QUARENTA E OITO

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ALGUM TEMPO ATRÁS...

Ruggero mal havia passado pelo portão de casa quando ouviu as tosses de Bruno. O garoto parou perto da porta e puxou o ar, munindo-se de paciência para enfrentar mais um momento de bebedeira do pai.

Odiando-o ou não, o rapaz sabia que não podia deixá-lo, virar as costas e ir embora.

Por isso, entrou em casa, parando perto do sofá.

─ Outro porre? Mas que inferno. ─ Murmurou reconhecendo o cheiro pavoroso de álcool no ar. ─ Será que você nunca vai parar? Cada vez que bebe volta pior.

Bruno sacudiu a mão no ar e se sentou, tombando um pouco para o lado.

─ Eu nunca mais...

─ Nunca mais vai beber? É, eu já ouvi isso antes, Bruno. Se poupe de me dizer isso de novo, por favor.

─ Mas eu não queria! ─ O pai ralhou, tentando ficar de pé, mas falhando. ─ Eu disse que ia parar e eu ia! Mas o... Eu senti tanta vontade... Dessa vez eu ia mais devagar, mas tinha uma voz na minha cabeça... E... E eu não conseguia parar de...

─ Essa é a sua nova desculpa? Sério isso? Vai colocar a culpa da sua bebedeira nas vozes da sua cabeça? Ah Bruno, pelo amor de Deus! Eu não sou idiota. Estou cheio das suas desculpas esfarrapadas, das suas mentiras e do seu maldito vício!

Desesperado para alcançar o filho que já ia adentrando no corredor que levava ao quarto, Bruno se levantou e deu alguns passos trôpegos, contudo a sua visão embaçada e a cabeça que não parava de girar o fizeram titubear e quase cair.

Por sorte, ele conseguiu se apoiar na parede.

─ Não foi culpa minha... Eu ia parar...

─ Ia parar uma porra! ─ Ruggero explodiu, virando-se para encará-lo. ─ Você promete isso sempre e no dia seguinte chega nesse estado aqui.

─ Mas acontece que a voz... ─ E desatou a tossir, cobrindo a boca com a mão.

─ Voz! ─ Ruggero zombou. ─ A voz é o seu vício se alimentando cada vez mais das suas fraquezas, isso sim!

Bruno quis retrucar para se defender, mas não conseguiu.

A tosse aumentou ainda mais e ao afastar a palma da mão da boca, notou uma pequena, mas muito vívida, poça de sangue que jorrou de sua garganta entre as tossidas.

Desesperado, cambaleou, deixando que o líquido avermelhado pingasse contra o piso.

─ San-sangue... Ruggero! Ruggero!

─ Ah vai pro inferno, Bruno! ─ O rapaz guinchou entrando no quarto, largando por lá a mochila que trazia nas costas.

Estava farto daquilo. Todo o dia era a mesma coisa.

Entretanto, quando estava prestes a enfiar os fones no ouvido e ignorar o pai, ouviu um baque estrondoso e hesitou.

Apesar de tudo, não pôde deixar de se preocupar.

E entre resmungos, Ruggero voltou para o corredor, encontrando o pai caído, ainda tossindo muito, mas desta vez filetes de sangue escorriam por sua boca, misturando-se a barba, escorrendo pelo pescoço.

O pânico do rapaz foi instantâneo.

Sem conseguir arrancar uma palavra lúcida de Bruno, Ruggero se apressou em levantá-lo, implorando por uma força que já nem tinha mais para que conseguisse ajudar o pai apesar dos pesares.

A Marca dos AnjosOnde histórias criam vida. Descubra agora