Irmãos de alma

37 5 5
                                    

A ordem foi dada, treino intenso para todos os lobos acima de 16 anos, Hiure ainda não tinha essa idade, mas se esforçava.
Rodolpho: como foi com o seu pai ontem?
Hiure: eu não quero falar disso.
Kaique: qual é? Somos nós.
Hiure: ele é contra minha relação com Maria.
Ryan: mas vocês nem tem uma relação propriamente dita.
Hiure: ele é contra qualquer tipo, me mandou ficar longe dela.
Ryan: tá brincando.
Hiure: não, ele tá cego por causa da guerra deles com o pai dela.
Rodolpho: e o que você fez?
Hiure: bati de frente, óbvio, ele não pode fazer isso.
Ryan: é seu pai, Hiure.
Hiure: pode ser, mas isso tá além de qualquer um, eu decido o que eu faço.
Rodolpho: não é assim, você sabe, depende dele, fora ele ser o Vice, até nós aqui devemos respeito.
Kaique: é, mas aí não é caso de respeito, é mais autoritarismo.
Hiure: exato, eu não vou recuar pra ele, não vou.
Ryan: você fala como se estivesse se referindo a um adversário e não seu pai.
Hiure: a verdade é que eu perdi meu pai.
Kaique: também não é assim.
Hiure: tô falando sério, ele mudou totalmente desde aquele dia do tiro, meu pai era sorridente, brincalhão, víamos filmes e desenhos juntos, mas tudo mudou do dia pra noite, ele se afundou debaixo da figura do Bravo, do Vice Alpha, presidente e tudo mais, não foi só a minha mãe que eu perdi.
Rodolpho: tem que aproveitar enquanto ele está aqui, estamos em guerra, tudo é possível acontecer, a verdade é essa.
Hiure: essa guerra já me tirou um pai, vô branco me deu tudo o que papai deixou de me dar, em vários aspectos ele foi meu pai também, essa guerra já está me devendo.
Ryan: mais um motivo pra treinarmos, vamos?
Hiure: quem vai comigo?
Os dois irmãos do meio se olham, Kaique confirma com a cabeça, apanha a espada e vai na direção do caçula.
Hiure: já faz um bom tempo desde que lutei contra sua espada.
Kaique: verdade, se prepara pra surra.
Ambos avançam, se segurar era proibido, Kaique então solta um golpe frontal, o irmão desvia e solta um direto no rosto do mais velho, este recua um pouco, o mais novo aproveita e corre pra tentar outro golpe, mas Kaique dá um golpe horizontal cortando o peito do irmão que não teve tempo de recuar totalmente, os dois sorriam e avançam, ataque e defesa sendo alternados num instante, o treino marcial contra esgrima, o mais velho golpeia de lado, na altura das costelas do caçula, este segurou seu braço e ambos começam uma disputa de força, estava equilibrada, até que o mais velho recebeu uma cabeçada no nariz e uma rasteira.
Kaique: desgraçado, quebrou meu nariz!!
Hiure: você cura isso, pelo menos não tem um corte de ombro a ombro. Diz estendendo a mão.
O mais velho se levanta e coloca o nariz no lugar de novo.
Kaique: mesmo treinando eu não dou conta de vencer ninguém.
Hiure: para com isso, essa foi por pouco, eu teria perdido na disputa de força.
Kaique: que merda!!! Grita furioso e jogando a espada no chão.
Ryan: se acalma.
Kaique: me acalmar como!? Estamos em guerra e eu não consigo avançar um passo se quer!
Ryan: isso vai vir com o tempo.
Kaique: tempo, tempo, tempo!!! Eu tô cansado de esperar o tempo passar, eu treino com espada desde que chegamos aqui e olha isso, não evoluo e ainda que eu evolua, pra quem eu vou mostrar?
Nessa hora ficou claro o motivo da irritação de Kaique, Victor era seu objetivo de vida, era aquele que Kaique sempre perseguiu e buscou superar, sem sua figura o rapaz se encontra perdido e sem perspectivas de crescer.
Ryan: se revoltar não adianta, não vai trazer ninguém de volta, nós só podemos seguir em frente e fazer o que pudermos por eles.
Kaique: você diz isso da boca pra fora, Marcos também era seu objetivo, nós somos betas e perdemos nossos maiores rivais, nossos motivos pra continuar a crescer, o que vamos fazer agora!?
Rodolpho: vão achar outro motivo, vão treinar com nunca antes, vão  sentir dor, levar porrada, cair e vão levantar, é o que nós fazemos.
Kaique: não somos como vocês.
Rodolpho: nenhum de nós seremos o que somos agora, nós temos um compromisso com essa alcatéia, o Alpha confia em cada um de nós.
Ryan: tá certo, temos que lutar, ficar lamentando não vai nos dar a força que precisamos.
Kaique: então que seja, essa revolta vai virar força, foda-se, vão tudo entrar na faca.
Hiure: na espada. Corrige rindo
O treino termina, os dois do meio vão pra casa e os demais ficam pra arrumar tudo.
Rodolpho: precisamos conversar.
Hiure: diz aí.
Rodolpho: você pega pesado com os dois.
Hiure: como é?
Rodolpho: eles são nossos irmãos, mas são betas, é diferente, é mais difícil pra eles.
Hiure: estávamos treinando.
Rodolpho: por favor, você nem teria levado esse corte se estivesse levando a sério.
Hiure: não vou tratar meus irmão de forma diferente.
Rodolpho: não é tratar diferente, é respeitar a situação deles, respeitar o tempo deles, eu sei que você gosta de competir, mas com eles não tem competição, só tenta lembrar viu?
Hiure: tá certo, mas e você, topa uma luta?
Rodolpho: quer apanhar?
Hiure: você é o único que eu consigo lutar.
Rodolpho: você que pediu.
Os dois se armam, Rodolpho segurava seu bastão voltado para o caçula, este tinha uma guarda totalmente defensiva, conhecia o estilo do mais velho, Rodolpho então ataca, correu enquanto girava o bastão e deu um golpe de baixo para cima, mirando o queixo, mas o antebraço do irmão bloqueou o golpe, Rodolpho então investe vários golpes, mas todos foram bloqueados pelo antebraço ou cotovelo do caçula.
Rodolpho: mas que merda.
Hiure: postura das asas dobradas, uma defesa absoluta, criada pra se usar contra flechas.
Rodolpho: seu pai te ensinou?
Hiure: óbvio que não, ele nem queria que eu focasse no karate, aprendi sozinho, mas tenho que melhorar.
Rodolpho: eu gostei, mas tem um ponto fraco.
Hiure: qual?
Rodolpho: aqui!!
O mais velho põe o bastão estre as duas pernas do mais velho e joga o pé direito dele pra cima o tirando do chão, em seguida atinge as costas do mesmo com um golpe, aquilo o jogou por dois metros de distância.
Hiure: isso doeu.
Rodolpho: vai piorar.
Hiure: você não matou um touro uma vez?
Rodolpho: matei, era enorme.
Hiure: então que seja, me mostre os ataques que fizeram isso.
Rodolpho: você quem pediu.
O mais velho avança feroz, atacava feito um animal selvagem, sem restrições, o caçula mal pôde bloquear, até que viu uma brecha, num movimento rápido ele foi parar atrás do irmão, aplicando uma gravata e prendendo suas pernas na cintura dele.
Hiure: essa foi por pouco, seu flanco esquerdo ainda é um ponto fraco.
Rodolpho: técnica de imobilização?
Hiure: não faz o meu estilo, mas eu vi uma boa lutadora de jiu-jitsu usando, você pesa quase cem quilos e eu pouco mais de sessenta, daqui você não sai.
Rodolpho: quer pagar pra ver?
O mais velho dispara na direção de uma parede, a usa de apoio e salta pra uma altura de três metros, ia cair por cima do caçula, mas este se soltou antes.
Hiure: que absurdo, correr e pular desse jeito.
Rodolpho: ainda quer continuar?
Hiure: já tive o suficiente, estou com várias lesões, valeu o treino.
Na casa dos demais irmãos.
Kaique: temos que dar um jeito nisso.
Ryan: no que?
Kaique: na nossa fraqueza, temos que nos tornar alphas.
Ryan: fala como se fosse fácil.
Kaique: eu sei que não é, mas sem isso nós não iremos longe, a verdade é essa.
Ryan: errado você não está, mas como?
Kaique: alphas devem perder o medo totalmente, só assim evoluem, o primeiro passo é descobrirmos nossos medos e trabalhar neles.
Ryan: isso não vai ser fácil, nem rápido.
Kaique: Hiure saltou de asa-delta pra confrontar o medo, pulou de para-quedas, ficou na beira de prédios, temos que fazer algo assim, extremo.
Ryan: é, mas demorou meses pra isso tudo, temos que primeiro trabalhar nossa mente, depois partimos para o confronto.
Kaique: eu juro que vou conseguir, aqueles parasitas se meteram no meu caminho, vão pagar, na ponta da minha espada, você vai ver.
Ryan: vamos vencer essa, pode ter certeza!
No dia seguinte eles chegam na escola, era uma sexta, o dia foi corrido, Hiure aguardava o primeiro intervalo, quando o sinal bateu ele saiu da sala sem ao menos pedir permissão, se sentou de costas para uma parede de um corredor, do outro lado da parede se sentou Maria.
Hiure: guerra em casa?
Maria: você também?
Hiure: a pior de todas.
Maria: é, a mesma coisa comigo.
Hiure: meu pai me quer longe de você por odiar o seu.
Maria: o mesmo lá, qual foi sua resposta?
Hiure: ele tentou jogar na minha cara que é meu pai, meu mestre e tudo mais.
Maria: e você?
Hiure: eu disse que ele podia ser tudo isso, mas...
Maria: ...não é meu dono.
Hiure: algo assim, quanto a você?
Maria: ele tentou o mesmo, até ameaçou lhe fazer alguma coisa, mas eu não recuei, até mamãe me apoiou.
Hiure: sério?
Maria: ela é a única que faz frente a ele, além de mim.
Hiure: mãe é foda, se a minha estivesse aqui teria feito o mesmo.
Maria: é provável que lobos do Oeste me vigiem de agora em diante.
Hiure: imaginei, seu pai não me pareceu alguém que desiste fácil.
Maria: ele é teimoso, não escuta ninguém.
Hiure: como ficamos? Pergunta se levantando com a mochila de um lado do ombro.
Maria: por hora nós nos distanciamos, só pra eles se acalmarem, não quero provocar uma atitude drástica de nenhum dos lados.
Hiure: meu velho não vai te fazer nada, o negócio dele é comigo.
Maria: não é comigo que eu estou preocupada.
Hiure: uma loba dessa preocupada comigo, apaixonei.
Maria: você nunca fala sério?
Hiure: e você nunca brinca? Nos afastamos então...
Maria: só por um tempo.
Hiure: promete que vai ser só por um tempo? Pergunta caminhando na direção da porta.
Maria: prometo. Responde de frente pra ele na porta.
Hiure: tá certo, um tempo.
Ele segura o queixo dela, a loba o acaricia o rosto e o cabelo, o lobo pega a mão dela beija com carinho e depois a testa dela.
Hiure: se cuida baixinha. Se despede.
Uma tonelada pesou no peito, mas era um peso necessário, ele rangia os dentes e serrava os punhos de raiva e frustração, ele encontra com seus irmãos.
Kaique: tá furioso.
Hiure: esses dois velhos foderam a minha chance com ela.
Rodolpho: ela desistiu?
Hiure: pediu um tempo, até os dois se acalmarem.
Kaique: isso não vai rolar.
Ryan: KAIQUE!!
Kaique: eles se odeiam tem mais de vinte anos, acham que isso vai acabar assim do nada?
Rodolpho: seja como for, estamos com você.
Kaique: isso é, não falei por mal.
Hiure: eu sei, de qualquer forma, no momento minha única preocupação é treinar e mais nada.
Os quatro seguiram como puderam, mas não eram os únicos que estavam se movendo, os novos habitantes também davam seus passos.
Alucard: quantos?
Walter: cinquenta, todos fortes e você?
Alucard: trinta, está ficando difícil recrutar mais, vai ficar estranho se continuarmos.
Walter: conhece outra forma de aumentar nossos números?
Alucard: três pra ser exato.
Walter: aposta nisso?
Alucard: não há outra opção viável, temos que convocar eles o mais rápido possível.
Walter: ainda não, se virem o estado do velho podem tentar alguma coisa, acabariamos com outra guerra, vamos nos concentrar em curar o pai.
Alucard: e você acha isso possível? Você?
Walter: e temos outra opção? Se ele não melhorar nós vamos ter uma guerra interna.
Alucard: eu sou o mais velho, o óbvio é que eu assuma o lugar dele.
Walter: você não tem seguidores, nem vontade pra isso, preguiçoso como você é.
Alucard: é verdade, vamos seguir o seu plano então, mas por onde começaremos?
Walter: tudo está na cabeça dele, é onde devemos trabalhar.
Na antiga fazenda do Pelo Branco estava Vladimir, ainda no quarto, estava na forma híbrida, seu corpo estava num estado deplorável, ele se olhava no espeto, tocando nas marcas deixadas.
Vladimir: velho... fraaaaco... balbucia fraco.
Suas cicatrizes lhe atormentavam, mas não mais do que o fantasma em sua mente, ele ouvia uma voz odiosa para ele.
????: mesmo com todos os seus séculos, todo o poder, você não pôde vencer no fim.
Vladimir: me deixa... em paz. Diz com voz cansada.
????: você começou isso, cavou sua própria cova quando voltou pra cá.
Vladimir: eu só queria...
????: ...vingança, era o que buscava, traiu tudo o que tinha, todos que seguiam você.
Vladimir: isso não era o que eu queria, a morte das minhas crianças não ERA O QUE EU QUERIA!!!!
Álvaro: morte de quem se ama... sei como é, eu tive esposa, meu grande amor, ela morreu nos meus braços...
Vladimir: você destruiu tudo o que eu amava.
Álvaro: nada menos do que você merecia, você lutou contra mim durante anos e com todas as suas forças, seus recursos, seus números, seus poderes e a única vitória que você teve foi uma mentira!!
Vladimir: não...
Álvaro: sua vida não pode ser redimida.
Vladimir: não...
Álvaro: e agora te dou permissão pra morrer...
Vladimir: NÃO!!!!!
Os gritos de agonia do vampiro ecoavam pela fazenda, continuou assim até que seus dois filhos adentraram as terras, iam bater na porta.
Vladimir: podem entrar, estou velho, não surdo.
Alucard: ainda não comeu?
Vladimir: eu peguei uns ratos aqui e ali.
Walter: trouxemos gado e você prefere ratos?
Vladimir: não mereço mais do que isso, na derrota não se ganha recompensas vistosas.
Alucard: mas na vitória sim, as coisas estão melhorando, estamos reabastecendo os números aos poucos.
Vladimir: pra que?
Alucard: é o que fazemos, reproduzimos, sempre foi assim.
Vladimir: não é pra ser mais, podem parar.
Walter: o que?
Vladimir: não ouviu? Mandei parar.
Walter: mas pai...
Vladimir: é ordem minha, Walter, chega de transformados, chega de guerras
Alucard: tá certo, pai, vamos parar.
Walter: então não vamos dominar a cidade, tudo bem, não precisamos disso mesmo.
Os dois iam saindo quando o pai lhes impede.
Vladimir: eu não estou louco, pelo contrário, jamais estive tão certo, o mais irônico é que tive que ficar cego de um olho pra ter uma visão correta do todo, parem a reprodução, já nos vingamos, não precisamos de mais nada.
Os irmãos deixam a fazenda e vão para outra casa, Walter estava furioso.
Alucard: perder o controle não vai resolver nada.
Walter: ser passivo também não!!
Alucard: não há o que ser feito, ordem é ordem.
Walter: e ele está em condições de dar alguma!? Você ouviu os gritos.
Alucard: ele garante que está bem, você ouviu o tom e viu o olhar dele, não eram de um insano, seja lá o que ele tem passado, já acabou.
Walter: parar a reprodução é ilógico, não é natural, isso não tá certo!!
Alucard: certo ou não, são as ordens que temos e devemos obediência, você se lembra o que houve da última vez que desobedeceram ele.
O vampiro se irritava com a situação, mas nada podia ser feito.
Manhã de domingo, na academia do Sul ecoava sons de impacto e urros violentos, Hiure treinava desde antes da alvorada, o suor gotejava no chão, ele toca um saco de pancadas e desfere um golpe com os dedos da mão esticados, como uma lança, aquilo doeu, mas ele não parou, mergulhou em memórias enquanto batia.
Ele se lembra da época em que o pai começou a mudar com ele, também de um dia muito importante com Álvaro em sua fazenda quando o rapaz tinha doze anos.
Álvaro: existem dois tipos de famílias, aquela de sangue, a qual encontramos ao nascermos, mas existe aquela que escolhemos com o decorrer da vida, o sangue pode ou não estar presente nessa, seja como for, essa é a mais importante.
Hiure: nós escolhemos a família?
Álvaro: sim, você entendeu?
Hiure: entendi, vovô...
A primeira vez que ele o chamou de tal forma, logo ele se lembra da perda dessa figura, aquilo o irritou ainda mais, em seguida veio a memória do primeiro encontro dele com Maria, a guerra com seu pai e a recente promessa dela, por fim ele golpeia pela última vez, o saco teve pequenos furos em alguns pontos, mas seus dedos estavam ou quebrados ou deslocados, ele para e vai beber água e tenta realocar os dedos destruídos, até que ele ouve uma voz.
Wellington: sempre reclamou de treinar cedo, mas te encontro aqui, banhado em suor, ofegante e com os dedos quebrados...
Hiure: não foi pelo treino, foi pela válvula de escape.
Wellington: por ela?
Hiure: por tudo, pelo meu avô e tios mortos, por um conflito que está por vir, pela maldita guerra de dois velhos que insistem em manter essa loucura através de dois inocentes.
Wellington: você está mal por um avô "de criação" e uma paixonite adolescente, mas não se compadece com um pai que te cuida e protege há anos.
Hiure: esse avô foi muito mais pai do que você tem sido nos últimos anos!!
Wellington: como você se atreve seu moleque!?
Hiure: é a verdade!! Eu não tinha que me preocupar com treinos ou em atingir metas, eu só pensava em rir, ouvir histórias, ter alguém pra contar as coisas ou pra me ouvir chorar, era disso que eu precisava!! Eu não queria um mestre, só queria meu pai.
Wellington: eu faço o melhor pra você, te preparo, ensino, instruo...
Hiure: proíbe, diminui, critica... acha que era isso que eu preciso, acha que é isso que ela teria me dado!?
Wellington: eu não sou ela, nem posso ser igual.
Hiure: não queria que fosse igual a ela, eu só queria que fosse igual a quem você era quando ela ainda estava aqui, eu só queria aquele pai aqui ainda. Fala se libertando.
O jovem lobo já não continha as lágrimas teimosas e quentes, seu pai assume uma expressão dura e séria, deu as costas e seguiu para sua casa, no caminho ele chora enquanto dirigia, sentia falta de tudo, do amor da esposa, do filho ainda pequeno em seus ombros, saudade de si mesmo quando o sorriso era diário, em sua casa ele se contempla na frente do espelho.
Wellington: outra vez, aqui estamos nós, eu e você, Bravo.
No espelho ele podia ver sua figura em dias de luta, mesmo estando de terno e gravata, via suas marcas, cicatrizes e feridas.
Wellington: um empresário bem sucedido, um título mundial, vice de uma alcatéia incrível, as mãos já bem sujas, como todos os outros, não é?
Se indaga erguendo as mãos, ele podia ver todo o sangue que já havia derramado.
Wellington: mas nenhum deles fica assim, na frente de um espelho fazendo monólogo e dramazinho de adolescente, não!!! Estão todos ocupados fazendo mais, se preparando pra guerra, pra vitória, tudo lobo realizado, não tem um com uma vida tão bagunçada quanto a sua, Bravo, não consigo... eu não consigo, se eu afrouxar o pulso, se eu pegar leve eu vou perder esse filho, meu único filho, tudo que me resta nessa vida, já perdi meu grande amor, mas meu filho eu não perco, isso eu não vou permitir nunca, NUNCA!!! Grita socando e destruindo o espelho.
  A segunda de manhã veio, apesar da briga, o jovem lobo foi treinar, mal falou com o pai, somente o básico, foi para a escola, no semblante estava sua fúria, os irmãos já imaginaram o motivo, viram as mãos feridas dele, imaginaram que ouve briga e como sempre ele descontava com sacos de pancada, paredes ou árvores.
Rodolpho: minha casa depois da escola?
Hiure: não tô com cabeça pra isso.
Kaique: você tá estressado, tem muita coisa acontecendo, vamos.
Hiure: não tô com cabeça, eu vou estragar a noite.
Ryan: para de bobeira, você vai e pronto!
Hiure: vocês são do caralho, tá, eu vou.
Rodolpho: vai avisar o seu pai?
Hiure: quer saber? Foda-se.
Ryan: isso vai dar merda.
Kaique: com certeza, vai ser legal.
Na hora de ir Rodolpho aparece com o cabelo bagunçado, Ryan estava com uma marca de mordida no pescoço, Kaique tinha uma mancha de batom na curva do pescoço que ele tentava esconder com a gola da blusa para cima.
Hiure: tarde trabalhosa? Diz cínico.
Todos respondem rindo e gaguejando.
Eles vão para o treino antes de irem para a casa do irmão, dividiram duas duplas, um alpha com um beta, Rodolpho treinava boxe com Kaique, eles eram os maiores por isso eram parceiros de luta perfeita, Ryan e Hiure treinavam perseguição e rastreamento, eram os mais velozes, Renato treinou eles naquela noite ele os elogiou pelo empenho e evolução dos garotos, mas ele focava muito em Rodolpho, afinal ele era um alpha e o mais velho, seu desempenho era melhor que o dos outros na maioria dos treinamentos.
Já era tarde quando chegam a casa do mais velho, lá Rosana os recebe muito bem como sempre fazia, o pai dele trabalhava embarcado e não estava na casa, eles viram um filme e comeram, logo depois Rodolpho os convida para beber um pouco, Ryan aceita um copo de bebida humana, que era como refrigerante pra lobisomens, Hiure e Kaique negaram no início, mas acabam cedendo e aceitam um pouco de uma bebida sabor limão, a favorita de Rodolpho, eles esvaziaram seis garrafas de um litro, eles arrumam seus lugares pra dormir na sala e conversaram sobre diversas coisas, carros, o curso, garotas, caçadas e tudo que um lobisomem jovem falaria.
Hiure: pensam em fazer algum curso depois?
Kaique: engenharia mecânica, eu acho.
Ryan: engenharia da computação com toda a certeza.
Hiure: que convicção.
Ryan: você não faz idéia.
Kaique: e tu?
Rodolpho: velho... pior que eu nem sei direito.
Ryan: tá brincando!? Você é o mais velho, dê o exemplo seu índio sequelado!!
Rodolpho: me deixa magrelo, eu não sei o que fazer, talvez me casar, ter uma família, ficar na boa.
Kaique: simples, mas muito bom, sossego, amor, tranquilidade...
Rodolpho: principalmente tranquilidade, quero ficar perto do verde, uma mata pra eu correr com meus filhos...
Ryan: bem pacífico, muito diferente da nossa situação atual.
Rodolpho: as coisas vão melhorar, confia.
Kaique: só o nanico que não falou, o que vai fazer?
Hiure: meu pai quer que eu faça administração de empresas, mas eu não tenho certeza.
Kaique: você sempre foi bom com números e cálculos.
Hiure: mas depende do cálculo, sou péssimo em física ou eletricidade.
Ryan: só faça algo se gostar.
Hiure: não é que eu não goste, até já aprendi algumas coisas, mas não me vejo igual ao meu pai, um grande empresário e tudo mais...
