Mais revelações

490 83 117
                                    

Ricardo atendeu a porta, completamente atordoado e com o rosto inchado de quem dormira alguns minutos antes. O irmão de Nia olhou para mim e para Nico como se fôssemos um par de loucos.

— Ricardo, você tem o endereço da sua irmã? — Nico lançou a pergunta como um dardo e nem se preocupou em conter a preocupação.

— Não conseguimos encontrar. Também não consigo falar com ela. — O rapaz respondeu.

— Obrigado. — Nico agradeceu e disparou correndo na direção do carro.

Observei o detetive por alguns segundos antes de me virar para Ricardo.

— Ricardo, se sua irmã aparecer, nos avise imediatamente. — Pedi.

— O que está acontecendo? — Seu olhar implorava por uma resposta. Os cantos dos lábios apertados de descontentamento.

— Não conte para o seu pai... — Nico me mataria por aquela atitude. — O Miguel é o assassino da rosa. — Nico buzinou. — Desculpa, preciso ir.

Segundo os planos de Nico, precisaríamos descobrir o paradeiro de Nia e Miguel com a ajuda dos funcionários do aeroporto.

♠♠♠♠

— Você quer fazer xixi? — Juan perguntou, mas sabia que era uma pergunta inútil porque ela não responderia. — Vou levar você ao banheiro.

Rápido e preciso, o homem pegou Nia nos braços enquanto observava o terror em seus olhos. Mesmo que ela o odiasse, precisaria dele porque Miguel não voltaria cedo. E os efeitos da droga eram mais persistentes do que a mulher poderia supor.

Depois de tudo resolvido, Juan devolveu Nia para sua posição inicial e voltou a se sentar na cadeira ao lado da cama.

— Onde parei? — Perguntou enquanto sorria com escárnio. — Ah sim... Comecei a contar meus planos malignos como os vilões das animações. — Riu sem humor. — Resolvi dar a você o que você mais quis. Assim você iria me amar, mas antes preciso avisar que eu não apareço apenas nas madrugadas.

“Sim, eu estava perto naquela sexta-feira. Quando você desceu do carro, não observou os arredores. Já tinha combinado tudo com o meu pai; ele ligaria para a empresa onde seu amigo Isac trabalha e pediria um favor, assim o indecente ficaria preso e não poderia comparecer. Você entrou no bar e esperou. Desapareci. Deixei para Miguel a missão de ir ao bar e se apaixonar por você. Claro que ele poderia estragar tudo e meu trabalho iria pelo ralo, mas não aconteceu. Meu irmão entrou no bar e viu você no balcão, exatamente o tipo de mulher que ele procurava, com o bônus da cor dos olhos.”

Juan bebeu um pouco de água antes de continuar a história.

— É. Ele fez tudo certo, o coração dele bateu mais forte quando viu você. Então ele te seduziu, foi fácil, você se sentiu atraída demais por ele. Um tipão, não é? Enquanto vocês conversavam, Naila vigiava os passos de Miguel sob as ordens de meu pai. Ela precisava dele, o pai dela tinha sido aliado do meu e a aliança permaneceu. — Juan se mexeu na cadeira. — Foi um belo plano. Quando percebeu que vocês estavam prestes a sair, a mudinha deu sinal para o funcionário que trabalhava com ela estacionar um furgão da clínica ali na frente. Foi rápido. Carregaram o homem ainda vivo até o beco, mãos amarradas, amordaçado com uma espécie de tecido bem macio, que não deixou marcas. Encenaram como se ele andasse. Era um cliente do meu pai. A marreta para matá-lo já estava escondida por ali, apenas a usaram e colocaram a rosa no corpo sem vida.

“Escolher aquela mulher para executar o trabalho foi idéia de gênio. Ninguém desconfiaria de deficientes. Como já sabe, encontraram o corpo e você tinha sua grande matéria, minha primeira prova de devoção.”

♠♠♠♠

— QUEM EU PRECISO ESMURRAR NESSA MERDA DE AEROPORTO PARA SABER UMA DROGA DE INFORMAÇÃO? — Nico esbravejava em uma das salas da administração do aeroporto. Nunca fiquei tão feliz pela expressão “cuspir marimbondo” não se referir a um ato literal.

