Acordei antes de Miguel. Já passava das onze horas da manhã. Sentei na cama, olhei para a janela e tentei lembrar todos os pontos positivos de estar viva. Minha família e Miguel foram os dois pontos que me fizeram levantar da cama naquele dia. Cuidei da minha higiene matinal enquanto via no espelho do banheiro que minha aparência ainda estava péssima.
Fitava o espelho do banheiro quando me lembrei do encontro com Isac no dia anterior, da maneira como me tratou. Lágrimas brotaram nos olhos e me escorreram pela bochecha. Desviei o olhar do reflexo e respirei fundo para não chorar mais. Liguei a torneira e joguei no rosto uma boa quantidade de água fria. Serviu para acabar com a vontade de chorar, mas por dentro eu ainda me sentia arrasada.
Rastejei até a cozinha, estranhamente minha mãe ainda não tinha acordado.
Coei o café enquanto pensava em Isac, Arlete, a mãe de Miguel, Yamma e tantas outras pessoas que cruzaram meu caminho e acabaram mortas. Senti-me mais depressiva que antes. Tantas mortes que eu carregava nas costas, o preço da minha inconsequência, da minha ambição.
Escorei o corpo na beira da pia e olhei pela janela. O sol brilhava como se nada no mundo fosse ruim. Os dias bons continuavam bons e o peso da minha culpa não alterava o mundo. Se eu pudesse voltar no tempo... Se pudesse mudar o passado... Talvez muitas pessoas ainda estivessem vivas. Senti falta de minha mãe. Enchi uma caneca com café para levar até o quarto. A porta estava fechada. Bati levemente, minha mãe não respondeu. Bati mais forte e nenhuma resposta. Insisti, sem resultado.
Testei a maçaneta e descobri que estava destrancada.
Eu faria uma surpresa.
— Acordaaa... — Cantarolei enquanto abria a porta e entrava no quarto.
Quando olhei na cama, por alguns segundos, senti meu coração parar de bater. Depois, foi como se houvesse apenas coração em mim, sendo perfurado por um milhão de cacos de vidro e explodindo na caixa torácica.
Senti-me incapaz de respirar. Minhas mãos não foram fortes para segurar o peso da xícara. Meus joelhos não sustentaram mais o peso do meu corpo. E talvez, eu não conseguisse mais sustentar a vida em mim.
Minha mãe, estava morta.
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Nia já tinha se levantado e eu me preparava para o meu banho matinal. Peguei o celular e liguei na empresa de segurança, já era quase hora do almoço, mas valia à pena tentar uma instalação imediata do sistema de monitoramento. Eu pagaria o que fosse necessário.
Informaram-me que pelo triplo do preço o serviço poderia ser feito depois do horário de almoço. Concordei. Precisávamos.
Quando abri a porta do quarto vi Nia no final do corredor, com uma caneca na mão e abrindo a porta do quarto da mãe. De onde estava pude ver quando ela gritou, a caneca caiu, se partiu em centenas de pedaços e os joelhos de Nia cederam.
Corri para o quarto e testemunhei a cena mais macabra de toda a minha vida. Até a minha morte eu seria incapaz de esquecer aquela cena.
A luz da alegre manhã entrava pela janela e incidia diretamente sobre a cama. O cadáver de Lianmar estava vestido com a fantasia de unicórnio. A expressão, congelada eternamente no rosto da mulher, era do mais puro e completo pânico. A fantasia fora cortada de maneira vertical na altura da barriga. A própria barriga teve a pele cortada, da altura dos seios até o início do monte de Vênus, e a mesma pele foi puxada de modo que expusesse as vísceras. Algumas partes do intestino foram arrumadas para a perfeição da pior parte do arranjo. No centro do ventre aberto estava fincada a varinha de condão, com as luzes acesas e piscando. E ao redor da varinha havia uma dezena de colombianas amarelas, todas fincadas com muita perícia para que ficassem totalmente imóveis. Havia sangue em todo lugar.Minha primeira reação não foi ajudar minha esposa. Meu estômago estava tão revirado pela cena que minha primeira reação foi virar para o lado e vomitar.
A pessoa que fez aquilo era completamente doente e precisávamos fugir o quanto antes.
Olhei para Nia no chão. A expressão de pânico parecida com a da mãe, mas cheia de lágrimas e desespero. O choro de Nia era o lamento mais triste e doloroso que eu poderia ouvir. Ela gritava e chamava por Lianmar. Gritava uma dor que eu não era capaz de tirar de seu ser, e eu queria, eu daria a vida para tirar aquela dor dela, mas eu não podia porque era fraco e humano.
Tentar tirar Nia do quarto foi uma tarefa hercúlea. Ela não queria sair, mas não era bom que ficasse ali. Ajoelhei-me no chão e bloqueei sua visão. Ela chorava e gritava desesperada, em negação. Usei todas as minhas forças para levantá-la e movê-la dali.
Foi estranho, como se eu estivesse fora de mim, e a prova era meu choro que eu não sentia. Apenas quando vi as lágrimas caindo no ombro de Nia, foi que tive consciência do meu próprio pranto.
Mas eu precisava ser forte.
Quando minha mãe morreu, Nia foi meu chão e naquele momento, ela precisava de mim.
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A Rosa do Assassino [Concluído]
Mystery / ThrillerNia vivia sua tranquila vida como jornalista local de uma cidade pacata, mas seu grande sonho era escrever sobre um importante caso, um que arrebatasse a cidade, que causasse frisson e pânico. A jornalista desejava ascender às custas do caos que ape...