Na literatura, os especialistas e os leitores não treinados para uma visão mais crítica têm um olhar diferente sobre muitas obras. Mas se tem uma coisa que consegue a proeza de desagradar a ambos é o clichê. E por motivos bem compreensíveis.
Saber que um livro está repetindo algo que já vimos mil vezes pode tornar a experiência sem graça.
Mas apesar de causar tanto desgosto, querendo ou não, o estudo desse elemento pode nos ajudar no estudo de narrativa e na arte de produzir textos.
E já na origem dessa palavra que podemos entender mais sobre esse conceito.
O termo vem da época das primeiras máquinas de impressão gráfica. Nelas, era preciso agrupar em conjunto cada letra para formar as frases que seriam impressas.
Só que às vezes, existiam frases que eram extremamente comuns, como um ditado popular. Para agilizar o processo, essas frases que eram repetidas, eram organizadas em um bloco especial de texto para que estivessem prontas para usar. Na época, foi criada uma onomatopeia para descrever o som que essas frases prontas faziam sobre o papel.
CLICHÊ!
A palavra passou a ser usada para nomear esse blocos e mais tarde passou a ser sinônimo de algo que era comum e repetido à exaustão.
Os escritores então foram criando tendências que passaram a ser repetidas e a serem clichês.
Alguns são mais comuns, tanto para alvo de críticas tanto para seu uso nos livros.
Ao escrever, ficamos sobre a influências de outras obras que já consumimos mesmo sem nos darmos conta disso e vocês não imaginam a facilidade de entrar num modo de escrita automático, repetindo o que já viu várias vezes. Cito exemplos da era vampiresca e das recentes distopias que levam suas tramas sobre ombros adolescentes e estabelecem um mundo quase ao mesmo molde.
Ou seja, é um elemento preguiçoso e conveniente.
Em essência, os clichês nada mais são do que receitas prontas, histórias concebidas pela arte do copiar e colar.
Em comparação, a escrita ideal seria um prato de cordeiro recheado, molho pesto e para acompanhar uma salada verde tudo em louças de porcelana; e o clichê seria um miojo no microondas.
Mas sabe o que é?
Miojo é gostoso.
Não importa se é um alimento industrializado, que tem altos teores de sódio e são vetados por nutricionistas.
As pessoas continuam consumindo.
E eu na leitura de algumas obras, tenho a sensação de que os clichês são inseridos de propósito, já que eles causam uma sensação de familiaridade. Talvez muitos temam que originalidade demais cause estranhamento no público.
Mas os clichês podem estabelecer uma conversa interna sobre as obras que são icônicas, considerando as vezes que são repetidas e uma lição sobre a representatividade de personagens.
Latinos são desempregados e escandalosos, asiáticos não falam o idioma corretamente, sem contar dos estereótipos das mulheres e personagens LGBT que perpetuam uma imagem por vezes ofensiva desses grupos.
Mas, antes de vocês me crucificarem nos comentários quero esclarecer uma coisa.
É raro uma história que se vê totalmente livre de clichês. Nem sei se existe alguma.
Mas a questão dos clichês é que eles engessam, paralisam. Os escritores muitas vezes se apegam a essa metódica e sempre caem na zona de conforto.
E eu defendo muito a bandeira da busca pela originalidade.
É isso que a nossa literatura precisa. Inovação.
Busque o novo naquilo que você for fazer e escrever, não fique preso a eles, guarde-os em algum lugar da sua sacola e deixe-os envelhecer e se tornar aquelas bugigangas.
Critique sim os clichês que você encontrar, mas não perca a oportunidade que eles nos dão de nos tornamos leitores mais críticos e também contadores de histórias mais criativos.
Talvez daqui a algum tempo, aquilo que era o novo pode se tornar um clichê também, mas não se apavore. Significa que estamos fazendo um bom trabalho.
É so respirar fundo e continuar na sombra da originalidade.
Prevejo tretas nos comentários por que essa questão é capaz de competir com o velho Capitu traiu Bentinho?. Mas agora que eu já falei, quero ouvir vocês também.
Digam nos comentários, qual é a sua opinião, se concorda ou discorda de mim. Compartilhe seu ponto de vista. Civilizadamente, por favor.
No próximo capítulo, continuaremos no assunto e vou trazer uma lista de clichês correspondentes a gêneros específicos.
VOCÊ ESTÁ LENDO
#Destrinchando
De TodoEssa é a verdade. Escrever é um ato de fé. Sem inspiração divina, vários textos inacabados, bloqueios horrorosos e cerca de 12 vezes ao dia, uma vontade de sentar, desistir e chorar. Não especificamente nessa ordem. Muitos correm atrás de cursos pa...