Estava sentada no sofá, tinha passado a noite em branco, depois de ter tido pesadelos novamente nunca mais tinha conseguido dormir, tentei-me distrair a ver televisão, a ler um livro mas nada tinha resultado e tinha acabado por isso, aqui sentada a pensar no Mika. Ultimamente os meus pensamentos iam sempre para ele de alguma forma, mesmo eu não querendo, era-me impossível eu não pensar no tempo que passávamos juntos. Verdade seja dita, que eu, apesar de já ter estado algumas vezes com ele, não sabia muito sobre ele, nem ele sobre mim. Nunca falámos nada para além de coisas superficiais, como se os dois tivéssemos medo de aprofundar as coisas, medo que ficasse tudo muito sério, não que tivéssemos algum tipo de relação. O que não era mentira, pelo menos da minha parte, não sei o que quero dele, só sei que quando estou com ele, consigo ser uma pessoa diferente, mas no bom sentido, é como se me tornasse uma pessoa completamente diferente e conseguisse de alguma forma ser mais livre, mais faladora, coisa que eu não sou normalmente. Ele fazia-me sentir como se eu fosse a única mulher no mundo, como se nada mais importasse sem ser eu, e isso fazia-me sentir especial, acarinhada. No entanto, sentia-me parva por pensar assim, afinal ele poderia não pensar nada disto, e querer ser apenas uma pessoa simpática e meu amigo.
Uma batida suave na porta, meio que incerta tirou-me dos meus pensamentos, fazendo-me levantar do sofá para ir ver quem era. Assim que abri a porta, todos os meus pensamentos fugiram para bem longe, Mika encontrava-se do outro lado da porta, os seus cabelos pretos estavam desengonçados no alto da sua cabeça, os seus olhos azuis demonstravam tristeza. Sem lhe dizer uma palavra, desviei-me para o lado para o deixar entrar, ele dirigiu-se ao sofá mas não se sentou, limitou-se a ficar de pé a olhar para mim, os seus olhos percorriam o meu corpo de alto a baixo, algo que me faria esconder de vergonha, só que os seus olhos não demonstravam luxúria, mas a mais pura das tristezas. Não compreendia o que se passava, mas algo de grave tinha acontecido para ele estar aqui neste estado, talvez tenha vindo procurar alguém com quem falar.
Sem eu esperar, ele começou a falar.
-Sabes eu era uma pessoa solitária, uma pessoa que gostava de estar sozinha, mas então tu apareceste, tu apareceste e de repente eu comecei a querer companhia, a tua companhia. Eu estava bem até que eu te via naquele dia, as tuas feridas, o teu sofrimento deixaram-me simplesmente enraivecido. Porque se eu soubesse quem te fez isso, acredita que eu iria matá-los a todos, percebes? - A sua voz saia em baforadas curtas, como se tivesse dificuldade em falar direito - Mas eu...eu, só quero que tudo esteja bem, que estejas bem, porque tu mereces, pelo que me mostras, pelo pouco que conheço de ti, tu não mereces nada de mal, só bem...
Ele gesticulava enquanto falava, sem parar de olhar para mim, sentia-me confusa com todo o seu discurso, mas não ousei interrompê-lo. Fiquei boquiaberta com as palavras dele, como seria possível alguém que mal me conhece pudesse sofrer tanto por mim, e preocupar-se tanto comigo, as palavras dele aqueceram-me por dentro, reacendendo uma parte da mulher que outrora fora feliz, talvez nem tudo estivesse perdido. Ele aproximou-se de mim, as suas mãos pendiam de cada lado do seu corpo, os seus olhos azuis queimavam fixos nos meus, senti o ar sair de dentro de mim para não voltar. Quando ele chegou perto o suficiente para eu sentir o seu calor, pôs as duas mãos em cada lado da minha cara, e levantou a minha cabeça para que olhasse para ele, a sua pele quente em contraste com a minha.
-Eu tenho de saber se vale a pena...Deixa-me só saber... - E lentamente baixou a sua cabeça e beijou-me.
O seu beijo era leve, apenas um roçar de lábios tão suave que cheguei a duvidar que ele se estava a mexer, ele abriu os lábios convidando-me a retribuir, e eu fi-lo. Mexia os meus lábios contra os dele com mais ânsia do que eu esperava, estava voraz por este beijo e nem me tinha apercebido. O meu corpo mexia-se contra o dele, o meu peito contra o dele fazendo pressão, as minhas mãos arranhavam as costas dele o que o fazia soltar gemidos contra a minha boca, era a melhor coisa que me tinha acontecido em muito tempo, mas acabou rápido demais. Os lábios dele separaram-se dos meus, mas o seu aperto continuava, as suas mãos mantendo a minha cabeça no lugar, os seus olhos faiscavam e respirava mais fortemente agora.
-Já sabes agora? - A minha própria voz saiu mais pesada do que habitual, nem a reconheci.
Demorou um pouco a responder, os seus lábios fechados num sorriso que nem chegava a levantar os cantos da boca - Eu...eu penso que...estou indeciso. - A sua cara demonstrava desconforto, como se não estivesse à vontade para falar, as suas sobrancelhas franzidas.
As suas mãos caíram de novo ao lado do seu corpo, o seu corpo rígido, voltou-me as costas e foi-se sentar no sofá, o pequeno mobiliário rangendo quando absorveu todo o seu peso, as molas chiando, o tecido fazendo um som abafado. Parecia desesperado, a cabeça pendia para a frente e as mãos em cada lado do seu rosto, balançava-se para a frente e para trás, dizendo umas palavras tanto baixo que não conseguia ouvir. Dizia-me mentalmente para ir ter com ele, para perguntar o que se passava, para lhe implorar que falasse comigo, mas ele parecia tão perturbado que não sabia se devia, embora tivesse de fazer um grande esforço para me manter no mesmo sitio. Estúpida! Estúpida!
-Mika...O que se passa?... - Falei a medo, com medo de o perturbar ainda mais, mas achando que não conseguia falar calada.
Ele levantou-se tão de repente que o sofá andou para trás com um som seco. Andou para mim a passos largos e parou à minha frente, lambeu os seus lábios e olhou-me nos olhos.
-Eu, estou num impasse aqui Sophie, sabes o que isso é? Estares dividida entre o que é certo e o que deve ser feito? É onde eu estou neste momento. Eu penso numa coisa e tomo uma decisão, mas o meu lobo não concorda comigo, e tu não sabes o que é contrariar a tua própria natureza, é de loucos. Tu nem por um segundo sais do meu pensamento, deixas-me descontrolado, desde que te vi que não olho para outro lado, sinto por ti o que nunca senti por mais ninguém, diz-me o que devo fazer - Falava com desespero como se não soubesse o que fazer, o seu corpo nunca parando quieto, fazendo gestos com as mãos.
Não sabia o que lhe havia dizer, então simplesmente fiz o que achei que era o mais acertado. Puxei-o para mim com delicadeza e abracei-o, o seu corpo cobrindo o meu, e ficámos assim por o que pareceu uma eternidade.
-Diz-me que sim e eu fico, é só dizeres, diz-me só Sophie. - Sussurrou contra o meu cabelo.
Deixei-me ficar no mesmo sítio, não me conseguia mexer, o meu corpo parecia congelado no mesmo sítio, sabia que o que quer que dissesse mudaria alguma coisa, senão tudo, e eu estava grata por ele me dar a escolher o que fazer. Ficar ou fugir eram as únicas hipótese, e sabia que não haveria retorno para nenhuma. Então engoli o meu medo e decidi que mais valia atirar-me do penhasco já que já me encontrava na borda.
-Tudo aquilo por que passei valeu a pena, se neste momento eu te tenho aqui comigo, pensei que nunca te encontraria, alguém como tu, que me fizesse ver que ainda existe algo pelo qual lutar, que ainda existe hipótese de eu ser feliz. Que a vida afinal não é assim tão má. - Olhei para ele, não saindo do seu abraço, os seus olhos estavam brilhantes e emocionados. - Então sim, por favor, eu gostaria que ficasses.
Beijou-me ternamente a boca, seguida das minhas bochechas e das minhas pálpebras e por último a minha testa, abraçou-me com força. Nenhum de nós conseguia falar nada devido à emoção, ele era a primeira pessoa que eu deixava ver através dos muros que eu tinha construído em volta de mim mesma, só esperava que ele não se assustasse com o que iria ver.
-Estou em casa. - Disse-me ele com carinho ao meu ouvido, o que me fez sorrir como nunca tinha sorrido, a vida podia melhorar afinal de contas, ainda havia salvação para mim.
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A Sombra de Kora
Hombres LoboKora é uma loba que fugiu da alcateia com a sua família, obrigada a voltar pelo alfa, descobre que o seu futuro sempre tinha estado naquela aldeia. Rodeada por dois irmãos gémeos que fazem de tudo para a ter, Kora vai ter de lidar com a indecisão e...