Do outro lado da rede *Kagehina*

~24~

Tobio Kageyama...

Sinto o aroma do chá de hortelã ficar cada vez mais evidente, preenchendo o ar de toda a casa, talvez o aroma tenha se espalhado com mais facilidade, pois a única saída de ar é a janela da escrivaninha, que fica relativamente distante da cozinha.
   
Já passa das onze da noite e eu ainda estou sem sono, fiquei o sábado inteiro fazendo as atividades que foram passadas em aula e revisando a matéria, já que agora a possibilidade de uma bolsa de estudos por esporte está fora de questão, eu preciso me esforçar na matéria didática se ainda quiser fazer uma faculdade.
   
Levanto da cama e vou a passos lentos até a cozinha, o chá está fervendo na pequena chaleira no fogão, e o som que anuncia o preparo está irritante. Desligo o fogo e estico minha mão para pegar o bule, com o auxílio de um coador eu passo o chá e coloco as coisas utilizadas na pia. Despejo um pouco do chá fervente em uma xícara antes de passar pela sala em direção ao quarto. Paro na porta do mesmo e encaro a cama por alguns segundos, decidindo por fim ir até a escrivaninha.
    
Puxo a cadeira e sento na mesma, ligo a lanterna para leitura, e posicionou o chá próximo da mesma. Uma leve brisa do vento faz as cortinas dançarem na minha frente, e um certo refresco percorrer meu corpo.
   
Abro o computador e logo aparece a página que deixei aberta, é a rede social da escola, eu estava tentando buscar vídeos de competições passadas, para ver a evolução do Hinata. Se eu realmente quero ajudá-lo, preciso estar apto para isso, estudar jogadas que mais combinam com ele e que possam explorar mais amplamente os pontos fortes em sua habilidade, além de estudar seu estilo de jogo e as coisas que ele está mais propenso a fazer.
   
Depois de rolar muito para baixo, finalmente encontro alguns vídeos de partidas do regional do ano passado. Suspiro fundo antes de clicar em um. Sem tirar os olhos da tela pego a xícara e sinto o calor em minhas mãos através da alça de porcelana, me lembrando que talvez ele ainda esteja quente demais para simplesmente tomar, passo a assoprar o chá antes de levar o mesmo até meus lábios.
   
O que estou assistindo é a primeira partida que a Karasuno participou ano passado, claro, sem contar os amistosos que não são disponibilizados em vídeo como as partidas oficiais. Passando poucos minutos de jogo eu posso perceber que de modo geral, todos têm grande quimica em quadra, isso possibilita jogadas incríveis que tem uma boa taxa de sucesso. Como o ataque sincronizado, que impossibilita o time adversário de saber quem realmente vai fazer o corte na bola, isso causa uma falha no bloqueio e permite que pontuem.
    
O Hinata por um lado, é muito focado. Se movimenta na mesma direção que a bola, e mesmo sem ter uma plena visão de seu rosto, sei que seus olhos estão fixados em cada movimento feito durante a partida. Quando ele vai atacar, não pensa em nada além de pontuar, ele se joga com facilidade, sem sentir medo de cair ou qualquer outra coisa, ele se lança em direção a rede, com um salto de tirar o fôlego ele pontua. Se eu tivesse piscado, certamente teria perdido a jogada, mas o olhando neste momento, é impossível me distrair com o mundo ao meu redor.
- Lindo- as palavras saem de meus labios como se tivessem vida própria. No mesmo instante desvio o olhar da tela e sinto a ponta das minhas orelhas ficarem vermelhas - A jogada é linda claro, não o ... Hinata- pego a xícara nas minhas mãos e abro um meio sorriso.

Não é como se eu achasse que ele é lindo enquanto joga, obviamente eu admiro suas habilidades e a jogada, não tem nada relacionado com a pessoas que as realiza...
  
Por que eu estou justificando para mim mesmo as coisas que eu disse? Balanço a cabeça em negação.
- Eu tenho que parar de falar comigo mesmo - sussurro enquanto volto a prestar atenção na tela do computador.
    
A medida que o tempo foi passando, o número de xícaras de chá consumidas também aumentaram. Peguei um pequeno caderno e uma caneta e passei a anotar os pontos que eu observava nos jogos, sem me deixar distrair pela pequena tempestade alaranjada. Pesquisei alguns exercícios que posso usar com ele e métodos, além de buscar no arsenal da minha mente melhores jogadas que podem se aplicar a ele.
   
Fiquei tanto tempo absorvido nisso que nem me dei conta das horas que passavam, e realmente não me importava.
  
Meus dedos já estão doloridos depois de tanto escrever, um bocejo escapa de meus lábios e quando levanto um pouco o rosto, um raio de sol quase me cega, fecho os olhos no mesmo momento tentando escapar da claridade. Já amanheceu? Um outro bocejo se faz presente.
- Preciso dormir - me levanto da escrivaninha em um estado meio vivo, e apenas puxo as cortinas para evitar que o sol entre no cômodo, desligo a lanterna de leitura e nem mesmo me lembro de desligar o computador, antes de me arrastar até a cama. Tiro a blusa, e me jogo na mesma, puxando as cobertas para que cubram a minha perna.
    
Meus cabelos estão jogados em meu rosto, mas meus olhos se recusam a abrir e nem mesmo me dou o trabalho de tirar os fios dali.  Abro levemente os lábios e sinto o sono chegando cada vez mais.
   
Eu não sei quanto tempo se passou até que eu realmente conseguisse dormir, eu só sei que minha mente estava preenchida por um doce e largo sorriso, perfeitamente alinhado, que parecia brilhar como as estrelas. Seus cabelos desorganizados revelavam um brilho esplendoroso, como o pôr do sol de um dia especificamente quente, quando o mundo é coberto por um tom alaranjado de tirar o fôlego. Ao vê-lo tão claramente em minha mente, noto que seus olhos se cerram com o sorriso e pequenas linhas se formam embaixo do mesmo... sinto meu coração acelerar... ele é simplesmente adorável.
   
Eu já não sei se estou sonhando ou divagando em um estado quase desperto, eu só sei que eu não quero estar lúcido nesse momento...