Capitulo 45 - Marcela

458 39 0
                                    

Abri o olho e me vi numa sala cheia de pessoas gemendo, e varias agulhas em meus braços e o PI PI PI familiar soando aos meus ouvidos. Só que dessa vez, eu é que estava sendo monitorada e não monitorando alguém.

Coloquei a mão imediatamente na barriga, pensando no que podia ter me acontecido, e eu já imaginava, as lagrimas subiam com uma velocidade gigantesca. Eu estava tremendo e pensando no tudo que tinha me acontecido nas ultimas 24h.

- Senhora Marcela?  - Uma mulher negra, alta e muito simpática parou ao meu lado. – Eu sou Dra. Luiza, eu sou a obstetra de plantão. Como se sente?  

Eu olhei para seu sorriso, e uma onde de compaixão imanou de seu olhar. Eu sentia tantas coisas que ela não poderia ter visto nos exames, mas me atentei apenas as que ela podia curar.

- Dolorida... E cansada. Eu... O b-bebê?  Eu... – as lagrimas caíram como riacho, eu tinha algo dentro de mim, que de repente eu queria tanto, e não iria suportar se não estivesse mais lá, eu sei, é loucura, mas ele já fazia parte de mim, era louco, mas era.

- Dra Luiza, tem uma emergência pra senhora, precisamos da sua ajuda na sala de cirurgia quatro... – veio um enfermeiro novinho de verde, antes que ela pudesse me responder.

- Claro. – ela respondeu a ele e voltou a mim – Senhora Marcela, está liberada para receber visitas, pois sei que tem gente desesperada pra te ver aí... – ela voltou ao enfermeiro e continuou – Quero que passe os cuidados a ela e tudo mais, e libere apenas dois visitantes.

- Ok doutora...

A medica saiu, me dando um ultimo sorriso largo e sincero e me deixou com o pequeno enfermeiro, chamado Emerson, que me passava tudo o que tinha acontecido comigo, todos os procedimentos e coisas do tipo que eu sabia o que significavam, me deixando em uma mistura de risos e lagrimas.

Ele me entregou um lencinho, sorrindo gentilmente, me senti tão estranha, geralmente era eu que ficava do outro lado nessas situações, sorrindo, confortando, preparando os pacientes, e esperando os familiares fazerem todas as perguntas, ao esperar que as coisas da vida se ajeitassem, porra nunca pensei que seria eu do deste lado algum dia.

- A senhora está com algum parente?  - ele me perguntou finalmente, me tirando do devaneio.

- Acho que sim, minha... Ami-irmã, Amanda... – falei, sabendo que se não fosse parente, talvez não a deixassem entrar.

- Certo, vou chama-la na recepção. – ele disse virando.

- Emerson... – ele virou -... Se por acaso meu... Namorado estiver lá, gostaria que ele entrasse primeiro.

- Claro, qual o nome dele?  

- Mauricio.

Acho que deve ter passado uma vida inteira até a chegada dele.

Eu estava repassando tudo o que tinha em minha mente. Cada palavra que ia dizer, cada passo que ia dar, nessa hora tão delicada e tensa. Vi a silhueta alta e forte dele parada na porta olhando ao redor, finalmente seu olhar encontrou o meu.

- Marcela... – ele disse e veio na minha direção.

- Oi. – falei sem graça, quase sem voz.

- Eu... Olha me desculpe, eu... – ele disse e vi seu olhar encher de culpa. Era hora de fazer o que era certo.

- Mauricio, preciso te contar uma coisa... – comecei, mas ele se aproximou tomando minha mão, acariciando, num toque firme, quase desesperado, sabia que ele nunca quis chegar nessa situação, nenhum de nós queria isso.

