Um assassino?

660 104 706
                                    

Acordei com a luz entrando pela escotilha.

Seu peito estava nu, exatamente como na noite anterior quando me deitei sobre ele. Levantei-me da cama com o máximo de cautela que conseguia ter, andei com passos ligeiros até o banheiro e procurei as roupas que Miguel usara em meu sonho. Não estavam lá. Olhei nas gavetas das cômodas, mas também não estavam lá. Sentei-me na cama e apoiei a mão na testa. Eu estava enlouquecendo e imaginando Miguel como um terrível assassino.

Levantei-me novamente e olhei para meu esposo. O cabelo bagunçado sobre o travesseiro, as feições tranquilas, o peito nu com poucos pêlos lisos. Não, aquele homem não mataria uma mulher, apesar de ser o mesmo corpo, ele não tinha a mesma presença.

Olhei para nossas malas e meu coração acelerou, eu ainda não tinha mexido na mala de Miguel desde que chegamos ao navio. Aproximei-me devagarzinho e abri o fecho bem lentamente para que não fizesse barulho. Meu coração batia forte, meu corpo estava tenso com a expectativa e foi por isso que quase enfartei quando Miguel tapou meu rosto com uma mão e beijou meu pescoço.

Soltei um grito e saltei longe, e quando o vi, notei seu olhar confuso.

— O que aconteceu, amor? — Seus olhos adquiriram uma expressão triste.

— Nada, eu só estava pensando que nem olhei suas malas. Não é estranho? — Sim, era uma meia verdade, mas ele não precisava saber a verdade.

Miguel sorriu e seu rosto se iluminou como um sol, ele nada disse, apenas levantou-se da cama, colocou suas malas sobre ela e as abriu. Estavam vazias, assim como as minhas.

— Satisfeita? — Ele se aproximou e me enlaçou em um abraço terno.

Tinha sido apenas um pesadelo, só isso. Devolvi seu abraço e me aconcheguei no calor de seu peito nu.

— Eu amo você. — Ele sussurrou.

— Eu amo você. — Aspirei o ar com o seu perfume e o soltei em um longo suspiro.

♠♠♠♠

Nia esteve estranha durante todo o dia. Começou pela manhã quando disse que queria ver minhas malas, não havia nada errado com minhas malas, na verdade estavam vazias.

No decorrer das horas tentei fazê-la sorrir e até mesmo consegui algumas vezes, mas sempre flagrava seu olhar a me analisar. Era como se não me conhecesse ou como se esperasse que eu fosse atacá-la a qualquer momento.

Será que algo havia acontecido durante a noite? Eu não sabia, estive a dormir muito pesadamente.

Mas havia algo muito diferente. Era tão estranho que até mesmo tinha se esquecido de Isac. Aproveitei-me dessa lembrança, foi minha estratégia para tirá-la daquele estado, falar sobre Isac. Funcionou, ela pegou o celular e ligou para a mãe.

♠♠♠♠

— Mamãe, bença. — Fiquei tão absorta em minhas divagações sobre Miguel que havia me esquecido de Isac. Que meu amigo me perdoasse. Pensar que seu marido é um assassino é algo muito urgente.

— Minha filha, a lua de mel deve estar boa. — Seu tom parecia despreocupado, mas não estava.       

— Ótima. E Isac? Tem notícias? — Fui grossa, mas não tinha interesse em prolongar assuntos inúteis.

— Nenhuma. Apenas na segunda. — Minha mãe suspirou.

— Mãe, contrate um advogado bom. — Tentei não parecer muito nervosa, mas estava de dentes cerrados.

— Eu chamei o melhor, mas é política da clínica. O psiquiatra só vai estar lá na segunda. Eu sinto muito, Petúnia. — Ela suspirou novamente.

Eu sabia que ela queria ver Isac tanto quanto eu.

— Tudo bem, tchau mãe. Vamos fazer aula de dança em dez minutos. — Eu não estava empolgada, mas seria desperdício não ir, sempre quis aprender a dançar tango.

— Fica com Deus. — Ela abençoou.

— Amém. — Falei e depois desliguei.

Olhei para Miguel. Ele observava o mar desde pouco antes. Seu rosto estava tranquilo os cabelos balançavam ao vento. Senti uma estranha vontade de abraçá-lo e não mais soltar.

Ele não matou alguém, o navio estaria em estado de alerta se isso tivesse acontecido.

A Rosa do Assassino [Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora