c a f é

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Capítulo 28, café

Pierre levou a xícara de café calmamente até os lábios, deu um sorriso e respondeu apenas:

_Eu não sou o pai.

Eu franzi o cenho estranhando a resposta tão rápida e segura, e estranhando também aquele ar de desdém que ele tinha sobre um assunto tão sério.

_Como você pode ter tanta certeza? - questionei quase que o acusando de ser sim o pai daquela criança.

Pierre deixou a xícara na mesa, ergueu as mãos e contou nos dedos.

_Oito. - ele disse seriamente. - Há oito meses que eu não encosto sequer um dedo nela.

_Mas ela pode ter escondido a gravidez durante esse tempo. Não sei... - eu insisti meio apavorada por dentro.

Pierre molhou os lábios carnudos e suspirou começando a ficar impaciente.

_Hazel, minha amada amiga, é impossível ela ter escondido uma gravidez já na fase final. Nos encontramos outras vezes e eu não vi nenhum sinal de barriga. - Pierre fez uma pausa para analisar minha expressão. - Eu realmente não sou o pai. Ainda bem porque eu realmente não iria querer esse filho.

Ergui uma das sobrancelhas intrigada.

_O que você quer dizer com isso?

Pierre olhou pro lado e deu de ombros.

_Eu só não iria querer... Aliás, eu não tenho a menor ideia de como é ser um pai porque eu nunca tive um.

_Pierre, essas coisas a gente não nasce sabendo, no entanto, aprendemos com o tempo. - minha voz soou tão doce quanto mel.

Eu tentei ser compreensiva com Pierre porque eu também não tive um pai e se tive foi por pouquíssimo tempo. Claro que os doze anos em que tive a presença dele marcaram toda a minha vida. Mas meu pai não esteve ali para me aconselhar quando eu precisei mais tarde, ele não esteve para me ver discursar quando terminei o ensino médio e ele também não me disse que eu jamais deveria perder minha virgindade dentro do banheiro de uma festa com um cara que só estava perto de mim porque eu estava bêbada.

A verdade é que meu pai tinha perdido muita coisa da minha vida simplesmente porque não queria ou porque não poderia estar ali. Eu não o culpava, mas seria mentira se eu dissesse que não sentia uma pontada de raiva mesmo que vagamente e em picos altos de loucura.

Eu também não tive uma mãe, então eu realmente entendia o que Pierre queria dizer com "eu não tenho a menor ideia de como é ser um pai" porque eu também não tinha a menor ideia de como ser uma mãe.

_Se aprendemos como é ser um pai, me diz por que o Victor nunca soube ser um? - agora Pierre tinha um sorriso amargo no rosto.

_Eu não sei, Pierre. E também não sei porque você sente tanta raiva dos seus pais. - a insegurança da minha voz era palpável.

_Eles não são meus pais. - Pierre disse friamente com os olhos fixos em mim.

_Eles te adotaram, então é como se fossem.

_Não, não é. E eles não me adotaram, eles me compraram como a porcaria de um boneco. - ele já estava praticamente gritando, o que atraía os olhares curiosos de pessoas que estavam sentados em mesas próximas.

Eram exatas 8:00 horas da manhã. Estávamos em uma cafeteria perto da faculdade onde Pierre estudava. Eu havia marcado um encontro com ele ali.

O lugar era amigável e jovem, decoração suave em tons pastéis e vidraçaria por todos os lados - o que era incrível já que assim poderíamos admirar o mundo lá fora enquanto tomávamos um delicioso café da manhã.

Havia alguns rostos conhecidos da faculdade, mas ninguém parecia me notar. E isso era maravilhoso porque assim eu não precisaria dar explicações de como aqueles hematomas avermelhados apareceram em meu rosto.

_Te compraram? - soltei devagar, tentando não parecer assustada, mas a verdade é que eu estava assustada pra caralho.

_Preciso voltar para a faculdade. Tenho aula prática em vinte minutos. - Pierre disse simplesmente, se levantando para ir embora. Eu segurei seu braço do outro lado da mesa o forçando a me encarar.

Era óbvio que ele estava fugindo daquele assunto e também era óbvio que não era o momento certo de eu insistir naquilo, mas precisava ter certeza de que uma hora retomariamos do ponto em que paramos.

Eu encarei seus grandes olhos cor-de-mel com os meus que tinham tom de avelã.

Eu conseguia ver meu reflexo, mas não enxergava nada além disso.

Pierre estava por trás de um escudo, de uma parede que ele mesmo ergueu entre nós. Então ele estava fugindo ou se preparando para atacar eu jamais saberia.

_Quando vamos nos encontrar novamente? - eu perguntei me dividindo entre seus lábios estupidamente perto dos meus e seus olhos brilhantes.

_Não se preocupe com isso, Hazelzinha. Eu te procuro até lá. - deu um beijo suave nos meus lábios e partiu me deixando a ver navios.

Eu voltei a atenção ao meu café frio me perguntando até quando aquela paixão estaria quente dentro de mim. Porque um café esfria rápido e nossos sentimentos mais rápido ainda.

Era uma segunda-feira e eu já estava condenada a pensar sobre isso por toda a maldita semana porque a verdade é que eu não me sentiria viva até que ele me ligasse.

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