- Eu... Espera Marcela, eu preciso dizer que eu sou... – eu abri a boca pra falar, porque sabia que logo não teria mais forças, mas ele desembestou a soltar as palavras me deixando impotente. – Eu sou um idiota, eu queria voltar no tempo, queria fazer diferente, sabe?  Eu podia ter feito às coisas melhores, mas você sempre me mantinha longe, e nos estávamos sempre brigando, e quando não era isso, estávamos... Bem eu simplesmente não tive escolha... Era uma diversão e quando eu fui ver... Eu... Eu ia te contar sobre a viagem, era algo grande, importante... E tinha que ter feito isso... Eu não... – ele suspirou tão forte que parecia que não respirava há muitos minutos, que e estava de saco cheio de toda aquela situação -... Eu não sabia que estava grávida... Um bebê... Nosso...

Eu comecei a deixar as lágrimas rolarem, porra eu tinha tanta coisa me sufocando. Ele olhou para minha mão com a agulha presa sobre a pele arroxeada, e volto a me olhar, ele estava quase vazio, podia dizer fraco. Sabia que ele estava fazendo o melhor dele pra se desculpar, pra me manter bem, e não me magoar mais com tudo que tinha ficado sabendo, mesmo com as nossas circunstâncias, porém a verdade era que nunca íamos dar certo, éramos previsíveis, pura nitroglicerina. Éramos como uma porra de historia de amor, só que da vida real, não era uma situação como nos livros, a mocinha dispensa o mocinho, e aí pula alguns capítulos, ela vê que ele é o grande amor da sua vida esquece cada palavra e coisa ruim que já tinha visto e tudo fica bem. Merda, eu não estava num livro do Nicholas Sparks, e esse amor não era eterno. Essas brigas, nossas brigas era um flash back do que vivi a minha vida inteira, era uma versão século XXI da minha família, se podia chamar aquilo de família né. Era um sinal claro que não tínhamos futuro independente de como as coisas eram na cama.

- Mauricio... Não... – puxei a mão de seu toque suavemente, aquela era a coisa mais difícil que passava na minha vida, certeza, e a mais certa -... Não tem mais bebê... Não temos nós... Eu perdi, perdi a criança... Você tem uma viajem pela frente e eu a minha vida... Acho que é assim que as coisas tem que ser mesmo.

Minha voz saiu quase como um soluço. Ele fechou os olhos e vi pela primeira vez ele chorar. Puta merda, nunca pensei que o veria derramar uma lagrima. Mas logo ele começou a voltar a ser quem ele era, quem ele tinha sido antes de entrar aqui, antes de eu acreditar em tudo isso.

- Vou te levar de volta pra São Paulo, precisa de remédios ou coisas do tipo, eu me responsabilizo... – sua voz era fria, ele enxugou as lagrimas e cruzou os braços – Eu só posso te perdi desculpa Marcela, quem sabe um dia podemos...

- Mauricio eu, bem, Amanda vai cuidar de mim, então não precisa se preocupar, apenas, vamos deixar como esta, como você disse sem machucar mais ninguém!

Nossos olhares se encontraram e o silêncio ficou nos embalando em pensamentos, quase podia ouvir o tico e o teco deles se debatendo, arranjando uma maneira de sair dali sem que fosse nomeado o babaca total da historia.

- Bem, acho que o seu horário já acabou... – disse o enfermeiro que tinha o trago ate ali –... Vamos?

Ele olhou pra ele e depois pra mim, então se aproximou me dando um beijo demorado na testa e se afastou.

- Se precisar... – começou, mas o interrompi.

- Eu sei. – falei sorrindo fracamente.

Ele saiu e eu fiquei tentando voltar a terra, voltar à lucidez, cacete, nem parecia eu ali, parecia outra pessoa falando e passando por tudo aquilo, e eu estava sentada em um banquinho encostado na minha mente perturbada assistindo todo aquele melodrama.

Mas o que estava feito, estava feito. E eu ia seguir minha vida. Ia voltar a ser a engraçada e livre Marcela. E ele nem ia se lembrar mais de mim depois de que a poeira baixasse. De nós. De nada que pudesse se arrepender.

CONCEDA-ME SEU PRAZEROnde histórias criam vida. Descubra agora