Rodolpho: você é o único herdeiro dele, só você pode segurar as rédeas da Construmax.
Hiure: mas eu não pedi por esse peso, eu nunca quis essa responsabilidade.
Ryan: há muitas coisas que não queríamos, mas aqui estamos, Hiure, a vida é assim, não podemos controlar tudo.
Hiure: tá certo, vou pensar melhor, mas mudando de assunto, carros!
Rodolpho: já decidiram um carro pra vocês? Eu quero um corvette 2005, meu coroa disse que vai me dar um, só não sei quando, mas eu amo esse carro.
Hiure: essa porra é quase uma Ferrari.
Kaique: skyline r34, é perfeito, o Alpha disse que nós ganharíamos um carro dependendo do nosso desempenho nos treinos e no curso, eu queria uma BMW, mas ele colocou limite de preço.
Rodolpho: também pudera né, BMW, tá doido, além disso não é lá essas coisas...
Ryan: vocês querem carrinhos de brinquedo, eu pedi um hummer h1 2000, vai ser perfeito para nossas caçadas.
Kaique: verdade, não há terreno que ele. Elogia com gosto.
Ryan: Hiure ainda não disse nada, qual você escolhe Hiure?
Kaique: com certeza vai ser um carro velho que ninguém usa mais. Fala zombando dos irmão.
Hiure: velho não! Clássico, minha escolha é um mustang mach 1 1969 na cor preta ou prata, é lindo, forte e tem presença. Responde exibido.
Ryan: tá, até eu admito que é um carro foda.
Rodolpho: real, eu já vi um, é muito foda... espera, seu pai tem um, não?
Hiure: tem, mas ele nunca usa, tá caindo aos pedaços. Fala um pouco triste.
Kaique: reforma cara, se você curte, vai valer a pena, mas vai dar trabalho.
Hiure: as peças vão ser o mais difícil, tô pensando em dar mais potência, esse modelo não é tão potente quanto outros.
Rodolpho: o quanto de potência?
Hiure: sei lá, o de um mustang atual?
Ryan: e tem como? Não vai modificar demais?
Hiure: umas coisas eu vou ter que adaptar, mas vai ficar o mais fiel possível, colocar um estofado foda, ar condicionado, sistema de som de primeira, rodas ridler 695 aro 18.
Kaique: vai gastar uma grana.
Rodolpho: construtora lembra?
Hiure: eu tenho uns video games novinhos e jogos originais, fora meu PC, devo conseguir uns sete mil.
Ryan: vai vender suas coisas?
Hiure: sacrificar uma coisa pra ter outra, é a vida.
Kaique: pede a grana para o seu pai.
Hiure: não, o carro já é o bastante.
Ryan: tá uma lata velha.
Rodolpho: deixa ele Ryan, cabeça dura pra cacete.
Hiure: não é essa a questão, a questão é o sacrifício, é não ficar recorrendo a papai o tempo todo, tenho que me virar.
Kaique: nisso ele tá certo, vou ver se arrumo alguém pra comprar essas paradas suas.
Hiure: valeu irmão.
O papo se estendeu um pouco mais, logo eles foram dormir. De manhã todos ajudaram a fazer o café da manhã, Kaique fez a mesa, Rodolpho foi comprar o pão e um bolo, Hiure fazia o café e Ryan lavaria a louça, eles comeram e aguardaram Ryan terminar de lavar tudo, se despediram de Rodolpho com um aperto de mão firme e um abraço de irmão.
Era sábado dia de folga, Kaique e Ryan aproveitaram para por tarefas da escola em dia, já o caçula ia mexer um pouco no carro do seu pai, em um mês ele faria 16 e essa é a maioridade dos lobos, com documentos modificados e registros alterados ele seria maior de idade até para os humanos, já estava numa auto escola, era de um lobisomem, eles podiam iniciar aos 15 anos e tiravam carteira aos 16, Hiure era muito bom e estava de olho no velho mustang, em meio a isso seu pai aparece.

Presas e GarrasOnde histórias criam vida. Descubra agora