12. May

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17 DIAS ANTES DOS CRIMES

04/02/17 - sábado, 6h00

Quando May chegou em casa, na noite anterior, após a conversa às escondidas junto ao seu futuro autor, mandou goela abaixo a dupla: ansiolítico e antidepressivo.

Norberto pareceu notar a agitação dela naquela noite, então, como o ótimo marido que era e, sem ela precisar dizer nada, ele também largou seus afazeres de home office e se preparou dormir, acompanhando-a. Os dois deitaram-se na cama como de costume, lado a lado, porém, não existiu diálogo.

Resultado: antes de ser dominada por completo pelos remédios, May pulou da cama porque o desespero a obrigava a bolar um plano, e tinha que ser já!

─ Ei, o que houve, querida? Vim ficar aqui juntinho de você...

─ Preciso... É... Preparação de um original...

Ele franziu a testa, e disse:

─ Tem certeza de que está em condições de continuar trabalhando? ─ Foi ignorado. Ela simplesmente foi até o escritório. ─ Ok, só tome cuidado para não dormir com a testa no teclado.

Norberto permaneceu no quarto sozinho durante todo o tempo em que ela navegou, em tempo recorde, por diversos sites que comercializavam apetrechos de espionagem. Passados trinta minutos, ela ainda insistia nas maravilhas do mundo espião amador, no entanto, apagou por uns cinco segundos diante da tela. Se soubesse que o negócio seria tão interessante, ela não teria tomado seus remédios fortes para apagar. Tinha que parar, pois estava correndo o risco de ser flagrada nas pesquisas em guias anônimas. A parte boa de estar dopada era que de certa forma se livraria mais cedo de Norberto também. Portanto, encerrou a pesquisa e foi cambaleante ao quarto. Desabou-se na cama. Sonhou com microcâmeras e prostitutas fodendo com Norberto.

Na manhã seguinte, dia 04 de fevereiro de 2017, por um milagre, acordou muito mais cedo do que previra. Preparava o café-da-manhã para seu marido exemplar. O sol entrava pela janela e iluminava seu rosto. Pensamento do dia: Determinação. Determinação em acabar com a raça do marido. Ela sorriu de volta para o sol feito uma louca no princípio do delírio.

Norberto estava tomando banho enquanto May abria a geladeira e pegava os frios e um tomate. Faria o sanduíche favorito dele com um toque impregnativo de orégano. Ele saiu da suíte e apareceu de calça, sem camisa, exalando o perfume característico de loção pós-barba. O Grey Particular dela. Até o jeito de ele caminhar era provocativo, mas acabava aí. As transas matinais antes do trabalho haviam sido canceladas há anos. Agora o sexo acontecia uma vez na semana e já bastava. A pergunta era: Já bastava para quem?

— Bom dia, amor — disse ele, aproximando-se dela e beijando sua nuca.

— Bom dia. Estou fazendo um bauru para você.

— Delícia. Estou faminto — revelou ele. — Vou terminar de me vestir.

— Tudo bem. O café está quase pronto.

Ele saiu da cozinha, deixando-a à sós com os pensamentos desorganizados dela. Logo depois, já sentados à mesa, quebrando o jejum e o silêncio, Norberto perguntou:

— Teve pesadelos?

— Não, por quê? — Ela fitou o sanduíche em suas mãos evitando contato visual com o marido.

— Você se mexeu muito. Estava inquieta, mas eu não quis acordá-la. Depois apagou de vez.

— Vai ver era ansiedade — disse May. — Ficarei sem você por dois dias.

Como escrever, matar e publicar [Vencedor do Wattys2020]Onde histórias criam vida. Descubra agora