Um rapaz atordoado ligou para alguém. Nico nos enfiava em uma encrenca, mas não esperava menos que isso de quem estava corria contra o tempo.

♠♠♠♠

— Foi ou não um plano espetacular? — Juan gargalhou. — Eu dei a você exatamente o que você queria. E ganharia tudo o que eu mais quis. Aquele homem foi parte do plano, assim como o rapaz do cinema.

“O rapaz do cinema foi um ato de mestre. Ah... se foi.  Naila e o comparsa o colocaram na sala um pouco antes de o filme começar. Assegurei-me de fazê-los passar pela segurança. Há uma passagem para os funcionários que fazem faxina, foi preciso apenas de alguns uniformes para que ninguém percebesse os infiltrados. Miguel foi ao banheiro e eu apareci, ajudei Naila e o comparsa a colocar no carrinho da faxina o corpo do rapaz, que estava escondido no banheiro dos funcionários. Já semimorto. Demos uma dose cavalar de antidepressivos. Passamos por todas as pessoas distraídas, ninguém observa faxineiros nem o material que eles carregam. Depois voltei para o banheiro dos frequentadores do shopping e foi quando Miguel voltou.”

O homem estalou a língua no céu da boca enquanto se lembrava do plano perverso.

— Ah sim, você estava maravilhosa naquela noite. Tão ousada. Apaixonada. Uma vadia que finalmente me queria. — Juan acariciou o maxilar de Nia com dois dedos e depois lhe desferiu uma tapa. — Você não me quis, mas quis ele! — Contemplou enquanto a marca vermelha tomava forma na pele da mulher. — Minha parte favorita daquela noite: quando você abandonou Miguel para fotografar o cadáver. Foi fantástico! Tem minha admiração. A parte que menos gosto: Miguel broxar. Ah, como eu queria que ele enfiasse nosso pinto na sua boceta!

“Mas é preciso perdoar, você era intensa demais para ele. Segui vigiando os resultados e tentando controlar os apagões de Miguel. Meu pai ajudava. Quase toda madrugada eu ia vê-lo depois de cuidar do meu roseiral.”

“Sabia que minhas roseiras ficavam em uma estufa no porão? Foi Yamma quem me ensinou a cultivar daquela maneira, o conheci graças à Naila e uma associação que integrava deficientes. Trata-se de um sistema complexo que envolve controle de temperatura, luz e umidade, digo, a estufa sabe. Naila conheceu o velho em confraternizações de surdos, ela nos apresentou, paguei bem pelas aulas.”

Juan colocou água em um copo e fez Nia beber.

— O fiz enviar aquele buquê. O de domingo, na feira. Paguei muito bem para que ele entregasse sem falar de quem era. O convenci de que era um caso de amor. — Juan se levantou e voltou a contemplar a tempestade que caía lá fora. — Não tinha problema, logo ele estaria morto. Aqui vai uma informação que você não sabe: Papai é dono do jornal no qual você trabalha. O suposto dono é apenas um laranja. Por isso eu tinha cópias de todas as chaves. Por precaução guardei a original do freezer.

“Você estava mais que fantástica naquela noite. E Miguel se esforçou para ser seu príncipe encantado. Ele estava apaixonado, achei muito lindo. E impagável foi a  cara do seu amigo Isac quando viu vocês. Ele gostava de você, estava escrito na testa do malandrinho. E você escolheu outro. Você ME escolheu. Mandamos não te darem o prêmio de primeiro lugar. Você ficaria fragilizada e Miguel teria espaço para agir, conquistando ainda mais seu coração. Tudo funcionou muito bem. Yamma morto, menos uma testemunha, você entregue a Miguel. Mas eu não mataria Lia daquela maneira, apesar da intenção de matá-la para te dar uma notícia e para fazer com que seu amiguinho se sentisse culpado, no entanto, naquele dia, Deus estava piedoso comigo e fez o trabalho.”

♠♠♠♠

Depois de ameaçar metade dos funcionários e precisar chamar o delegado, Nico finalmente teve acesso às informações que pedira.

Meu coração ficou apertado.

Nia ainda estava viva?

A Rosa do Assassino [Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora