Capítulo 32

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Imagem da mãe de Jake e Kyle, onde eles foram buscar os olhos azuis *:*


Entrei na casa do meu pai sem bater à porta, sabia que ele não estava acompanhado, aqui ele nunca estava acompanhado, nunca ninguém entrava nestas quatro paredes sem ser eu e o meu irmão. A casa mantinha sempre a mesma aparência se é que tal fosse possível. Não era a maior do território mas podia-se dizer que era das mais bonitas, pelo menos para mim. A sua estrutura de pedra fazia com que ela se misturasse com o ambiente, uma grande sala era visível através de grandes painéis de vidro, que se situava do lado esquerdo da porta de entrada. Tudo nesta habitação tinha sido feito à medida da minha mãe, estava tudo como ela gostava e assim permanecia, mesmo após tantos anos. O meu pai não estava em lado nenhum, passei por todas as divisões sem o encontrar, tudo permanecia intocado, nem uma fibra de pó se via, tudo estava limpo, a casa inteira parecia um altar para ela. O que me assustou um pouco, ele parecia melhor após estes anos todos, até sorria de vez em quando algo que eu nunca tinha imaginado, mas talvez me tivesse enganado, parecia-me que ele se refletia nesta casa, vazio, desprovido de vida. Parei em frente ao único sítio em que eu sabia que ele estava, não bati com medo de o assustar, por isso entrei devagar tentando fazer o mínimo barulho possível, e lá estava ele. Estava de costas para mim, sentado na cama gigante. Parecia tão pequeno naquele espaço, os seus ombros encolhidos, a sua cabeça baixa em martírio, era impossível não sentir a dor dele deste lado do quarto. Como o resto da casa tudo estava igual, fotografias da minha mãe estavam por todo o lado, para onde quer que olhasse via aqueles olhos, aqueles olhos azuis que eu sabia que também estavam estampados na minha cara, era isso que ele via cada vez que olhava para nós? Uma extensão dela aqui, que respirava, um legado que ele talvez nem quisesse se ela estivesse aqui, se ela estivesse viva...

-Pai...

Ele não se mexeu, ele sabia que eu estava aqui, olhando para isto tudo, vendo-o aqui derrotado. Aproximei-me dele e sentei-me ao seu lado, vestia as mesmas roupas desde a última vez que eu o tinha visto, nas suas mãos estava uma fotografia. Eu lembrava-me do dia em que a tirámos, tinha sido um dia de sol e passámo-lo na floresta, o sitio favorito da minha mãe, e aí o meu pai, que sempre ficava absorto na beleza dela ficou com vontade de memorizar o momento. Tinha pousado a máquina numa árvore e tínhamo-nos posto em posição, a minha mãe ria com a tentativa de segurar a mim e ao meu irmão juntos, e o meu pai olhava para ela com o maior sorriso do mundo, como se tivesse a vê-la pela primeira vez. E foi esse o momento que foi conservado, a vida deles exposta numa fração de segundo, tudo o que eles eram e tudo o que tinham.

Agarrei-lhe na mão querendo tirar-lhe todo este pesar de cima, querendo que ele fosse feliz como uma vez foi. Ele deu um pequeno sorriso ainda a olhar para a fotografia e abanou-a com delicadeza, como que na esperança que a imagem se tornasse viva.

-Ela não queria filhos sabias? Simplesmente aconteceu e eu fiquei aterrorizado, tinha medo que algo de mal acontecesse, as lobas dificilmente sobrevivem aos partos. Mas ela começou a criar afeto, a gostar de vocês antes de sequer nascerem, eu pensei para comigo como era possível uma mulher enfrentar a morte quase certa e sorrir para ela. Ela foi a pessoa mais maravilhosa que eu já conheci, ela era mais corajosa que toda a minha alcateia junta, aquela mulher movia montanhas por vocês e por mim.

-Odeias-nos? - Perguntei-lhe sussurrando, sempre tinha medo da resposta, era algo que me corria na mente há anos.

Ele olhou para mim, os seus olhos tornaram-se momentaneamente sérios e ele respirou fundo. Eu respirava fortemente, suor brotava da minha testa.

-Ódio é uma palavra muito forte – Olhava novamente para a fotografia – Eu simplesmente gostaria que as coisas fossem diferentes, às vezes dou por mim a perguntar como seria se vocês não tivessem nascido, se ela ainda estaria aqui... – Olhou para mim e apertou-me a mão com força – Mas isso não muda nada, meu filho...pois não?

Eu chorava em silêncio, lágrimas caiam do meu rosto, o meu corpo soluçava, o meu pai abraçou-me, um pequeno gesto que ele não fazia há muito como pai.

-Vocês foram o que me tiraram do frio depois de ela se ir, e agora eu agora espero apenas envelhecer para a ir encontrar no Caminho. – Ele chorava comigo, e chorava por ela.

Depois de um momento ambos nos compusemos, e ficámos a olhar um para o outro.

-Eu não vos odeio. – Ele falou serenamente – Vocês são meus filhos, parte dela, nunca vos conseguiria odiar por isso.

-Kyle é teu filho também...

Ele fez um sorriso tímido – Eu não me esqueci, embora pareça, ele está seguro isso não me preocupa.

-Seguro? Então tu sabes onde ele está. - Olhei para ele surpreendido.

-Achas que eu deixaria o meu filho por aí? Claro que eu sei onde ele está – Sorriu para mim em confidência.

-Porque o deixaste ir? Eu pensei que...

-Ele precisa de pensar, ele tem de perceber que é aqui o lugar dele, afinal não foi por isso que ele se afastou?

Não lhe respondi, até agora eu sabia o que se ia na cabeça do Kyle, como se o facto de sermos irmãos nos desse algum tipo de conexão rara, mas nada de telepatia ou algo do género, não, essas coisas eram todas mentira, era mais como se tivéssemos um conhecimento profundo um do outro, mas agora, neste momento eu andava às cegas, nada disso parecia existir. E o nosso pai, quem eu pensava que não se importava o suficiente, sempre soube onde ele estava, era algo que mudava a minha perspetiva sobre as coisas.

-Eu vou vê-lo amanhã – Abri a boca para interrompe-lo – Não, não vou porque viste aqui, vou porque ela – Apontou para a fotografia – Iria-me matar se soubesse disto.

Levantou-se lentamente, como se os anos pesassem sobre ele, como se o seu corpo estivesse velho demais apesar de aparentemente ele ser novo demais para isso. Pousou-me a mão no ombro calorosamente.

-Filho, as coisas boas demoram sempre algum tempo a chegar, assim foi com a vossa mãe, assim o foi com vocês, e assim o vai ser com o teu irmão. Mas no fim a espera vale a pena, só tens de ser paciente. – Dito isto saiu do quarto, deixando-me sozinho rodeado das suas recordações.

A fotografia da nossa mãe estava pousada delicadamente em cima da cama, peguei nela e fitei-a, fitei a mulher que eu tanto amava, fitei a mulher que deu a vida por nós. Os seus traços eram finos, as suas expressões sempre alegres, um sorriso sempre estava presente nos seus lábios, os seus olhos azuis que sempre olhavam para nós com nada para além de amor incondicional. Encostei a moldura ao meu peito e baixinho pedi desculpa por ela ter morrido protegendo o que ela mais amava, ela devia ter sobrevivido porque o mundo precisava dela, nós precisávamos dela, e o pai precisava dela mais do que precisava de respirar. Baixinho pedi-lhe desculpa por o mundo ser tão injusto.





Próximo capítulo será sobre o Kyle e o encontro do pai com ele, logo vocês saberão onde ele está e se ele voltará ou não.

Em outro contexto, estava a pensar em escrever um extra sobre a história dos pais de Kyle e de Jake, em como se conheceram, a história de amor deles e o como ela morreu.

Enfim, digam-me se seria do vosso agrado, para eu ir começando a escrever a história.

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