m o r t a l

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Hazel

_O que você veio fazer aqui? - Pierre atirou me puxando para um canto da casa supostamente  para que sua acompanhante não me visse.

Eu puxei meu braço bruscamente derramando um pouco de vinho tinto no chão e então o encarei triunfante e cheia de dor.

_Eu vim aqui porque precisava pedir desculpas. - sussurrei tão baixo que quase nem ouvi minha própia voz. - Eu tenho que prestar algumas explicações..

_Eu vi tudo, Hazel, não precisa se explicar. Vocês me chamaram para assistir ao pôr-do-sol, mas me atrasei um pouco. Quando cheguei vocês já se beijavam, então fiquei de longe apenas observando esperando que acabassem logo para eu me aproximar. - ele ergueu os braços em sinal de rendição e eu neguei com a cabeça me sentindo uma vagabunda. - Era só isso?

Eu não respondi a principio, apenas parei para fitar seus incríveis olhos castanhos. Eu nem ao menos sabia o que dizer, mas eu entenderia se ele me mandasse embora dali naquele momento porque eu realmente merecia.

Eu ainda não tinha acabado, havia muitas coisas serem reveladas. Eu necessitava apenas de mais uns goles e concentração.

Pierre estava totalmente nu e aquilo era extremamente desconfortável para mim. Entretanto, não era aquele corpo da cor do pecado que me aborrecia, e sim o fato dele estar com outra garota em seu quarto. Aquilo era ácido demais para ser engolido de uma só vez.

Então eu respirei fundo, pisquei algumas vezes e então suspirei cansada:

_Não. Deus, como eu gostaria que fosse apenas isso! - tirei a franja vermelha da frente dos olhos e então sorri tristemente. - Precisamos conversar.

_Agora? - Pierre revirou os olhos. - Eu estou meio ocupado se você não percebeu. - e apontou na direção do seu membro grosso e rígido como uma rocha.

Engoli a seco para não vomitar as borboletas mortas que estavam em meu estômago.

_Sim, eu sei. Você pode terminar, não tenha pressa, mas gostaria de te ver novamente. Você está livre amanhã? - o desespero em minha voz era nítido, eu estava me humilhando para ele me dar apenas um pingo de atenção ou o que quer que fosse.

Pierre ficou me olhando de cima meio desconfiado.

_Não, tenho um compromisso. Mas eu te ligo caso mudar de ideia. - ele respondeu ainda desconfiado e aquilo fora como um soco no estômago. Eu estava na sua lista de espera, na lista de garotas que ele jamais telefonaria. Quem ele estava tentando enganar afinal?

_Por favor, não se esqueça. Eu realmente preciso te falar algumas coisas muito importantes, precisamos conversar, Pierre. - a seriedade no meu olhar transmitia uma sobriedade enorme, nem era como se eu tivesse acabado de tomar uma garrafa de Jim e ido direto para o vinho.

Pierre me encarou de uma forma tão amarga, eu nunca tinha visto aquela expressão antes. Ele parecia enojado.

_Ok, Hazel. Ligo para você quando estiver com tempo. Agora se você não se importa, eu gostaria de ficar sozinho. - Pierre olhou em direção a porta e eu entendi perfeitamente que não era bem vinda ali.

_Claro. - eu assenti com a cabeça humilhada, me afastei um pouco e deixei a taça de vinho encima da mesinha de centro na sala.

Derrotada e loucamente arruinada, eu simplesmente caminhei até a porta sentindo meu mundo ruir. Eu só queria ir para casa e descansar minha cabeça depois de um dia tão cansativo.

Eu não tinha mais ninguém. Não tinha família e também não tinha amigos já que Yago estava saindo com a sua garota e sem tempo para mim, enquanto Damon programava uma vingança e Pierre tentava controlar o nojo que sentia da minha cara.

Novamente sozinha. Para sempre sozinha. Eu certamente morreria em silêncio, mas isso já não me importava mais.

Quando eu estava abrindo a porta para sair, a voz de Pierre me paralisou completamente.

_Espere! - ele disse em tom autoritário. - Como está o Yago?

Olhei para trás fria e inexpressiva e o encarei silenciosamente. Eu não sabia se aquilo era uma ironia ou um sinal verdadeiro de preocupação.

Então sorri amarelo e respondi suave:

_Está bem, obrigada. - e me virei para ir embora.

_Hazel! - ouvi chamar mais uma vez. - Não hesite em me ligar caso ele precise de algo.

Eu murmurei um "ok" e finalmente sai. Bati a porta devagar e contei até três antes de encarar o caminho de volta para casa. Eu teria que passar por um corredor extenso e frio, depois atravessar a cidade iluminada até o apartamento. Mas eu poderia simplesmente ir pelo caminho mais curto e parar em algum bar para beber algo.

Eu precisava decidir.

Foda-se!, sussurrei a mim mesma e tracei meu caminho magoada e destruída em mil pedaços.

Passei em frente ao meu antigo dormitório e imaginei que talvez Sabine estivesse lá. Eu não desejei vingança, eu não pensei em nada, apenas segui em frente e fui embora. Eu não queria me vingar dela, não mais. Ela não era a minha pior inimiga. Ela não era nada. A responsável por toda a desgraça em minha própia vida era de fato eu mesma. Eu não poderia culpar ninguém além de mim.

Sai do prédio e senti a brisa gelada da noite. Eu estava no campus e a movimentação era quase nula. Não seria exagero se eu dissesse estar sozinha.

Coloquei o capuz da jaqueta preta encima da cabeça e caminhei até a saída da faculdade. No caminho eu me equilibrei em pernas bambas que sustentavam um corpo fraco e usei árvores para me apoiar. Estava escuro ao mesmo tempo que iluminado demais. Eu me sentia perdida e nauseada, não era o álcool, era meu corpo entrando em alerta.

Olhei ao redor, tudo girava e então antes que eu pudesse imaginar um jato de vomito explodiu para fora da minha boca. Eu nem ao menos tive chance de me recuperar do primeiro, quando o segundo jato de vomito ameaçou sair também. Então eu me apoiei em uma árvore a minha esquerda e me curvei esperando o pior.

Senti uma pontada aguda dentro do meu estômago, era como se uma faca estivesse me rasgando por dentro e então novamente eu vomitei.

Eu estava tão fraca a ponto de cair dura naquele gramado. Eu não conseguia respirar normalmente com aquela dor horrível na minha barriga. Juro que eu nunca havia sentido algo tão forte. A sensação era parecida com a de levar uma facada na barriga, mas ao contrário.

Esperei a tontura passar e então quando estava um pouco mais sólida o pior aconteceu.

Franzi a testa limpando o canto da boca sujo por um líquido esverdeado e gosmento. De repente eu percebi que não era apenas uma gosma verde, era algo amargo como fel. Mas o espanto apareceu mesmo quando eu percebi que minha boca estava se enchendo de sangue.

_O quê? - indaguei assustada cuspindo o sangue no chão. Coloquei o cabelo atrás da orelha e então fixei meus olhos no que eu tinha acabado de vomitar: sangue e gosma verde.

E então descobri: eu estava doente e isso poderia ser mortal.

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