Pela manhã

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— Você enlouqueceu? — Nico gritava comigo em plena sala de interrogatório. — Se tivesse assassinado aquele idiota, não teria santo que tiraria você da cadeia!

Furioso, andava de um lado para o outro com as mãos na cintura e uma expressão de dar medo. Parecia um felino enjaulado.

Eu ainda tentava me situar no tempo e no espaço. Em um momento eu estava sobre Schukrut quase colocando fim à sua vida miserável, e no outro, bem, eu estava algemado em uma sala de interrogatório com Nico furioso bem à minha frente.

— O que aconteceu? — Perguntei ainda tonto.

— O que aconteceu? — Ele parou e me encarou. — O que aconteceu?! — Apontou o indicador de forma ameaçadora. — Eu digo o que aconteceu: Vo-cê-é-um-i-di-o-ta! Idiota! Você me bateu, roubou o MEU carro e foi matar o psiquiatra mais famoso da cidade. Eu não consigo nem dizer o quanto estou furioso com isso. Se eu não tivesse te desmaiado, você teria se comprometido ainda mais, garoto inconsequente!

— Você devia ter deixado. — Reclamei. — Ele me deve a vida de Djéfani.

— Não, Isac! Ele deve a vida à justiça. E eu quero que seu advogado lamba meus pés. Se não fosse por mim você teria piorado, e muito, sua situação! — Nico esbravejou.

— A justiça não resolve merda nenhuma, Nico! — Fiquei agitado, aquele homem era rico e sairia impune. Djéfani nunca descansaria.

— Dessa vez a justiça vai resolver. — Afirmou com tamanha convicção que quase acreditei.

— Diga isso para a Nia que corre perigo até hoje! — Gritei e tentei me levantar, mas não consegui.

— A polícia vai resolver isso. A justiça vai resolver os dois casos. — Firmou.

— Não, ela não vai, detetive imbecil! — E não ia, a justiça nunca punia os ricos. — Você sabe que não é assim que funciona.

— Vai funcionar. Eu também estava lá, Isac. Eu também sinto muito por ela ter morrido. — Colocou a mão na testa de modo que se assemelhava com a aba de um boné. E depois a desceu sobre os olhos.

— Você não devia sua vida a ela! — Minha voz estava embargada. — Eu devo.

— Ela não pediu para você matar ele. — Nico chorou discreto. — Não pediu para você foder com sua vida.

— Mas eu precisava fazer isso, você não me entende. — Eu também chorava. Todo meu corpo doía. E algo que não era físico também doía.

— Eu entendo você mais do que imagina, Isac. E me agradeça por poder ir ao velório dela. — Ele se dirigiu à porta enquanto enxugava as lágrimas do rosto. — Vou providenciar o velório. — Quando disse isso não vi mais que suas costas, mas eu sabia que ele ainda chorava.

Talvez ele estivesse certo. Ela não me pediu para acabar com a vida daquele estúpido, mas era questão de honra, eu não viveria se ele ficasse impune.

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Acordei e Nia não estava na cama. Minha última lembrança era ela nua com a cabeça sobre meu peito.

Saltei do colchão e me alonguei. O dia estava bonito lá fora, ensolarado. Olhei através do vidro da janela e constatei que precisávamos plantar algumas roseiras. Ficaria perfeito.

Após o ritual de higiene matinal, fui ao supermercado e comprei alguns suprimentos básicos. Acabáramos de chegar da viagem de lua de mel, não tinha comida em casa.

Quando cheguei do supermercado - cerca de meia hora depois de sair - chamei por Nia, mas ela não respondeu. Teria ido a algum lugar? Coloquei as compras sobre a mesa da cozinha onde havia um bilhete em um papel amarelo. “Lembre-se de mim, irmão.” Era o que estava escrito.

A Rosa do Assassino [Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora