DEZOITO

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Os resquícios do beijo ainda permaneciam nos lábios de Karol. Tão próximo quanto estavam ela podia perfeitamente recobrar do momento em que suas bocas se pertenceram e nada mais veio a importar.

No entanto, recuou, tirando as mãos do rapaz de sua cintura.

─ O que está fazendo aqui, Ruggero? O que quer comigo, pelo amor de Deus? Você precisa... Ficar longe de mim.

─ Primeiramente que eu estou trabalhando aqui...

─ Pois então volte a trabalhar.

─... Em segundo lugar, como eu posso ficar longe de você depois do que aconteceu hoje na velha igreja? Karol, aquilo que rolou...

─ Fala baixo! ─ A menina resmungou, empurrando-o para frente e indo junto, para que Pietro não pudesse ouvi-los, apesar da música alta. ─ Por favor, Ruggero. Por tudo o que é mais sagrado pra você... Esquece. Esquece aquele beijo.

Contrariado, o garoto pousou as mãos na cintura, fitando-a.

─ Como assim esquecer? Ei, olha no meu rosto. Porque está me evitando assim? Eu sei que agi de um jeito esquisito e que disse coisas que... Caramba, eu sei que foi estranho. Mas não vai se repetir. Eu juro. Eu juro que foi só uma dor de cabeça e... Por favor, não ache que eu sou maluco.

Karol soltou o ar com força e depois abanou a cabeça, forçando-se a olhá-lo nos olhos, por mais que fazer isso a deixasse ligeiramente desorientada, quase como se pudesse perder o fio da razão.

─ Eu jamais acharia que você é maluco.

Ele riu, esperançoso.

─ E então? Talvez nós possamos, não sei, quem sabe retomar o que começamos lá. Porque eu não parei de pensar naquele beijo, Karol. Até tentei, mas não consegui esquecer.

─ Não, Ruggero! Não, para. Por favor. ─ Desvencilhando-se das mãos dele que teimavam em tocá-la, Karol recuou alguns passos, esbarrando em uma e outra pessoa. ─ Eu estou implorando que se esqueça daquilo. Não pode voltar a acontecer.

─ Mas por que não? Só me diz isso. Me explica o que se quebrou entre nós desde o momento do beijo até agora, porque eu não entendi.

─ Nada se quebrou! ─ Guinchou exasperada. Mas era exasperada consigo mesma, pois queria ser mais forte e não conseguia. ─ O que eu quero dizer é que nada se quebrou, pois sequer chegou a existir. Foi só um beijo, Ruggero, pelo amor de Deus! Já foi. Já passou.

Um sorriso fraco escapou dos lábios dele.

─ Eu não entendo você...

Encararam-se por alguns segundos como se nada mais existisse, porém, por mais que os dois estivessem alheios à realidade, ela ainda continuava existindo. E, a poucos metros distantes, Pietro os observava com uma sobrancelha arqueada, bebericando a bebida que havia pedido, sem entender se via realmente a cena ou se era delírio, afinal sempre se embebedava fácil.

O que o rapaz não assimilava era que ligação Karol tinha com Ruggero para conversarem tão intimamente. Era certo que a menina o havia salvado do afogamento, mas desde quando se tornaram tão íntimos? – Pietro se perguntava internamente.

E à medida que a música parecia ficar mais alta e envolvente, as pessoas em volta iam se misturando mais, movendo os corpos alucinadamente, entorpecidos pelas bebidas, cigarros e drogas, como se não houvesse amanhã.

E Pietro até tentou digerir a situação numa boa, mas seus olhos atentos captaram brevemente uma cabeça loira que adentrou ao subsolo com ares de dúvida, sem saber muito bem para onde ir por causa da iluminação precária.

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