Eu não quero pensar no pior, mas não consigo deixar de imaginar que algo de pior tenha acontecido aos meus pais. Isso acabaria comigo.
*você deveria ter pensando nessa possibilidade desde que acordará sozinho*, o outro Jim repetira mais uma vez em minha cabeça.
Não quero me preparar pra isso. Eles são cientistas. Não sei como tudo isso aconteceu ou como começou, mas sei que eles podem encontrar algo que nos ajude. Uma cura. Tem que haver uma...
*e se não tiver?*
Não consigo pensar com tanta clareza desde que esse outro apareceu dentro de minha cabeça. Às vezes fico em dúvida no que eu deveria pensar, porque pensar em tudo ao mesmo tempo me deixa nervoso e com medo. O que eu devo fazer primeiro? Parece uma tarefa simples, quando minha prioridade é me manter vivo. Não sei porque estou complicando tanto isso.
Eu preciso aprender a ter coragem.
*você precisa aprender a ter coragem*, não sei como ele consegue tirar sarro de mim, sendo que ele sou eu...
Não é suficiente ter momentos de loucura onde consegui sobreviver em algumas situações e outras quase ter me matado. Isso não é coragem. Eu preciso aprender.
Preciso dormir. É amanhã. Amanhã sairei daqui. Não posso ficar por mais tempo aqui. Desse lado é tão silencioso que às vezes eu acho que fiquei surdo. Não há um som. Parece que até os animais fugiram.
Mas ainda posso escrever por mais alguns minutos.""_Depois daquele dia que eu vira a mulher de óculos morrer, uma pergunta nasceu em minha consciência e eu não soube como responder e ainda tenho minhas dúvidas.
_"Eu deveria ignorar a minha humanidade ou não?"
_Entendam, já faz um tempo que estou sozinho nesse mundo. Eu encontrara outras pessoas?
_Sim. Mas continuei só minutos depois. Eu vi pessoas morrerem. Eu vi sangue demais para uma pessoa da minha idade. Eu vi atrocidades as quais nunca pensei que presenciaria algum dia em minha vida. Tudo isso era pra causar algo em mim. Ver aquela mulher morrer e não tentar fazer nada, não sentir nadar, não é certo. Ou seria?
_Mas o que seria humanidade? O que seria ser humano?
_Medo. Humanidade. Empatia. Coragem. Sobrevivência. São coisas que eu deveria entender o porquê. Cada um em seu cada ponto. Tudo isso muda uma pessoa de um jeito ou de outro. E isso tudo havia me mudado e por mais que eu não percebesse ou sentisse, a mudança havia acontecido.
_Ser humano é isso... mudar. Evoluir.
_E agora eu percebo que pela primeira vez eu havia fugido sem tremer... Era tarde da noite quando eu tive que fugir de um barraco aos pedaços que algum morador de rua abandonara. Eu estava em mais um sono leve quando os urros me acordaram. Havia muitas árvores e mato ao redor então tudo era um breu e meus olhos não enxergaram nada, mas mesmo assim eu corri.
_Nem a luz da lua me ajudara naquele momento. Parecia ter mais de 10 criaturas urrando e me perseguindo. Na verdade, eu nem sei se estavam me perseguindo mesmo ou se estava tendo alguma festa ali perto, porque os urros ecoavam para todos os lados. Mas eu não parei, continuei correndo sem saber aonde estava indo. Eu passara o resto da noite correndo.
_Ao amanhecer eu não era ninguém. Eu estava cansado de fugir todos os dias, de correr, de sobreviver. Estava com fome e com sede. Estava sujo. Estava todo acabado, no literal mesmo, tanto fisicamente como psicologicamente. Eu não sabia quem eu era. Yudi? Jim? Eu não era ninguém e perdera toda a vontade de continuar.
_Então eu havia percebido que conseguira sair daquela floresta. Um pouco a frente havia um túnel tampado por um micro-ônibus enguiçado na horizontal e dentro dele havia pessoas socando a janela.
_Quanto tempo eles estavam ali? Por que não quebraram a janela? Como aquele ônibus enguiçou daquele jeito? Todos têm dispositivos para remover a janela por completo, não? Mais uma vez eu não tinha respostas.
_Eu corri e com muita dificuldade passei por debaixo do ônibus. Uma metade da porta estava tampada pelo concreto do túnel. Não tinha como abrir por fora e por dentro o cara que puxava não conseguia. Havia gente socando as janelas, batendo com o volante, ao que me parecia os equipamentos de evacuação de segurança não funcionavam. Não havia nada que eu pudesse pegar para ajudar a quebrar os vidros.
_Eu havia até pensando na possibilidade de entrar em algum carro e empurrar o ônibus, a ideia foi por água a baixo quando havia muitos carros próximos e nenhuma distância do ônibus para empurrá-lo.
_Os urros. Eu pude ver as expressões dele aterrorizadas, com medo. As criaturas estavam se aproximando realmente, então elas estavam me perseguindo. Havia sido muito azar, mas aquelas pessoas no ônibus estavam mais seguras do que eu...""
Hoje me pergunto: eu estava tentando ajudar para que eles pudessem fugir ou para que eu pudesse entrar e me salvar? Talvez não tivesse nem como fugir depois, mas...
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Sangue Morto
AksiOBRA REGISTRADA NA BIBLIOTECA NACIONAL (ISBN) * 29 de setembro de 2013. Foi o ano que o terror começou a andar sobre a terra. De tantos bilhões de seres humanos, apenas um parecia ter sobrevivido a uma pandemia que destruiria a raça humana. Yudi é...