CAPÍTULO 38

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Lacoresh, o arquipélago dos silfos, Dacs, Tchilla e os dias difíceis nas planícies quentes e inóspitas do baixo vale haviam ficado para trás. Kyle usava o cabelo curto e espetado. Agora sua aparência era bem melhor graças ao corte feito por Kiorina. O vale abaixo estava especialmente verde e bonito visto da trilha que faziam com os lagartos por entre as montanhas daquela vasta cordilheira. O clima no alto era mais fresco, mesmo com o céu aberto e bastante sol. Ao fim do dia, o sol tingia de vermelho as montanhas e seus picos gelados, ainda distantes.

Há um dia, caminhavam numa trilha estreita, em muito pontos beirando altos abismos rochosos. Não era um trilha natural, mas o que restou de uma antiga estrada que parecia abandonada há muitos séculos, talvez, milênios. Em alguns pontos do caminho havia marcos esculpidos nas rochas em baixo relevo e muito desgastados com desenhos e inscrições de línguas antigas e esquecidas. Mesmo Kiorina, que estudou um pouco sobre povos antigos, não se lembrava de ter visto tais padrões anteriormente.

Naquele fim de tarde, encontraram um marco que chamou a atenção do grupo. Era uma pedra de ponta triangular da altura de dois homens com um grandioso lagarto entalhado e circundado de inscrições. A seus pés, figuras pequeninas em adoração, esculpidas com traços simples.

Gorum observou por uns instantes e disse a Azus - Seu parente, azulão?

O lagarto parou diante da pedra e permaneceu imóvel como uma estátua por alguns instantes. Sempre que fazia aquilo, Kyle sentia-se incomodado. Era como se por algum tempo, a criatura morresse, para subitamente retornar à vida. Finalmente falou - Gzzande Kutz.

- Kutz?

- Essas marcas foram feitas por seu povo, Azus? - indagou Kiorina.

Azus permaneceu em silêncio. Seus companheiros, no entanto, não pareciam interessados naquilo.

- E então, azulão? - insistiu Gorum.

- Muitoss tempoz... Meu povo veio. Adjuda contza inimigo de abisshmoz. Meu povo, amigo ezzfoz, amigo hozzmoz. Gzande Kutz, acabado. Meu povo, não maiss vez casa.

- Será que ele está falando da antiga guerra? -indagou Kyle.

Kiorina assentiu - acho que sim.

- Vamos! Minha casa zzá! - apontou o reptante. - Depois de vazze encontzaa a Voz.

Dois dias depois, o baixo vale já não podia ser visto. A trilha entre as montanhas era comprida e fria, mas ao menos era segura. Conversando com Azus, descobriram que seu povo sempre utilizava este caminho para descer ao vale e caçar. Há muito tempo que reptantes e humanos não conviviam bem, e os líderes reptantes seguiram a Voz para um vale no interior da extensa cordilheira que separava o vale de Tchilla do vale do Imperador Keldor.

A diversão de Gorum naqueles dias mais tranquilos era observar as brigas de Kyle e Kiorina. Ficava impressionado como não conseguiam ficar muito tempo sem falar um com o outro e quando começava algum assunto, logo começava uma discussão. Azus estava curioso e perguntou a Gorum, através de telepatia "Estou curioso..."

Gorum sobressaltou-se. - Puxa! Pode avisar quando for falar assim comigo?

"Desculpe, Grande Irmão. Mas falar na sua língua é muito difícil para mim. Além do mais, o assunto é..."

Gorum deu com os ombros - Vá em frente.

"O que a Fêmea do Fogo e o Caçador Isca estão fazendo?"

- Discutindo, para variar.

"Vi que você acha isso interessante. Mas discussão não é algo ruim?"

Gorum riu um pouco. - Não neste caso.

"Então é um ritual de acasalamento?"

Gorum caiu na gargalhada. Ria tanto que lágrimas saíam de deus olhos. Ficou tão vermelho que parecia que ia explodir. Isto é claro, fez a discussão de Kyle e Kiorina cessar.

Kyle logo veio tirar satisfações - Do que está rindo?

Gorum tentava, mas simplesmente não conseguia articular uma resposta.

- Ah deixa para lá!

- Viu do que eu estava falando? - a ruiva retrucou irritada. - Isso é típico de você Kyle!

Kyle voltou para onde estava, ao lado da feiticeira e resmungou - Ah Kiorina, você parece uma roda d'agua, sempre girando no mesmo lugar.

"E então?" Azus ainda esperava por sua resposta.

Gorum finalmente conseguiu se conter para responder - Suponho que sim, azulão! Esses dois tem muita história juntos.

"O ritual de acasalamento é sempre assim, entre os humanos? Tão barulhento?"

Gorum riu suavemente - Muitas vezes, meu amigo. Muitas vezes!

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