que acertei.


POV Antônio.

Hoje é o dia para ficarmos na feira, começaremos cedo e não tem hora para acabar. Como fazia muito tempo que eu não via um amigo comentei sobre o evento e ele vem para o almoço e talvez fique conosco, o que eu duvido porque ele é preguiçoso. Cigano é casado com a Isa há anos e tem dois filhos, é uma família que eu admiro muito, já fui muito mais próximo deles, infelizmente com a correria nos afastamos.

Os avisto se aproximando, os chamo e eles se unem a nossa mesa, apesar de estarmos sentados e conversando, eu e Amanda estamos agindo muito mais por cordialidade do que antes e eu acho que as pessoas próximas a nós estão notando, o que torna tudo isso embaraçoso.

O dia correu bem, já estamos no pôr do sol, é incrível como essa rua me dá uma vista completa desse sol laranja se pondo.


POV Amanda.

O sol está se pondo, paro para observar o movimento por alguns instantes até que vejo Cauã dobrar a esquina. Sinto minha respiração mudar um pouco. Como Antônio vai reagir a isso? Eu estou com medo dele não confiar em mim. Olho para ele e o vejo rígido, ou seja, ele também já viu o Cauã.

Um novo samba começa, reconheço a música, um samba do Arlindo Cruz que eu amo. Fala sobre o amor e é exatamente o que eu preciso, passo minhas mãos pelos seus ombros, vejo seu olhar de confusão e o puxo pra dançar comigo, eu quero estar no único lugar que eu me sinto em casa agora, e minha casa é nos seus braços.

Quando o cantor começa a cantar "O que é o Amor?", eu aproveito para cantarolar em seu ouviso uma parte que fala sobre acreditar no amor:

"Mas sei que o amor nasceu dentro de mim

Me fez renascer, me fez despertar"

Depois apoio minha cabeça em seu peito e fico ali até o refrão começar e essa parte canto olhando em seus olhos:

"Quando a gente ama, brilha mais que o sol

É muita luz, é emoção

O amor

Quando a gente ama, é o clarão do luar

Que vem abençoar

O nosso amor

Quando a gente ama, brilha mais que o sol

É muita luz, é emoção

O amor

Quando a gente ama, é o clarão do luar

Que vem abençoar

O nosso amor"

Enquanto o samba vai tocando e vamos dançando e entendemos, que o silêncio que nos ronda precisa sair, nossos olhos não conseguem disfarçar que estamos como represas próximas a romper, concordamos sutilmente, nos despedimos dos nossos amigos e diferente das demais noites seguimos para o meu apartamento, vamos caminhando, aproveitando a brisa e encarando as tulipas em minha mão, os últimos momentos de silêncio que antecedem a tempestade a frente.

EVERY DAY, ONE DAYOnde histórias criam vida. Descubra agora