SEIS

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Raziel escorregou pelo estofado liso da cadeira em que estava sentado e aterrissou no chão de um jeito abrupto, quase caindo.
Ele realmente não conseguia entender como aquele amontoado de pele, ossos, articulações, músculos e membros era tão difícil assim de manejar, principalmente porque já viu os humanos milhares de vezes, então não deveria ser tão complicado equilibrar-se nas pernas sem ter as asas presas às costas para sustentá-lo.

─ Irmã. ─ Balbuciou lentamente testando a voz. Uma voz que, na verdade, não tinha nada a ver com sua voz normal, especialmente por se tratar de uma voz infantil. ─ Precisamos conversar.

Karol quase quis deixar um grito fino escapar pela garganta, mas ordenou a si mesma que se controlasse e que agisse de uma maneira não tão escandalosa, visto que toda aquela situação parecia completamente bizarra.

Em sua cabeça não existia a mais remota explicação que a fizesse compreender o motivo pelo qual o irmão estava dentro daquele corpo de criança.

Raziel já não era um menino há muitos e muitos e muitos e muitos anos.

─ Eu não sabia que tinha um irmão tão pequeno, senhorita Sevilla. ─ A diretora disse.

─ Pois bem, nem eu.

─ Como disse?

─ Hã? ─ Karol guinchou voltando a si. A menina se forçou a sorrir, apesar de que seu rosto estava relativamente congelado numa expressão de susto. ─ Eu disse... Eu quis dizer que o meu... Que ele ─ Apontou para o garotinho. ─ É tão esperto que eu até me esqueço que... Que ele não é um adulto de cento e tantos anos. Que coisa, não acha?!

─ Perdão, mas eu não sei se entendi direito. É que...

─ Diretora, por favor, será que eu posso falar com o meu... Irmão... A sós? É rapidinho. Prometo.

Raziel olhou de uma para a outra e se perguntou o motivo pelo qual a irmã precisava da autorização daquela mulher para que conversassem, entretanto guardou esse questionamento para depois, principalmente porque a senhora gentil que o recebeu concedeu a permissão para que ambos conversassem no pátio do colégio.

Apesar de ter frisado que eram apenas "dez minutos!" de conversa e nada mais.

─ É mais fácil voar com uma asa só do que descer esse negócio. ─ O anjo reclamava a cada degrau que descia. ─ Isso é realmente seguro? Olha como é alto! Será que se eu pular daqui, bem daqui mesmo, eu alcanço o chão lá embaixo mais rápido? Talvez se pudéssemos...

─ Raziel, cala a boca! ─ Karol guinchou por entre os dentes e uniu as mãos numa súplica desesperada, parando no degrau de baixo. ─ Você precisa me explicar agora o que aconteceu. Porque está com esse corpo? Qual o sentido disso? Não estou entendendo nada!

O menino agarrou o corrimão com mais força, fechando os pequenos dedinhos em volta da madeira escura, tentando não se desequilibrar.

─ É uma longa história, minha irmã. Mas resumindo, o nosso Pai descobriu o que eu fiz e, como um castigo, ele me mandou para cá para que eu te ajude a terminar isso tudo mais rápido e sem nenhum dano. Caso contrário...

─ Caso contrário o quê?

─ Bom... Então...

─ Raziel, fala!

Ele mordeu o lábio inferior e fez uma careta ao perceber que aquilo doía.

─ Tá bom. É que o Pai não gostou nem um pouquinho do que eu fiz e muito menos por eu ter metido você e o Muriel nessa história toda. E agora Ele disse que é obrigação nossa consertar toda essa situação e juntar o casal, claro. Afinal foi por causa disso que tudo começou. E se nós dois não conseguirmos, nem você volta para casa e nem eu.

A Marca dos AnjosOnde histórias criam vida. Descubra agora