Capítulo 40

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Theo:

A ajuda da doutora Fernanda estava sendo fundamental, duas vezes por semana Raulf e eu íamos nos consultar com ela, a maioria das vezes como casal, mas as vezes em consulta individuais, e em uma dessas consultas ela me deu dicas precisas de como tratar com o problema do Raulf:

_ Theo, você deve compreender que o processo que o Raulf está enfrentando é um conflito, ele quer se relacionar com você, mas ao tocá-lo automaticamente ele associa ao que aconteceu, então você terá que estimular ele de outras maneiras, deve ter muita paciência e muito carinho, ganhar a confiança dele consegue compreender?

_ Eu entendo doutora, mas para mim também não está sendo fácil, ter ele ali do meu lado, querer tocá-lo e ser rejeitado todas as vezes que tentamos algo.

_ Theo, uma pessoa que passa por essa experiência tem a tendência de se bloquear mesmo, há aqueles que nem tocam no assunto com medo, vergonha se sente julgados, e isso faz com que muitos casos entrem na estatística do esquecimento por falta de uma denúncia, mas o trauma é irreversível na vida dessa pessoa, graças a você que tem apoiado o Raulf o quadro dele foi diferente, ele denunciou e está procurando ajuda logo que aconteceu, isso é um avanço gigantesco para que ele fique bem, porém, você deve entender que a cura não é instantânea, ela é gradativa, dia á dia.

_ Eu sei doutora, mas eu queria ajudar mais, eu preciso que ele fique bem entende, o sexo lógico que é importante, mas não é tudo, eu trabalhei muitos anos no clube Essência e se fui para a cama com dois clientes foi muito, não tenho compulsão por sexo, mas com o Raulf é diferente, se eu falar que não quero vou mentir, mas eu compreendo que esse não é o momento, contudo, eu preciso ajudar a ele doutora e não sei como fazer.

_ Esse seu sentimento é normal, você é o companheiro dele e precisa de reciprocidade na hora do carinho, então eu o aconselho a ganhar a confiança, não ir com muita sede ao pote entende, tenta uma carícia hoje, um beijo mais profundo amanhã, e aos poucos avançando passo a passo, eu sei que não é fácil Theo, contudo se avançar o sinal antes dele abrir pode haver uma colisão emocional mais drástico do que já foi causado. Você terá que retirar tijolo a tijolo do muro que ele levantou em torno dele mesmo.

Ficamos em silêncio por dois minutos e ela mudou de assunto:

_ Theo... se por um lado o Raulf está enfrentando um problema, você também enfrenta o seu e eu gostaria de ouvir você falar sobre a filofobia que sente, você está disposto a conversar sobre isso?

_ É mais fácil falar sobre o que aconteceu com o Raulf, falar sobre mim nunca é fácil.

Contei como fui abandonado pela minha mãe, como meu pai se entregou a bebida, como foi a morte dele, minha vida com os meus tios e o Chris, até a entrada do Raulf na minha vida:

_ Eu consegui me abrir doutora, o Raulf quebrou essa minha resistência em acreditar no amor, quando eu conseguir dizer a ele que eu o amava, aconteceu isso e estamos enfrentando essa crise que não fomos os causadores, isso me dá uma raiva tão grande, por que eu sei que ele não é o culpado, mas eu também não sou, o grande culpado é aquele crápula, aquele canalha, vagabundo.

_ Você entende que para ajudar o Raulf precisa ser paciente, mas vamos falar sobre você Theo, o problema do Raulf estamos trabalhando mas também precisamos trabalhar o seu emocional, como você se sente em relação a sua mãe?

_ Aquela mulher nunca foi minha mãe, ela me gerou é bem verdade, mas não pode ser chamada de mãe, a mulher que me deu amor, que me viu crescer foi a minha tia, ela não tinha nenhuma obrigação comigo, ainda assim, ela me amou, me tratou como filho.

_ Theo a sua mãe foi um grande fantasma na sua vida... eu gostaria que você fizesse um exercício comigo, falasse para mim como se estivesse falando para a sua mãe tudo o que sente, você consegue?

Cocei a cabeça, confuso:

_ Você quer que eu fale o que exatamente?

_ Tudo, quero que você me olhe e fale o que sente como se eu fosse a sua mãe, faça perguntas, fale como se sente, como se sentiu quando ela te abandonou, deixa sair tudo o que está aí há anos.

Comecei meio tímido a dizer:

_ Eu quero saber por que você foi embora?

_ Eu não sei te responder isso meu filho.

_ Você não tem esse direito, você perdeu o direito de me chamar de filho no dia em que me deixou.

_ Me perdoa Theo.

_ Não, eu não acho que mereça perdão, uma mãe que abandona o filho não merece perdão, você nunca se perguntou como eu me sentia com a sua ausência, você nunca se preocupou com o que eu estava pensando ou sentindo, então que direito você tem de ser chamada de mãe... Não, mãe é aquela que cria, que está junto todos os dias amando, ensinando, sendo exemplo, que exemplo eu pude aprender com você, nenhum, a não ser que quando se tem um problema temos que fugir dele, abandonar sem olhar para trás, nada justifica o que você fez, então não me venha com essa de perdão.

_ Mas eu estou arrependida meu filho.

_ Um pouco tarde você não acha, sabe quantas vezes eu chorei durante a noite precisando de um beijo seu, precisando que minha mãe estivesse ao meu lado e você não estava, não estava por que preferiu ir embora com outro homem, preferiu abandonar a sua família para ir embora com outro homem que eu não sei quem é, que espécie de mãe você quer que eu ache que é?

Sem perceber eu havia alterado o tom da minha voz e as lágrimas escorriam livremente por minha face, quando o silêncio rompeu após a minha fala, eu enxuguei o meu rosto me sentindo incomodado:

_ Desculpa doutora, eu não queria gritar.

_ Não tem problema Theo, sente-se melhor?

Movi a cabeça lentamente:

_ Eu nunca falei isso dessa forma com ninguém, sempre que falava da mulher que me trouxe ao mundo, sempre procurei moderar nas palavras, mas hoje foi como se eu estivesse falando exatamente com ela tudo o que eu sentia, é estranho.

_ Vamos trabalhar mais sobre isso, eu torço para que você e o Raulf, encontre o equilíbrio na relação de vocês e conto com a colaboração de ambos para que eu possa os ajudar. 

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