CAPÍTULO 11

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A viagem até Koli, de carroça, deu a Örion a oportunidade de conhecer uma nova faceta de Condarillo. Os cavalos foram amarrados à carroça, seguindo-a, enquanto todos viajavam no interior. Con retirou de suas posses uma pequena sacola com ferramentas para esculpir madeira macia. Ele explicou a Örion que não faria o acabamento das pequenas esculturas de madeira, pois a carroça balançava muito. Com habilidade e rapidez o rapaz dava forma a pequenos blocos de madeira que trazia numa sacola. Junto com estes, o silfo pode ver algumas das peças prontas produzidas.

- São muito bonitas e precisas - comentou Örion examinando as pequenas esculturas na palma da mão.

- Obrigado. É apenas um passatempo.

- Por que não trabalha como escultor?

- Seria uma vida muito monótona.

- Acho que entendo o que quer dizer - refletiu o jovem silfo. - Acho que estou aqui pelo mesmo motivo.

Con lambeu o lábio superior e franziu a testa - Meu avô dizia que a natureza dos viajantes, guerreiros e demais errantes é como uma força que vem de dentro. Este ímpeto não pode ser negado, de outra forma, faria o homem infeliz.

- Seu avô devia ser sábio.

Con parou de esculpir e fixou um olhar vago em direção à paisagem. - Ele era um homem incrível.

Örion parou por um momento, pensando no próprio avô e mergulhou em seus pensamentos. Tantas experiências deixavam-no intrigado. De todos acompanhantes de seu amigo Rílkare, achava Condarillo o mais inteligente, mas ao mesmo tempo, misterioso. Suas ideias sobre uma conspiração de bruxos aldancarianos não lhe pareciam corretas. Tinha a forte sensação de que tratava-se de algo mais sinistro. Esses raptos não pareciam configurar algum tipo de intriga política entre os reinos.

Logo o dia caiu. Chegar em Koli, em especial, conduzindo a carroça recém adquirida foi um desafio e tanto. Estavam cansados e procuraram alojamento em uma taverna sossegada no alto de uma colina onde ventava violentamente. O céu estava nublado colorido por um violeta profundo. Uma tempestade estava a caminho.

Durante aquela noite, o jovem silfo não conseguiu dormir bem. Acordou diversas vezes e teve pesadelos. Tinha um mau pressentimento sobre aquele lugar. Na alta madrugada, a tempestade finalmente veio e de algum modo ajudou Örion a cair no sono.

Pela manhã, ainda chovia forte e Örion despertou com um pouco de dor de cabeça. Eskallurè e Poul também se queixaram de dor de cabeça durante o desjejum, porém a causa era outra: muito vinho na noite anterior. Bebedeiras repetitivas acentuavam o mau humor do mercenário. Para manter o costume, ele provocou Örion diversas vezes demandando, no fim, a intervenção de Rílkare.

Örion seguia os conselhos de Con e, aos poucos, se imunizava contra a acidez do mercenário. Com o mau tempo, permaneceram durante o restante da manhã na estalagem. Conforme o cansaço tomou conta do mercenário, deixou a mesa para juntar-se a Poul num jogo de dados no canto do salão da estalagem. Ficaram na grande e pesada mesa de madeira: Rílkare, Con e Örion. Eskallurè vencia Poul com facilidade, mas antes que o tédio aflorasse, duas figuras encharcadas e encapuzadas adentraram no salão do estabelecimento. Ambos eram altos e tinham os pesados mantos marrons escurecidos pela água da chuva.

Örion sentiu um nó na garganta e frio na barriga que não soube explicar. Os dois sujeitos pingavam muita água deixando pegadas molhadas no assoalho de madeira que rangia com a peso de seus corpos. Logo ficou evidente que sob os mantos e capuzes havia peças de armadura pesada. O mais magro aproximou-se de Rílkare como se já o conhecesse.

O homem o encarou. Rílkare, surpreso, fez menção a movimentar-se. O estranho sinalizou e pediu imediatamente.

- Por favor, não.

Rílkare engoliu seco e ficou sem saber qual ação tomar. Não era outro senão o próprio príncipe Kel, um dos herdeiros ao trono, diante de seus olhos.

Kel assentou-se e disse - Imaginei que fosse você. Sua chegada já era esperada, mas não devemos criar alarme. Portanto, sem formalidades e sem nada de mencionar questões de nossa nobre linhagem.

Enquanto o nobre falava, Örion observava-o com cuidado. Tinha longos cabelos negros escondidos sob o capuz. Sua pele era alva e lisa. Seus olhos negros eram grandes e expressivos, com leves rugas visíveis em seu entorno. Os lábios eram finos e rosados e teria uma aparência feminina não fosse o formato sólido de seu nariz.

- É claro Alte.. digo, senhor - Retrucou o jovem filho do barão, um tanto intranquilo.

O acompanhante do príncipe ficou de pé e observou a reação de Eskallurè e Poul na mesa mais afastada. O mercenário fez menção levantar-se para verificar o que acontecia, mas Con logo sinalizou para que ficasse por lá. Eskallurè deu com os ombros e voltou a conversar com Poul.

- Não vou me demorar - anunciou o príncipe. - Estou contente que tenha vindo. Ocorre que estou muito preocupado com o bem estar de meu irmão mais velho. Ele veio para a região e meus esforços para dissuadi-lo têm sido em vão.

- Não compreendo senhor - disse Krenov. Ao mesmo tempo, Con escutava o relato do príncipe Kel com total atenção. O príncipe falava muito bem e com firmeza.

- Ele está convencido de que estou de alguma forma atrapalhando as investigações. Não confia em mim e veio até aqui para resolver a questão dos desaparecimentos. O fato é que foi verificada a presença de um grupo de aldancarianos na região. Segundo o que penso, eles não estão envolvidos de forma alguma com os desaparecimentos. O preconceito de muitos, inclusive de meu irmão, porém indica o contrário. Temo que um embate infeliz possa vir a ocorrer. Porém, sei bem do respeito que ele nutre por seu pai. Eis o que quero que faça: vá até meu irmão, diga que veio por pedido de seu pai e tente dissuadi-lo desta busca infeliz.

- O senhor acha que os aldancarianos ofereçam perigo? Diz-se que os desaparecimentos seriam obra de bruxos de lá.

- Preconceito. Meus espiões reportam justamente o contrário. Houve desaparecimentos também em Aldancara. E os aldancarianos também desconfiam de nós como causadores do mesmo mal. Já disse isso a meu irmão, mas ele não crê. Acredita que estaríamos sendo enganados. Os espiões teriam sido enfeitiçados, ou mesmo mudado de lado. Quer capturar alguns aldancarianos e submetê-los a interrogatórios e torturas para que revelem o paradeiro das mulheres desaparecidas.

- Suas colocações são muito sensatas. Faremos o possível para dissuadir o príncipe Luvik.

- Sei que irão. E conto com seu sucesso nesta empreitada. E mais uma questão: em seguida, gostaria de contar com seu apoio e de seus acompanhantes, em especial, seu apoio - dirigiu-se a Örion.

O jovem silfo suava um pouco e sentia-se desconfortável na presença do príncipe. - Eu? Mas...

- Sim. Consegui reunir algumas evidências obscuras e misteriosas e imagino que alguém com seus talentos possa nos ajudar a desvendá-las.

Con criou coragem para falar. - Senhor, essas informações mudam as coisas. De fato, tal curso de ação poderia levar a um desastre.

- Sim rapaz, é por isso que devemos deixar de lado, por hora, os desaparecimentos. É imperativo que partam de imediato. Ele os conduzirá até meu irmão, mais ao norte.

O príncipe levantou-se e cumprimentou com um aperto de mãos apenas Rílkare. Acenou para os demais, saiu da estalagem, tomou sua montaria e desapareceu na chuva forte.

Rílkare observou-o desaparecer e voltou-se para o interior. Convocou os companheiros - Vamos amigos! Os negócios nos esperam. É hora de enfrentarmos esta tempestade.

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