Adeus, Djéfani.

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— Nia, nós precisamos fazer um boletim de ocorrência! — Miguel estava de costas para mim e segurava firme na beira do balcão da pia. Seus ombros estavam tensos.

Fazia cerca de meia hora que discutíamos o mesmo tópico: Fazer ou não o boletim de ocorrência.

Miguel não entendia o que me ocorrera e os motivos de eu não querer denunciar crime junto às autoridades. Ele assegurava que não tinha um irmão gêmeo, nem qualquer tipo de irmão. A mãe nunca contara da existência de algum e em toda sua vida ele não tinha visto algo que comprovasse a existência de outro. Era filho único. Isso significava que não poderíamos explicar a existência de outro. O que colocava Miguel na condição de principal suspeito. A polícia trabalhava com fatos, minha intuição de nada valeria.

Miguel não entendia minha linha de raciocínio, e se eu explicasse de maneira mais didática, ele seria capaz de se entregar.

— Miguel, nós não podemos! Não até descobrir quem é esse homem. — Bufei.

— Olha o que ele fez em você. — Miguel se virou e analisou meu rosto. Sua voz estava embargada. — E eu não fui capaz de protegê-la, Nia.

Colocou as duas mãos sobre o próprio rosto e seu corpo começou a sacudir. Levei alguns segundos para entender que ele chorava. Mesmo que eu estivesse machucada e dolorida fisicamente, a dor de ver meu marido naquele estado, desesperado por uma resposta, uma saída ou uma salvação qualquer, se sobrepunha a todo o resto.

Levantei da mesa e me aproximei dele. Respirei fundo antes de puxar suas mãos de onde estavam. Perscrutei o rosto banhado em lágrimas. Abracei-o e ele fez o mesmo comigo. Apoiou o queixo sobre minha cabeça enquanto se acalmava.

— Tudo bem, Miguel. Podemos colocar câmeras na casa. — Confortei.

— Tem uma coisa... — Ele enfiou a mão no bolso e me entregou algo. Era um bilhete. — Estava sobre a mesa esta manhã. Poderia servir de prova.

Minhas mãos tremiam segurando o bilhete. “Lembre-se de mim, irmão.” Era o que estava escrito.

— Nunca, jamais poderemos usar isso! — Coloquei uma mão trêmula sobre a boca enquanto a outra ainda segurava o bilhete.

— Por quê...? — Questionou confuso enquanto se afastava de mim.

— Miguel, a letra é idêntica à sua. — Concluí. Os olhos embaçados pelas lágrimas represadas.

Ele não tinha percebido porque pegou o bilhete da minha mão e o analisou. Ficou assustado, o que me levou a crer que ele chegou à mesma conclusão.

— Não é meu. — Se defendeu.

— Eu sei, mas você acha que a polícia acreditaria? — Aquilo o incriminaria.

— Não. — Admitiu com ar de cansaço. — O que faremos?

— Construir um muro e colocar câmeras. Creio que cedo ou tarde o pegaremos. — Respondi.

Eu esperava que fosse mais cedo do que tarde. Tudo aquilo era uma tortura constante. Eu me fazia de equilibrada e forte para consolar Miguel, mas a verdade é que no íntimo, no mais profundo do meu ser, tudo doía muito. Era um constante e doloroso fluxo de lembranças que me machucavam cada vez que eu piscava os olhos e ouvia meus pensamentos.

Talvez eu ainda precisasse de um psicólogo.

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Eu estava em minha sala. À minha frente, as pastas furtadas. Em poucos minutos eu precisaria me reunir com o delegado e explicar tudo o que tinha ocorrido na madrugada passada. Isso significava que eu tinha poucos minutos para ver o conteúdo das pastas e pensar em uma maneira de ajudar Isac.

A Rosa do Assassino [Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora